Quarta-feira, 17 de abril de 2013 - 14h50
Caro Carlos Henrique: li o seu artigo sobre o apelo do Governador. Perfeito. Você foi ao ponto, nada a acrescentar. Pena que os eleitores e os eleitos nunca queiram enfrentar o problema. Por isso é admirável a atitude do Governador em falar sobre o tema de forma tão franca, surpreendente mesmo. Tive uma breve experiência à frente de uma unidade prisional em Rondônia e pelo que vi, embora tenham-se passado mais de 15 anos, nada mudou nessa área, infelizmente. Segue sugestão que dirijo ao Governador, atendendo ao pedido feito.
Atenciosamente - Luiz Henrique Candido
Vale à pena conhecer a experiência que relata a correspondência do leitor Luiz Henrique Cândido, ex-diretor de Penitenciária de Ji-Paraná, que respondeu à dramática convocação do governador Confúcio Moura em seu pedido de socorro publicado no Facebook e reproduzido aqui. Quero acreditar que a situação enfrentada por ele em seu breve período na direção do período já não exista hoje. Muito embora seja forçoso admitir que é quase impossível a moralização de um sistema no qual existem mais bandidos no entorno do que propriamente no interior das celas.
Se a administração do sistema penal está conseguido impedir a comercialização de vantagens, que vão desde a entrada de drogas, bebidas, celulares e prostitutas para as verdadeiras orgias historicamente presentes nas penitenciárias. Se já não acontecem mais as fugas negociadas. Se o fornecimento das tais “quentinhas” já deixou de ocupar lugar de destaque no balcão de negociação política. Então parabéns: há indícios de seriedade no enfrentamento do problema e pode ser que se consiga pelo menos atenuá-lo. Leiam o que diz Luiz Henrique Cândido:
Senhor Governador.
Creio quea solução está em fazer cumprir a lei de execução penal, no que diz respeito ao trabalho do preso (direito e dever, observadas as habilidades de cada um). Tive a oportunidade de dirigir a Penitenciária de Ji-Paraná, em 1997, por 59 dias, e pus todos os presos para trabalhar. Os que estavam no regime semiaberto saíam para trabalhar, em grupo, com escolta. Os do regime fechado trabalhavam no pátio da cadeia.
Busqueiapoio na sociedade e consegui: caminhão, betoneira, cimento, tijolos, areia etc. (consegui ainda, pedindo pelas rádios, milhares de livros em doação para a biblioteca do presídio). No presídio os presos faziam bloquetes de cimento. Na rua assentavam os bloquetes (fizemos a calçada de um posto de gasolina e de um motel e ainda uma terceira obra, na parte de construção civil). Reformamos todo o interior do presídio. O que era matagal virou horta. Construímos uma granja...
Um galpãoque abrigava uma marcenaria de um dos agentes penitenciários foi desocupado à força e ali fiz construir, com parte dessas doações, quartos coletivos, para alojar os presos do semiaberto que viviam em “puxados” de pau-a-pique, nos fundos do presídio. Resumindo: os presos que costumavam ir dormir lá pelas 3 ou 4 da manhã, passaram a ir dormir antes das 19 horas, de tanto cansaço... O trabalho é fundamental para que o preso se ocupe e possa obter rendimento para sustentar sua família que não está presa (evitando que a mesma viva na dependência da caridade alheia ou acabe aderindo ao crime também).
Logo depoisque deixei a direção do presídio fui visitar um ex-presidiário, que cumprira pena por furto, que havia acabado de ser solto da penitenciária. Ele morava à beira do Rio Machado, pura miséria, dava dó de ver a pobreza de sua moradia, a condição miserável de vida da esposa e filhos. Ele me pediu. “Me arranja trabalho, eu preciso...” Que jeito se arranja um trabalho para um ex-presidiário, Governador? Três meses depois ele foi preso novamente, cometendo furtos em Jaru!!! Se na cadeia o preso não aprende um ofício, se não lhe dão a chance de mostrar do que é capaz, além dos crimes cometidos, de que adianta que seja solto? De que adianta, aliás, que tenha sido preso?
