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Matias Mendes

A CORRUPÇÃO CONSENTIDA: A República do Caiari


Por MATIAS MENDES

O otimismo inicial que contagiou o pessoal integrado à campanha do PTR com a reabilitação da candidatura de Oswaldo Pianna recebeu uma ducha fria logo no início da campanha do segundo turno, pois a ala mais intelectualizada do PTB, liderada por Teobaldo Viana, rompeu o acordo da aliança firmado por Olavo Pires por conta das suspeitas do suposto envolvimento de Pianna com o assassinato do senador e outras desafeições do pessoal da República do Caiari, facção que começava a dar sinais de vida em torno da campanha, embora ninguém de tal grupo ajudasse efetivamente. Ao grupo dissidente de Teobaldo Viana somou-se o jornalista Paulo Queiroz, do jornal O Estadão, que deram início a uma devastadora campanha na Imprensa contra Pianna, sem que fossem devidamente contestados pela assessoria de imprensa da campanha à época já controlada pela turma das empresas de publicidade que começavam a dar as cartas.

Ao perceber os estragos que estavam sendo causados pelos articulistas do grupo oponente, eu mesmo assumi o papel de contestá-los, travando com o jornalista Paulo Queiroz um renhido duelo dialético que duraria até o final da campanha e que posteriormente, depois da vitória de Oswaldo Pianna, instigado pela turma da República do Caiari, Paulo Queiroz usou como pretexto para me bombardear e melar a minha indicação para a Casa Civil, posto que acabou sendo ocupado, a um preço que eu nunca pagaria, por um outro integrante do PDT, o advogado Hugo Parra Mota, que mais tarde foi alçado ao cargo de Conselheiro do Tribunal de Contas, sendo sucedido na Casa Civil pelo advogado Amadeu Machado, ligado a Chiquilito Erse, que mais tarde também ocuparia outra cadeira no Tribunal de Contas do Estado.

Em razão do descrédito que a candidatura de Oswaldo Pianna inspirava nos meios políticos e financeiros no primeiro turno, a campanha do PTR foi de absoluta indigência, eu pessoalmente nunca vi um único real do dinheiro da campanha, nunca recebi uma única diária pelos inúmeros deslocamentos que fiz para a região do Guaporé, tendo usado sempre o dinheiro do meu próprio bolso para tudo. Como, afora a atuação na frente de imprensa, a minha área de atuação de campo era centralizada no município de Costa Marques, onde o prefeito era do PMDB e meu desafeto pessoal, eu tinha de enfrentar a poderosa máquina pública de Tião Borrachudo que usava de forma escancarada a ótima estrutura da CEMAGUAM a favor do candidato adversário, mas mesmo assim Pianna venceu os candidatos apoiados pela Prefeitura de Costa Marques nos dois turnos da eleição. De tal modo, ao ser eleito, Oswaldo Pianna não estava atrelado a nenhuma amarra com grandes grupos econômicos, os lobistas só começaram a aparecer no cenário nos últimos momentos da campanha. No entanto, em Porto Velho, depois da vitória definitiva, emergiu das sombras, como cutubas redivivos, a facção fisiológica que se notabilizou como República do Caiari e que seria a grande desgraça do Governo Pianna do princípio esperançoso ao seu fim melancólico. Foi a República do Caiari que transformou a mais espetacular e improvável vitória eleitoral de Oswaldo Pianna em lamentável vitória de Pirro, tirando do povo rondoniense qualquer possibilidade de assumir os rumos da política estadual e ensejando a consolidação do malfadado processo de corrupção instalado na máquina administrativa do Estado pela quadrilha do senador José Richa que Jerônimo Santana importou do Paraná para semear a nossa contínua desgraça política. O nanico PT daquela época não teve qualquer participação, mas o naníssimo PTR tirado da gaveta na última hora para servir de legenda a Oswaldo Pianna na disputa eleitoral de 1990 foi inegavelmente muito responsável pela consolidação do sistema corrupto organizado pelo PMDB durante a gestão de Jerônimo Santana.

No processo de organização do primeiro e segundo escalões do seu governo, já absolutamente isolado da realidade pelo cerco da República do Caiari e das empresas de publicidade que dariam as cartas durante toda a sua gestão, com a exceção honrosa de Paulo Saldanha que conseguiu manter o Beron de pé depois do insidioso assalto interno promovido pela quadrilha chefiada por Marcelino Federal Hermida, Pianna errou feio em quase tudo, colocando verdadeiras raposas famintas para guarnecer galinheiros. Na esfera militar do Estado, atropelando os consagrados princípios da hierarquia, ao invés de aproveitar o destemido Coronel-PM Valnir Ferro como Comandante Geral da Polícia Militar e o respeitável Tenente-Coronel-PM Eudes Rosa Cabral como Chefe da Casa Militar, ele fez o inverso, desperdiçou a experiência de combatente do Coronel Ferro colocando-o no posto burocrático de Chefe da Casa Militar e promoveu extemporaneamente o Tenente-Coronel Eudes Rosa Cabral ao posto de Coronel e queimou literalmente a carreira do excelente Oficial nomeando-o Comandante Geral da PM.

