Domingo, 13 de abril de 2014 - 20h20
A velha 12 (Coronel Church) homenageia o coronel norte-americano George Earl Church, que em 1872 idealizou a Estrada de Ferro Madeira-Mamoré. Foi a primeira máquina a chegar na Amazônia, em 1878, trazida pela firma P & T Collins. Desativada a ferrovia em 1972, ela ficou com o 5º BEC, de onde foi removida para o museu, com nova pintura /Foto Ocampo
LUIZ LEITE DE OLIVEIRA (*)
Parece que sempre estava solitária, se impondo como se estivesse a contar sua própria história para um povo sem memória
A locomotiva nº 12, Coronel Church, reaparece depois de submergir com a cheia do Rio Madeira, dentro de um dos armazéns onde foi instalado o Museu Ferroviário da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré, em 1980.
Trazida pela empresa P & T Collins do Estado da Filadélfia (EUA), em 1878, a Public Locomotive Works, 12, tem logotipo circular, desenhado, frontal, para sua identificação, em bronze. Ficou na região da Vila de Santo Antônio das cachoeiras, entre os portos dos Vapores e o Porto das Canoas, após tombar espetacularmente, numa curva ferroviária, no dia da sua inauguração, em julho de 1878. E lá ficou durante aproximadamente 30 anos.
A história da Coronel Church reflete um dos episódios dos mais comoventes e dramáticos, numa das primeiras tentativas de construção da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré (EFMM). De engenheiros a trabalhadores, quase todos morreram em consequência de doenças, ou enlouqueciam dentro daquele foco de podridão, como era chamada Santo Antônio.
Abandonada, a locomotiva foi restaurada a partir de 1908 nas oficinas fábricas, ferroviárias. Segundo o historiador ferroviário Hugo Ferreira, em “Reminiscências da Madmamrly“, a Church era também chamada de Baronesa e “reinava” entre as locomotivas Mongul, Consolidation, que vieram da América do Norte, e a escavadeira Bucyrus, vinda do Canal do Panamá para a construção da Madeira Mamoré.
O dilúvio e o delírio
Hoje ela é uma raridade histórica. Trafegou durante 60 anos sobre os trilhos também históricos da EFMM, principalmente no complexo ferroviário de Porto Velho, cuja cidade planejada nos Estados Unidos formou-se entre 1908 e 1912, quando a ferrovia foi inaugurada, depois de cinco anos de construção.
Paralisada definitivamente por ocasião da desativação da EFMM, a Coronel Church 12 ficou em exposição por algum tempo, em frente ao quartel militar do 5° BEC, nos tempos ditatoriais.
Em 1980, com o resplandecer da democracia, depois de um movimento popular para reativação da ferrovia, ela foi levada para o Museu Ferroviário.
Este ano, o povo de Porto Velho surpreendeu-se com o dilúvio e o delírio causados pelas hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau, que direcionaram suas turbinas para cima do pátio ferroviário e para os bairros centrais da cidade.
A 12 ficou submersa, porém, aos poucos, reaparece, com jeito de um trabalhador em febre e delirante, com foco na direção do infinito, como quem quer sair sozinha da situação, sem socorro, com o desprezo de um povo f r i o, que não quer ter memória, e o pior, teima não saber amá-la.
Cercada de peças ferroviárias igualmente vítimas da alagação, ela aguarda o momento de ser novamente referência entre aqueles que vêm de longe buscar no que restou da estrada de ferro, a resposta às suas indagações em relação ao patrimônio histórico amazônico.
Em 2006 anunciávamos os riscos que trariam as represas, a forma mais violenta de destruição da natureza. Dizíamos que elas afetariam de forma irreversível a biodiversidade da Amazônia, o nosso patrimônio ambiental, principalmente a Estrada de Ferro Madeira Mamoré. Ou seja, previmos esse caos.
Hoje, diante do estrangulamento da Bacia do Rio Madeira, questiona-se o momento delirante. Talvez por isso nos chamaram algumas vezes de loucos, enquanto zumbia o coro “Usinas já!”, triste, cego, zombeteiro e descompromissado com o nosso passado sagrado.
Esse coro, sustentado por políticos desinformados, porém ávidos pelo poder, envolveu também algumas instituições honradas, entre as quais, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e o Serviço de Patrimônio União (SPU). E seus representantes e/ou dirigentes, como se fossem empregados e porta-vozes de bancos e dos consórcios construtores, abriram mãos e pernas à maquiagem.
Recentemente, dona Dilma, a “presidenta”, veio a Porto Velho para solidarizar-se com o drama dos flagelados pelas enchentes que destruíram quase tudo. Torrou dinheiro em combustível de avião apenas para dizer que a culpa desse desastre todo “não fora das usinas”.
Não precisava ter vindo, pois não engana nem a si própria e não tem como aliviar a barra. Agora sim a Madeira-Mamoré, a Amazônia e o Rio Madeira são vítimas do diabo, e ele se veste de vermelho. Cruz-credo, credo em cruz! Meu Deus!
(*) O autor é arquiteto e urbanista, pesquisador do patrimônio histórico na Amazônia.
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