Mas asforças de segurança rechaçam a ideia. Isso não lhes agrada, pois os obriga a ficarem vigilantes enquanto os presos trabalham. É muito mais cômodo que fiquem trancafiados 24 horas por dia. Preso só merece veneno, entendem. Como se ficar privado de liberdade, por si só, já não fosse veneno bastante! Além do mais, quem combate o crime não pode estar à frente de presídios, nem à frente de formulação de políticas prisionais, como os estudiosos já alertaram, posto que a convivência diária com os cenários de crime os torna totalmente avessos e refratários à ideia da pena como meio de ressocialização, o que é completamente compreensível.
E por issoacabei exonerado.
Mas esseperíodo em que essas forças me toleraram como diretor daquele presídio foi magnífico, porque tive a certeza de que tratar o preso com respeito não é só o melhor caminho, É O ÚNICO CAMINHO - se não para a sua integral recuperação, que depende de outros fatores – capaz de manter a paz nos presídios, com certeza.
Uma experiênciame marcou profundamente nesse período: três dias após ser “batizado” (primeira fuga de preso após a chegada de um diretor). Três presos fugiram à meia noite, quando eu chegava ao presídio (eu dormia na sala da administração) – até parece que fora tudo combinado para me assustarem. Nunca escutei tanto tiro na minha vida e eu ali, entre o portão da rua e o interno, sem saber o que fazer, com os pipocos rasgando o céu.
Fugiramescalando as muralhas com uma corda de lençóis (a famosa teresa). Um deles, apelidado de “Doido”, caminhou mais de 200 km, até sua cidade natal: Vilhena. Ladrão de galinhas, que furtava para sustentar o vício que não conseguia largar (maconha ao que depois eu soube). AQUELA TERIA SIDO A NONA OU DÉCIMA FUGA DE DOIDO... DE VÁRIAS CADEIAS.
Recapturadouma semana depois, tive que ir a Vilhena para recambiar DOIDO para o presídio. E o trouxe amarrado (não havia algema no presídio, nem na SEJUS em PVH), porque me diziam que ele era muito perigoso. Na viagem conversei bastante com ele e vi que era um pobre coitado. Passei a comprar cigarros para ele após o retorno ao presídio. E vez ou outra, quando me informavam que ele estava depressivo demais, pela ausência da droga, provavelmente, eu o chamava para conversar na administração,
E Doidose tornou um excelente colaborador. Foi dos que mais me ajudou na reforma do presídio – fiz levantar muros que separassem o pátio da cadeia do prédio da administração, para evitar contatos desnecessários entre agentes e presos, e também a ansiedade causada neles por qualquer movimentação na área administrativa, presença de advogados, familiares de presos etc. – e Doido trabalhou nessa obra como um verdadeiro burro de carga.
Mas o quemais meu surpreendeu em Doido, foi quando tive de ir buscar uma doação e precisei levá-lo comigo para ajudar (os agentes, a essa altura, quase todos tinham me deixado, haviam ido para o albergue, para o PROCON, para PVH - não impedi ninguém que saísse - houve uma noite em que no presídio havíamos eu e uma agente apenas – além dos policiais nas guaritas, claro).
Por umacaso do destino, Doido acabou ficando mais de 10 minutos sozinho no carro. E NÃO FUGIU. Veja, o sujeito que fugira 10 vezes, que enfrentara saraivada de tiros, que andara 200 km no meio da mata, não quis fugir naquele momento...
Depois quesaí da direção, nunca mais soube dele. Mas a partir dali tive a certeza de que o tratamento respeitoso ao preso, ainda que não o recupere, pode inspirar nele confiança e tranquilidade para cumprir sua pena em paz (e se o preso está em paz com a direção do presídio, a cadeia fica em paz, sem mortes, sem destruição do patrimônio público, sem desassossego da sociedade...)
Ao finalda minha passagem pela direção, sabendo que não tinha como me manter no cargo por mais tempo tentei de tudo, pedi a políticos próximos ao Governador que o trouxessem para conhecer a nossa experiência... mas foi em vão. Pedi então aos órgãos de imprensa que viessem dar divulgação ao nosso trabalho. Vieram. Mas vieram tarde: no dia seguinte à reportagem em que a Marindia Moura mostrara pela TV Rondônia todas as novidades e tecera elogios rasgados à experiência, veio a exoneração
Mas, enfim,voltando à ideia principal, a gerência do trabalho dos presos pode ser desenvolvida por empresas criadas especificamente para esse fim, como preveem os arts. 34 e 35 da Lei de Execução Penal, cujos produtos podem ser vendidos à administração pública direta ou indireta, sem licitação, o que está previsto também na Lei de 8.666. Ou podem ser vendidos a particulares, inclusive no exterior.
