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Matias Mendes

GOVERNOS MILITARES: O Legado Esquecido


Por MATIAS MENDES

Só pelo fato de eu haver falado em um artigo que os governos militares que ocuparam o poder entre os anos de 1964 e 1985 não permitiram a prática desbragada da corrupção no serviço público, mereci de um internauta, que se identificou como LUIZ CARLOS, alguns comentários que revelam o seu completo desconhecimento da História. D’abord, ele introduz o seu comentário afirmando logo “não querer acusar nem defender corruptos”, fato que implica dizer que a sua posição preferida é em cima do muro, evitando comprometer-se com qualquer coisa, mas se contradiz logo em seguida quando aponta uma série de supostos erros, a seu ver, cometidos pelos governos militares que ele chama de forma equivocada de ditadura.

Cela va sans dire que é muito mais confortável e seguro falar dos generais que estão devidamente mortos e enterrados, bem menos arriscado do que tratar das estripulias do perigoso Ivo Narciso Cassol que anda livre, solto, com imunidade parlamentar, com escolta da Polícia Militar e endinheirado pelo Estado de Rondônia, com meios materiais suficientes para mandar fazer o mal a qualquer um. Isto se traduz como simples opção de não “lançar-se à luta, em busca da vitória, mesmo expondo-se ao fracasso, integrando a fileira dos pobres de espírito, que vivem numa penumbra cinzenta e não conhecem nem vitória, nem derrota”. O pensamento aqui ligeiramente modificado se presta muito bem a exemplificar as condutas de passividade daqueles que preferem não deixar suas zonas de conforto para entrar nas arenas dos riscos. É uma posição legítima, cada um tem o direito de fazer o que bem lhe aprouver, assim como eu tenho todo o direito de comentar os fatos que ocorreram em Rondônia, inclusive o mais evidente e claro de todos: depois do nosso último governador militar o Estado de Rondônia descarrilhou pela ladeira abaixo da corrupção desenfreada, nunca mais encontrou o caminho do desenvolvimento longe das sombras da criminalidade.

No entanto, compete-me esclarecer ao internauta Luiz Carlos que eu também não acuso corrupto nenhum. Não acuso porque não tenho competência para fazê-lo, se o fizesse estaria cometendo o crime de usurpação de função pública, já que não sou nem Procurador nem Promotor de Justiça. De tal modo, não exerço a função de acusar ninguém em razão de impedimento incontornável à luz do Direito Administrativo, fato que não me impede, porém, de escrever a respeito dos atos criminosos praticados por muitos políticos aqui no Estado de Rondônia. E eu exerço tal direito com desassombro, sem o uso de insinuações maldosas, sem cometer o crime de calúnia, sem difamar ninguém de forma deliberada, somente não me sendo possível evitar os eventuais sentimentos subjetivos de injúria, já que a injúria, até pela sua natureza de subjetividade, pode ser invocada por qualquer um, seja inocente ou culpado, seja ficha limpa ou ficha suja, seja ladrão ou honesto, seja competente ou incompetente, enfim, qualquer um tem o direito de se injuriar. Compete somente ao Judiciário decidir se a alegação de injúria procede ou não.

Toutefois, en revenant à nos moutons, como dizem os franceses, o internauta Luiz Carlos manifesta-se de forma equivocada quando fala de ditadura durante o ciclo de governos militares que durou apenas vinte e um anos. Ora, com exceção do Marechal Humberto de Alencar Castelo Branco, que ocupou em caráter provisório a presidência da República abandonada por João Goulart, cuidando de todos os atos jurídicos necessários à realização da eleição para a escolha de novo presidente, todos os demais presidentes do ciclo de governos militares foram escolhidos em eleições livres realizadas no âmbito do Congresso Nacional, sem nem mesmo o direito a qualquer forma de continuidade, sem reeleição, alternando ciclicamente os ocupantes da Presidência da República, fato que descaracteriza qualquer conceito de ditadura. Se o regime foi de exceção, se somente militares foram eleitos, tal detalhe se deve ao histórico fisiologismo dos políticos patrícios, que tendem sempre a aderir ao poder de plantão, não importando que tal poder seja de direita, de esquerda, de centro ou de qualquer outra tendência. Com exceção de alguns senadores biônicos, termo que muitos jovens nem sabem o que significa, todos os senadores e deputados federais que votavam no Congresso Nacional haviam sido livremente eleitos em seus respectivos Estados, tinham toda liberdade de escolher o candidato que quisessem na eleição congressual, forma perfeitamente legítima de escolha de presidentes da República vigente em vários países do mundo que ninguém considera governados por ditaduras.

No que tange às supostas obras faraônicas que ficaram inacabadas, poucas delas, já que as grandes hidrelétricas de Itaipu e Tucuruí foram concluídas, a BR-364 foi concluída, a BR-319 foi concluída, a BR-317 foi concluída sem pavimentação total, a BR-263 ficou aberta, a BR-230 ficou aberta ao trânsito, nossa usina hidrelétrica de Samuel ficou concluída, as comunicações foram modernizadas, a Vale do Rio Doce ficou instalada e dando substanciais lucros, enfim, os empreendimentos de caráter estratégico que mudaram os rumos do Brasil foram todos desenvolvidos no curto espaço de vinte e um anos de governantes generais. E o que temos de mudanças efetivas no Brasil no ciclo de governantes civis vigente há vinte e oito anos??? Tivemos apenas a incompetência dos sucessivos governantes civis para concluir as obras já quase terminadas, a venda criminosa das grandes empresas estatais para particulares, quase sempre a preço vil, a ausência absoluta de novas obras de infraestrutura até o recente projeto de construção das usinas hidrelétricas do Madeira e do Xingu e, sobretudo, muita corrupção sangrando os cofres públicos. Face ao conjunto das obras realizadas, concluídas ou não, as dívidas contraídas pelos governantes militares podem ser consideradas ínfimas quando comparadas com os valores roubados escandalosamente pelas quadrilhas que hoje operam no serviço público. Não se deve esquecer que o presidente Juscelino Kubitschek, considerado,  com toda justiça, um dos mais desenvolvimentistas entre os presidentes brasileiros, também legou ao Brasil muitas dívidas, mas, em contraponto, legou também muitas obras, tal como os governantes militares. A História se faz de fatos, não de dialética torta, de análises orientadas pela subjetividade, de opiniões oportunistas e convenientes, de retórica ideológica mal fundamentada.

Para nossa infelicidade aqui em Rondônia, “a História só se repete como farsa”, razão pela qual muitos farsantes, para iludir o populacho, ainda hoje costumam dizer nos palanques que vão realizar governos como o do Coronel Jorge Teixeira de Oliveira, consagrando o conceito de que a farsa pode se repetir infinitas vezes como se História fosse. Eis aqui, meu caro internauta Luiz Carlos a verdade obnubilada pela propaganda oficial da atualidade, exposta pela opinião insuspeita de quem nunca prestou qualquer serviço aos governos militares e até teve coragem para trocar tiros e abater gente deles. E você, onde estava nos tempos da Operação Condor, quem foram seus desafetos durante o regime militar e quantos desses desafetos você teve de abater para poder sobreviver??? Em que regiões de além-fronteira você teve de viver para escapar à perseguição do aparato de segurança do ancien régime?? Se a sua resposta for no sentido de que nunca precisou viver nada de parecido, que você é um cidadão pacato, sem jaças de haver vencido confrontos sangrentos, então nem temos como trocar sequer ideias, nossas histórias de vida são diametralmente opostas... Para nossa felicidade mútua, não somos de fato farinha do mesmo saco...

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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