Segunda-feira, 4 de março de 2013 - 13h44
Nascido em Uberaba, Minas Gerais, e residindo em Rondônia desde criança, o procurador da República, Reginaldo Pereira da Trindade, 38 anos de idade, casado, pai de dois filhos, se transformou, ao longo de uma profícua trajetória voltadà à Justiça, no maior símbolo regional de combate à corrupção. Em 15 anos de trabalho, graças à sua dedicação, nas investigações que desenvolve já afastou vários prefeitos rondonienses por desmandos – o último foi Roberto Sobrinho na Capital – e um governador, Ivo Cassol – com quem trava embates desde Rolim de Moura, quando o atual senador era prefeito no final da década de 90.
Odiado pelo crime organizado e pelos corruptos em geral – no caso, de políticos fichas sujas a madeireiros invasores, traficantes de drogas, armas e diamantes – ele volta e meia é objeto de missas encomendadas dos adversários que acabam não prosperando. Apesar das tentativas de desmoralizá-lo ou removê-lo do cargo, Trindade se mostra firme e forte e já é considerado pelos rondonienses uma espécie de “Barbosão” (o destemido presidente do STF) tupiniquim.
Numa entrevista de quase duas horas, Trindade, que é formado em direito pela Unir e estudou em colégios tradicionais em Porto Velho como Pitágoras, advertiu sobre a situação explosiva da reserva indígena Roosevelt, na região Central do Estado, da sua defesa intransigente da tribo Cinta Larga que padece com problemas de saúde, estradas e invasões, do enorme volume de processos – mais de 600 – que investiga atualmente destinados a desvendar crimes de corrupção no Estado. Muitos deles, atingindo políticos e empresários. Confiram.
Diário da Amazônia: Como foi sua vinda a Rondônia?
Reginaldo Pereira – Cheguei criança ainda. Nasci em Minas, mas sou rondoniense integralmente. Meu pai trabalhava e acompanhava a construção de usinas, esteve em Tucurui e depois se transferiu para cá, na epopeia da Usina de Samuel. Vim acompanhando minha família, tinha apenas 11 anos de idade. Estudei nos colégios Pitágoras, depois no Barão do Solimões e terminei o segundo grau no Kleper. Então, passei no vestibular e fiz direito na Unir.
Diário: E sua carreira como procurador?
Reginaldo: Inicialmente era estagiário no Ministério Público Estadual e assim que formei fiquei 10 meses como assessor. Passei no primeiro concurso na carreira do Ministério Público Estadual como promotor de Justiça. Fiquei seis anos pelo interior e em 2003 passei no concurso do Ministério Publico Federal. No ano seguinte escolhi a lotação em Porto Velho. Sempre atuei no combate à corrupção e na defesa dos índios, em principio por todas as tribos de Rondônia, mas atualmente, meu trabalho é direcionado ao povo Cinta Larga, isso desde 2006. Esporadicamente atuo em outras áreas.
Diário: Relate como é atuar no interior, enfrentando caciques políticos truculentos, quadrilhas internacionais de contrabando de diamantes, bandos de madeireiros invadindo as áreas indígenas?
Reginaldo: É com certeza atividade de risco. Mas nesta trajetória foram afastados vários prefeitos, tivemos situações explosivas, como ocorreu na Reserva Indígena Roosevelt. Com boas parcerias é possível avançar. As ações integradas no âmbito federal com a Polícia Federal, Tribunal de Contas da União e Controladoria Geral da União têm sido importantes para serem desbaratadas quadrilhas que rapinam os recursos federais. No âmbito estadual, no início da carreira não existiam esses instrumentos. Já enfrentamos paradas duras e continuamos enfrentando, como é o caso do drama vivenciado pelos índios Cinta Larga. Mas as coisas estão mudando, hoje a gente vê punições para corruptos graúdos, antigamente isto era raro.