Ora, o mundo castrense não admite tais abusos administrativos. Eudes Rosa Cabral tornou-se Coronel, mas era mais moderno que todos os demais Coronéis do quadro da PM, nunca poderia comandar seus colegas que lhe eram hierarquicamente superiores por antiguidade. No âmbito da caserna existe o consagrado conceito de que “antiguidade é posto“ e a inexorável Lei de Murphy não tardou para demonstrar seus deletérios efeitos. Eclodiu na PM uma séria crise com matizes de motim, fez-se necessária a intervenção do Exército na Corporação e, como nos antigos tempos da Guarda Territorial, um Coronel do Exército assumiu o Comando Geral da Polícia Militar para dar novo ordenamento à Corporação. O rumoroso episódio na esfera militar do Estado, ainda sob o efeito do impacto do assassinato do senador Olavo Pires, repercutiu na mídia do País inteiro, reforçando a ideia de que Rondônia era mesmo um Estado bandido, que não respeitava lei nenhuma, que não tinha regras de conduta, que era liderado por traficantes e outros tipos de criminosos e até a bancada federal de parlamentares rondonienses acabou contribuindo para a campanha de difamação de Rondônia, quando a deputada federal Raquel Cândido chegou a afirmar que 93% da população de Rondônia eram constituídos por traficantes, percentual que não isentava da jaça de traficante nem a totalidade de nossas crianças de colo. Sair do Estado na época tornou-se muito penoso, pois o RG do rondoniense constituía quase um mandado de prisão, parecia até que Rondônia tinha virado um Suriname, uma republiqueta do crime organizado, tudo isso em razão das atitudes impensadas da turma da República do Caiari. Valendo-se do caos reinante, na base do sauve-qui-peut, os traquinas da República do Caiari aproveitaram a confusão para fazer todo tipo de maracutaia, inclusive furtar os motores de popa e demais equipamentos que haviam sido criminosamente retirados das regiões ribeirinhas e amontoados no porão do Palácio do Governo, que havia sido apelidado por mim como le Palais Rosé.

Ao final do Governo Pianna, a totalidade da população de Rondônia havia sido reduzida à condição de pária nacionalmente. No que tange aos nativos da terra, estes passaram a ser ostensivamente hostilizados pela maioria de forasteiros aqui acolhidos por nós, tornando-se moda escarnecer do nativo rondoniense como incompetente e corrupto, em criminoso processo de generalização das safadezas praticadas pela turma da República do Caiari para todos os rondonienses. Os nativos de Rondônia foram todos inviabilizados politicamente, chegando ao ponto de que o campeão de urnas Francisco Chiquilito Erse perdesse a eleição para Valdir Raupp, já de volta ao PMDB, na sucessão de Pianna em 1994. O sonho de autonomia dos rondonienses terminou em tenebroso pesadelo e a vitória consagradora de Oswaldo Pianna esfacelou-se em reles vitória de Pirro. O pessoal da República do Caiari, ao final do malfadado governo piannista, arribou de Rondônia abonado para curtir a vida nos endereços elegantes do Rio de Janeiro, de Santa Catarina, da ensolarada costa nordestina e outros pontos confortáveis do Brasil inteiro. Bem poucos permaneceram por aqui. As quadrilhas de forasteiros consolidaram definitivamente o seu poder em todo o Estado e Reditário Cassol até desistiu do seu projeto de transformar uma parte de Rondônia em novo Estado para atender às ambições políticas das quadrilhas do Cone Sul, já que o fracasso de Oswaldo Pianna no Governo havia deixado o caminho livre para que as quadrilhas forâneas tomassem conta do Estado inteiro. Somente agora, com a ação saneadora dos Ministérios Públicos Estadual e Federal as quadrilhas estão sendo extirpadas da política estadual, mas ainda se passarão muitas décadas antes que outro filho de Rondônia consiga pôr os pés de novo no gabinete de um Governador como titular de tal posto. Nos artigos seguintes será enfocado o calvário dos rondonienses que tiveram a desventura de eleger Oswaldo Pianna. Foi algo assim como se Pianna houvesse proferido a seguinte frase em francês: A mon arrivée, la tempête; après moi, le déluge...

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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