Os presospodem, por exemplo, sob a gerência dessa empresa, produzir sua própria alimentação. O custo para o Estado seria muito menor do que o atual (eu fiz algo parecido em Ji-Paraná, trouxe a cozinha para dentro do presídio, para empregar os presidiários nessa tarefa). Aliás, esse negócio de quentinha já passou da hora de acabar, faz tempo... Bem administrada, essa empresa, ou empresas, poderiam financiar um fundo destinado à própria construção e manutenção de presídios.
E, por fim,Governador, falando nisso, acredito que nenhum presídio deva ter mais do que 300 presos, ainda que numa mesma cidade. Mais de 300 presos a coisa fica perigosa, incontrolável. Como foi o caso do Carandiru, como é o caso do Urso Branco. Desculpe se me estendi. Espero que essas ideias possam lhe ser úteis de algum modo.
Correio de Notícias:
Artesanato de presos
é vendido no exterior
Produtos feitos por presos da penitenciária Ariosvaldo Campos Pires,
de Juiz de Fora (MG), estão ganhando fama internacional.
Produtosfeitos por presos da penitenciária Ariosvaldo Campos Pires, de Juiz de Fora (MG), estão ganhando fama internacional. Detentos da unidade - que abriga pessoas que cumprem pena em regime fechado e semiaberto, além de presos provisórios - trabalham na produção de peças em tricô e crochê, parte delas assinadas pela estilista mineira Raquel Guimarães.
Os produtosjá foram vendidos em 70 lojas multimarcas no Brasil, além de Nova York e Tóquio. Em Paris, exatamente na Place Vendôme, lugar mais badalado da moda mundial, já foi inaugurado um show room permanente das peças produzidas pelos homens que cumprem pena na penitenciária de Juiz de Fora. O projeto funciona no presídio desde 2009 e tem contribuído para a reintegração dos detentos no mercado de trabalho.
Projetosdessa natureza são fomentados pelo programa Começar de Novo, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), como forma de garantir a ressocialização de egressos do sistema carcerário e evitar a reincidência criminal. O artesanato produzido no presídio de Juiz de Fora também já serviu de decoração para o badalado e concorrido réveillon do Hotel Copacabana Palace, no Rio de Janeiro.
Foram1.600 suportes de velas, feitos de vidro e revestidos de crochê, confeccionados pelas mãos dos detentos que deixaram o histórico prédio ainda mais bonito. O trabalho no sistema prisional tem se mostrado benéfico a todas as partes: ao Estado, que cumpre sua função de humanização e ressocialização dos indivíduos que estão presos; aos próprios detentos, que têm a oportunidade de se profissionalizarem enquanto cumprem pena; e aos parceiros, que contam com mão-de-obra mais barata e com alta produtividade.
Além disso,o trabalho autônomo desenvolvido pelos presos reforça o vínculo deles com a família. São os familiares que levam o material a ser trabalhado e que vendem o produto fabricado, gerando renda. Dos 480 presos da penitenciária, 267 estão envolvidos em atividades laborativas.
Você, leitor, já ouviu falar do “Efeito Dunning-Kruger”? Trata-se do princípio definido em 1999, a partir do estudos de dois psicólogos americanos,
DNIT não cancela ponte Brasil-Bolívia
“Suspender é diferente de cancelar”, esclarece importante autoridade ligada ao gabinete do senador Confúcio Moura. É o que também deixam claro os di
Prejudicado no MDB, Roberto Alves concorre em Cacoal pelo Avante
"A democracia é a pior forma de governo" - teria ironizado o então primeiro ministro inglês, Winnston Churchill, para acrescentar: - "Exceto por t
Rachadão do Pix: o vôo de Ícaro de Lira
O parlamento brasileiro deveria agradecer ao ministro Flávio Dino, antes de condená-lo pelo bloqueio das “emendas Pix”. A quem, afinal, esperam conv