Diário: Sabe-se que a situação na Reserva Roosevelt nada mudou e os índios têm passado momentos difíceis…
Reginaldo: Eles têm toda a sorte de problemas. Mas a coisa é geral, não é só com o Cinta-Larga. A raiz de todos os problemas é o comportamento do governo Federal, pouco virtuoso. Os problemas do povo Cinta Larga são os mesmos que afligem os índios em geral, como falta de moradia, alimentação, saúde, educação, estradas de qualidade, dignidade, preconceito etc. Temos Invasões de terras, exploração ilícitas de recursos naturais, da madeira e dos diamantes. Os diamantes, diga-se de passagem, é um pus, um cancro na reserva que pode levar ao extermínio dos índios. O governo Federal não tem agido para resolver a situação. O contrabando continua desafiando todos os anos e vai continuar muito mais se o governo Federal não tomar vergonha na cara. Os problemas do povo Cinta Larga hoje são tão graves como aqueles que ocorreram em 2004, quando daquela terrível chacina. O crime organizado está aqui fora pressionando os índios, envolvendo desde políticos, empresários até fazendeiros. O garimpo continua ilegal, o Congresso Nacional não regularizou nada ainda. Temos um vulcão prestes a entrar em erupção de novo. Vira e mexe este vulcão emite alguns sinais. Nossa batalha é tentar convencer o governo Federal desta situação emergencial, de toda esta gravidade.
Diário: Mesmo com todo este trabalho o Sr. foi acusado de omissão pelo senador Ivo Cassol…
Reginaldo: Nossa atuação tem sido intransigente, seja na exploração da madeira ao contrabando de diamantes. Podem me acusar de qualquer coisa, menos de omissão. Só de reuniões de 2004 para cá fizemos mais de 100, foram 10 recomendações, nove ações civis públicas e milhares de ofícios, de documentos recebidos, centenas de despachos de inquéritos civis. Poucos casos, como da Reserva Roosevelt, no Brasil, tiveram ações tão densas e robustas. A coisa não está resolvida ainda, estamos longe de resolver, mas não é falta de esforço ou omissão. Falta vontade política das esferas governamentais. Estamos trabalhando firmes. Além disto, também têm sido realizadas britzes contra o crime organizado. No âmbito político tivemos reuniões com parlamentares em Rondônia e Mato Grosso para falar da gravidade da situação. Tivemos o apoio da deputada Marinha (RO) e senador Pedro Taques (MT). É preciso conscientizar a todos da gravidade da situação. Meu papel é defender o povo Cinta Larga. Se eles cometerem algum crime, também serão processados, mas não serão processados por mim, que atuo na sua defesa, mas sim, pelos procuradores de Ji-Paraná.
Diário: E com relação à classe política?
Reginaldo: O combate à corrupção e improbidade sempre foi o meu carro chefe desde o Ministério Público Estadual. Já em 1997, quando assumi como promotor de Justiça, estive às voltas com casos no Urso Branco, envolvendo corrupção, assédio contra presos. Fui para Alta Floresta e encontrei prefeituras problemáticas e prefeito corrupto. De lá para cá, em todas as comarcas que passei, processei prefeitos, deputados federais e estaduais, senadores, governador, enfim, em todos os níveis. Então este é o nosso papel, investigar e punir. Não há nada pessoal. Para se ter uma ideia, no caso de Ivo Cassol, que se diz perseguido, falei umas duas ou três vezes com ele. Mas as investigações sobre sua conduta vêm desde os tempos em que ele era prefeito de Rolim de Moura.
Diário: Fiscalizar e punir os políticos e empresários corruptos têm sido muito perigoso neste País devido às perseguições e até ao risco de atentados. Como se proteger? Existe alguma segurança pessoal?
Reginaldo: Em duas ou três vezes em mais de 15 anos de atuação a coisa ficou bem feia mesmo. Tive que buscar socorro, mas são situações mesmo tensas que exigem trabalho. Combater a corrupção neste País exige coragem e fazer com que a lei seja cumprida chega a ser arriscado.
