Quinta-feira, 29 de março de 2012 - 13h36
HELDER CALDEIRA*
O senador brasileiro Demóstenes Torres está cada dia mais parecido com o ex-deputado federal Roberto Jefferson nos conturbados anos de 2004 e 2005, quando este se tornou o “Homem-Bomba” da República, protagonista do maior escândalo de corrupção da história política do Brasil. Por cíclico, o país volta a velejar pelos mares revoltos da sacanagem generalizada, onde seres políticos de toda espécie boiam – em nauseabunda leveza – e colocam em risco a já combalida credibilidade das instituições supostamente democráticas.
Nos tempos de Roberto Jefferson, o então ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, e a cúpula do Partido dos Trabalhadores (PT) colocavam em prática uma realpolitik torta e um vastíssimo esquema corrupto para desviar dinheiro público direto para as contas do “Caixa Dois” de seu partido e da base governista no Congresso Nacional. O próprio presidente Lula da Silva confirmou a veracidade de tal excrescência. Assim como agora, o ovo da crise institucional chocou às vésperas das eleições municipais de 2004, consideradas estratégicas para sustentação de poder no início da gestão lulista.
Também naquela época, o primeiro ato pirotécnico foi protagonizado pelo contraventor Carlinhos Cachoeira, flagrado em negociações de altas propinas com Waldomiro Diniz, principal assessor de José Dirceu. O dinheiro sujo seria usado para comprar o apoio de parlamentares da base aliada e alocaria fartos recursos nas campanhas municipais. Em troca, a cúpula palaciana daria um “jeitinho” de amansar as autoridades e coibir qualquer perseguição ao funcionamento clandestino dos negócios da jogatina de Cachoeira, oportunamente proibidos, um ano antes, por decreto do então presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva. Apesar de torpe e indecorosa, tratava-se de uma engenharia política vasta e fértil. Mas o esquema vazou à imprensa e casa caiu!
Nas palavras do ex-deputado Jefferson, naqueles dias o PT começou a “evacuar o quarteirão” responsabilizando-o integralmente pela crise institucional entre o Palácio do Planalto e o Congresso Nacional, pelos sucessivos escândalos de corrupção e pelos respectivos vazamentos. O governo pretendia implodir o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) e seu presidente nacional. No dia 28 de maio de 2005 – três dias depois de uma amarga derrota governista e da instalação da CPMI dos Correios – chegou às bancas a revista Veja com Roberto Jefferson estampado na capa. O título era tão ameaçador quanto premonitório: “O Homem-Bomba”.
Sete anos depois, a história política se repete: às vésperas das eleições municipais e em meio à revolta generalizada da monstruosa base aliada ao governo Dilma Rousseff, um parlamentar de peso corre o risco de ser implodido por suas relações suspeitíssimas com o contraventor Carlinhos Cachoeira e a equivocada clandestinidade da indústria da jogatina. A diferença é que, agora, o protagonista é um ícone da oposição, conhecido por seu suposto moralismo, pelos discursos constitucionalistas exemplares e por suas atuações emblemáticas como procurador-geral do Ministério Público do Estado de Goiás e, logo depois, secretário estadual de Segurança Pública.
Diferença em termos, diga-se de passagem. Grampos telefônicos da Polícia Federal, que vazaram – é impressionante o volume de “vazamentos” no Brasil, graças a Deus! – à revista Veja, denunciam que Demóstenes Torres vinha sendo assediado pelo famigerado senador alagoano Renan Calheiros para deixar o DEM oposicionista e migrar para o PMDB governista. É interessante observar, também, que as denúncias contra o senador Demóstenes vêm à tona um mês depois de pipocar na imprensa gravações do mesmo Carlinhos Cachoeira novamente negociando propinas milionárias com deputados federais do PT de Goiás.
Pura coincidência? Ou demonstração do arco de ação de um megacontraventor? Sem qualquer julgamento maniqueísta, é bem provável que o senador Demóstenes Torres seja jogado aos leões em nome de uma “causa maior”, qual seja a devastação do governo petista de Dilma Rousseff e de sua base aliada. Nos bastidores, parlamentares de todas as siglas estão de cabelo em pé. Comenta-se que Cachoeira, diante de mais um escândalo de primeira ordem, estaria disposto a utilizar o instrumento legal da delação premiada na Justiça brasileira, colocando em xeque – e no alvo – senadores, deputados, governadores e prefeitos do PT, PMDB, PSB, PDT, PCdoB, PP e PR, além de oposicionistas do PSDB, PTB, PPS e do DEM. Nessa implosão também podem ser minados altos funcionários dos governos, juízes, desembargadores e até ministros do Supremo Tribunal Federal. Ao que tudo indica, Demóstenes Torres é só a ponta do iceberg, a remontagem político-teatral do “Homem-Bomba” de outrora.
No ano 349 a.C., o pensador e político da Grécia Antiga, Demóstenes – um provável estro ao senador democrata brasileiro –, escreveu em sua “Primeira Olíntica”: “Toda vantagem obtida no passado é julgada à luz do resultado final”. Não por acaso, alguns anos depois, Demóstenes – o grego! – foi condenado e perdeu reputação e influência por “comprar” um ministro de Alexandre, o Grande, que lhe facilitaria fuga de Atenas e do domínio macedônio. Por aqui, na tapera tupiniquim, o anúncio é um só: preparem os palhaços, porque a barraca do circo está montada! O novo “Homem-Bomba” da República já está confortavelmente instalado dentro do canhão e o estopim está acesso. O espetáculo vai começar!
Escritor, Jornalista Político, Palestrante e Conferencista
www.heldercaldeira.com.br – helder@heldercaldeira.com.br
*Autor do livro “A 1ª PRESIDENTA” (Editora Faces, 2011, 240 páginas), primeira obra publicada no Brasil com a análise da trajetória da presidente Dilma Rousseff, e comentarista político da REDE RECORD de Mato Grosso, onde apresenta o quadro “iPOLÍTICA”.
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