Domingo, 13 de abril de 2014 - 12h07
Raimundo Garcia Neto / Fotos Ana Célia
A história da colonização de Rondônia, deve muito aos primeiros topógrafos que vieram trabalhar no Instituto Brasileiro de Reforma Agrária – IBRA cuja maioria, era do estado do Amazonas. Para falar sobre as dificuldades enfrentadas pela equipe comandada pelo Capitão Silvio Farias entrevistamos o topógrafo Raimundo Nonato Garcia Neto, que conta histórias do tipo. “Estávamos fazendo a mediação nas terras do hoje município de Santa Luzia e montamos acampamento nas proximidades de um barreiro de Anta, à noite as Antas chegaram e foram levando no peito, nossas barracas com todos os pertences e a gente correu sem saber pra onde”. Outro episódio dessa empreitada. “Certa vez no acampamento de Rolim de Moura quando dei por mim, estava cercado por 12 pés de Mogno era muita madeira nobre que existia naquela região”.
Garcia passa a fazer parte da galeria de entrevistados do Programa do Departamento de Comunicação do Governo de Rondônia – DECOM: Pioneiro – A História de Todos Nós.
E N T R E V I S T A
Silvio –Quem é você?
Garcia – Meu nome é Raimundo Nonato Garcia Neto nasci em Silves no Amazonas, mas, me criei praticamente em Manaus onde estudei até terminar o científico no Colégio Estadual do Amazonas
Silvio – E Rondônia?
Garcia – Vim pra Rondônia do Rio de Janeiro chegando aqui no dia 22 de abril de 1968, quer dizer, terça feira próxima, completo 46 anos morando em Porto Velho. Desembarquei no aeroporto do Caiari ali onde hoje está o Ginásio Claudio Coutinho de um DC3 da Cruzeiro do Sul.
Silvio – Por que do Rio de Janeiro?
Garcia – Na realidade, terminei o científico em 1964 no ano da Revolução e fui trabalhar como gerente numa firma que explorava manganês no rio Aripuanã, estava me preparando para fazer vestibular para engenharia, mas, a firma faliu e me dispensaram. Foi quando apareceu o Edital convocando pessoas pra fazer um curso seletivo e quem fosse classificado, embarcaria para o Rio de Janeiro para fazer o curso de topografia no Serviço Geográfico do Exército. Disseram pra gente que ao final do curso, voltaríamos pro Amazonas. Quando terminou o curso, o general que era nosso diretor, colocou o mapa do Brasil na parede e falou o seguinte: Vocês devem escolher onde exercer a profissão no Rio de Janeiro, Paraná, Pernambuco, Bahia, Mato Grosso ou Rondônia. Éramos onze amazonenses, um olhou pro outro e dissemos, enganaram a gente, um desistiu e os outros dez se reuniram para escolher o local para trabalhar e todos escolheram Rondônia por ser o estado mais próximo do Amazonas.
Silvio – Quando você chegou a Porto Velho quem era o administrador do IBRA?
Garcia – O responsável pelo Instituto Brasileiro de Reforma Agrária era o senhor Jorge Pancov e o substituo o professor Enos Eduardo Lins um professor que falava várias línguas. Quero fazer um adendo aqui. Fico muito chateado com a política e os políticos do nosso estado, que não reconhecem as grandes personalidades que passaram por aqui. Não existe uma rua com o nome do professor Enos e nem do Dr. Jorge Pancov enquanto tem muito político que não fez nada para merecer e é nome de Avenida como a Rogério Weber que não vou me prolongar nos comentários, mas, sei a história. Então eram esses dois pioneiros os responsáveis pelo IBRA, tinham dois motorista que era o Antônio Chulé e o Cairara e o Braga que era assistente administrativo.
Silvio – Aonde funcionava o IBRA?
Garcia – Funcionava numa sala na prefeitura. Quando nós chegamos, aí já éramos Um de Rondônia, Dez do Amazonas e Dois do Acre. A sala era tão pequena que não coube a gente. Nos apresentamos de três em três. O IBRA não tinha aparelhamento nenhum, então cederam o prédio onde funcionava o DNER hoje Denit e lá, o Instituto começou a funcionar. Conseguiram um prédio para instalar a repartição, porém, nós os topógrafos não tínhamos equipamento para iniciar os trabalhos, ficamos alguns meses parados, morando no Hotel Vitória que ate hoje funciona ali na Duque de Caxias no bairro Caiari. Depois começaram a chegar os equipamentos, camionetas, rurais, caminhões, helicóptero e começaram a contratar o pessoal, era motorista, telegrafista enfim gente para todos os setores.
Silvio – Qual a primeira missão de vocês como integrantes da equipe do IBRA?