Diário: O Sr. não tem medo de atentados? Afinal o crime organizado é poderoso em Rondônia…
Reginaldo: Tenho coragem para fazer o que é certo, mas coragem não é ausência de medo. Ficamos apreensivos pelos meus, mas isto não impede de fazer o que eu tenho que fazer. Não vou arriscar a minha vida e dos meus pelo meu trabalho. Nas situações de risco eu fui atrás de reforços.
Diário: Qual é o balanço que o Sr. faz das últimas operações realizadas em Rondônia?
Reginaldo: O balanço é extremamente positivo. Hoje envolvemos todas as instituições de controle, isto é muito bom, porque há 10 ou 15 anos não havia altas autoridades sendo processadas, especialmente processadas no exercício do mandato. Este é um amadurecimento institucional. Claro que estamos num processo permanente de transformação para um País melhor, isto não vai ser feito do dia para a noite. As pessoas precisam entender isto. Nossas limitações, formas e ritos a ser seguidos. Precisamos avançar mais, dar mais celeridade. Um cenário para um mundo melhor, educar o povo, ao aperfeiçoar as instituições. Tenho muita fé que estamos no caminho certo.
Diário: E sobre a campanha contra a PEC 37 que limita as investigações dos procuradores?
Reginaldo – Estamos em campanha contra esta Proposta de Emenda Constitucional que pretende restringir o Ministério Publico de investigar no âmbito criminal. Estamos recebendo o apoio da imprensa, das entidades e já existe mobilização nacional neste sentido.
Diário: O Sr. É considerado hoje uma trincheira de lutas, um símbolo contra a corrupção dos políticos em Rondônia. Como vê esta responsabilidade, de se transformar numa versão local do Barbosão…
Reginaldo: Fico extremamente envaidecido com as várias manifestações de apoio que tenho recebido, seja nas emissoras de rádio, televisão. Claro que são manifestações espontâneas, generosas sobre nosso trabalho. Isto nos dá muita força para continuar trabalhando firme com a mesma vontade de acertar. Não buscamos medalhas ou prêmios, este é o nosso trabalho, mas não deixa de ser agradável e gratificante ter o nosso desempenho reconhecido, mas existe o reverso da moeda. Quanto mais a gente trabalha, mais a gente confia e espera, gerando mais expectativas. Aí a gente fica apreensivo quanto a não deixar esta confiança se degenerar em frustração. Se eu tivesse uma estrutura maior, eu poderia fazer mais ainda, virar este Estado de ponta a ponta. Atualmente tenho quase 600 investigações em curso e coisas grandes e cabeludas sendo acompanhadas. Gostaria que a sociedade continuasse confiando em nosso trabalho, mas se conscientizando, que temos grandes limitações e dificuldades para investigar. Não é do dia para a noite que um escândalo ou irregularidade é desvendado, com a pessoa presa e condenada. A coisa não funciona desta forma. Quero deixar claro que se mais não é feito, não por falta e coragem, falta de compromisso com esta ou aquela pessoa, mas por causa de nossas limitações. Não podemos perder a fé, precisamos confiar que estamos no caminho certo e fazer a nossa parte.
Sem perdãoHá pessoas que se dizem cristãs, mas abrem caminho ao inferno ao ofender os semelhantes, esquecendo que uma das principais lições do crist
Dá pena de ver a situação a Av, 7 de setembro no centro antigo de Porto Velho
O jogo da Amazônia Em todo o mundo se tornou obrigatória a pergunta “e agora, com a eleição de Trump nos EUA?” Mao Tsé-tung disse que se os chinese
É bem provável que ocorra uma regionalização de candidaturas ao Palácio Rio Madeira
DesbranqueandoA jornalista brasileira Eliane Brum, descendente de italianos e filha de pai argentino nascida em Ijuí, Noroeste gaúcho, certo dia dec
A classe política está querendo antecipar o processo eleitoral de 2026
Tartarugas humanasO desmatamento e a piora do clima causam prejuízos generalizados aos povos amazônicos. Os que mais assustam são as perdas na agri