Garcia – Foi medir a BR 364 entre Rondônia e Mato Grosso e a BR 319 que naquele tempo era de Porto Velho para o Acre. Então saiu uma equipe no dia 22 de julho de 1968 da qual eu fiz parte na direção de Vilhena. Nossa missão era medir a BR, locar todos os marcos de divisa das pessoas que ocupavam a estrada, naquele tempo existia muito seringal. Tinha trecho que a gente andava 80 km na BR 364 e não encontrava uma viva alma. Quando a gente encontrava uma pessoa, um funcionário do IBRA providenciava seu cadastramento através de uma entrevista que “debulhava” a vida daquele ser humano desde o cueiro. A equipe que foi no rumo de Guajará Mirim e Acre tinha a mesma missão.
Silvio – Vocês enfrentaram algum problema com os seringalistas que se diziam donos de grandes extensões de terras naquela época?
Garcia – Na maioria das vezes a gente não encontrava o proprietário da terra, porque eles moravam em Porto Velho. Quem morava na terra eram os prepostos deles, os seringueiros. Geralmente esses seringais margeavam a estrada. Os seringueiros até ficavam animados, porque achavam que ganhariam um lote de terra, coisa que só veio muito depois através da Discriminatória que é outra história.
Silvio – E os índios?
Garcia – A gente encontrava muito índio. Lá em Rizinho perto de Pimenta Bueno lembro que um dia, a gente ia numa camioneta do INCRA (já não era mais IBRA), quando vi uma movimentação atravessando a BR, tudo vermelho e perguntei ao motorista que se não me engano, se chamava Pinto. O que é aquilo e ele respondeu: Garcia são índios. Era muito índio. Naquele tempo eles estavam se aproximando da civilização, mas, ainda eram brabos.
Silvio – E o Capitão Silvio quando assumiu o IBRA?
Garcia – Quando estávamos recebendo o material que me referi acima, inclusive os Teodolitos que são os aparelhos de topografia, chegou o Capitão Silvio Farias que era um militar Sargento que foi reformado como Capitão. Ele era oriundo da COMARA que era o órgão que construía aeroportos na Amazônia ele também era do SNI (Serviço Nacional de Informação). Na realidade o consideramos como nosso primeiro chefe, porque logo que o IBRA foi instalado aqui o Dr. Pancov foi embora e então o Capitão Silvio assumiu o comando da Reforma Agrária em Rondônia. O Capitão Silvio morreu com 4 cruzes de malária. Era mineiro de Itajubá muito carismático com quase dois metros de altura, tanto que o apelidamos de “Gigante”, tinha um coração imenso e uma memória espetacular, porém desorganizado ao extremo, o que não era demérito, pois o que ele tinha de desorganização na mesa, tinha de organizado na memória. Podia perguntar que dizia o nome, o quilometro da BR que aquela pessoa morava e se duvidasse, ele dizia o nome dos filhos. Particularmente o considero muito. Certa vez ele falou um negócio pra mim que nunca esqueço: “Meu filho, erre por ação e não por omissão”.
Silvio – Outra pessoa que se destacou no INCRA foi o Dr. Assis Canuto?
Garcia – O Dr. Canuto chegou depois, não lembro se foi em 1970, agrônomo vindo de Goiás foi dos primeiros administradores de Projetos de Assentamentos aqui. O PIC Ouro Preto o primeiro a ser implantado em Rondônia. Depois se tornou político, foi prefeito de Ji Paraná e vice governador de Rondônia. É um grande pioneiro Rondônia deve muito ao Dr. Canuto é uma pessoa que admiro muito, inclusive torce pelo mesmo time que torço, nosso querido Vasco da Gama que vai ser campeão carioca 2014.
Silvio – Vocês topógrafos do INCRA ajudaram no surgimento de várias cidades em Rondônia, no seu caso qual a cidade que você põe na conta do seu trabalho, como especial?
Garcia – Naquele tempo só existiam ao longo da BR 364 as cidades: Ariquemes, Pimenta Bueno, Vilhena e Vila Rondônia que hoje é JI Paraná. Jaru não podia ser considera como cidade porque existiam pouquinhas casas; Não vou dizer que sou fundador, mas, fiz a topografia de Rolim de Moura, Nova Floresta, Santa Luzia e de Presidente Médice e um pouco de Cacoal, aliás, vi abrirem a primeira estrada em Cacoal por uma firma chamada Pietá.
Silvio – Como era feito o transporte do equipamento e de vocês para essas localidades?
Garcia – Naquele tempo não existia ponte, tudo era balsa. Jaru era o quartel general de pium e borrachudo (mosquitos), lembro que a gente fechava os vidros das camionetas e a gente ligava o Para Brisa para poder ter visibilidade. A prioridade nas balsas eram para as ambulâncias, ônibus, carro do 5° BEC e os do INCRA. Quando qualquer coisa tipo cair um carro numa balsa acontecia era o maior transtorno, acontece que ao longo da BR não existia restaurante, telefone, não tina luz elétrica, não existia nada.
Silvio – Mas, tinha “Os 4 Bicos” da vida?
Essa resposta você vai dar na edição da próxima terça feira dia 15 ok?
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