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CIDADE DA CULTURA: WILLIAM VERSUS ZEKATRACA - Por Evandro Casagrande


 CIDADE DA CULTURA: WILLIAM VERSUS ZEKATRACA - Por Evandro Casagrande - Gente de Opinião

Evandro Casagrande*

Li neste site a coluna Chutando o Balde, do professor William Haverly Martins, que critica com veemência a denominação dada ao espaço onde antes era  o Parque dos Tanques: Cidade da Cultura.

William, que é  escritor e  ativista cultural nativista, achou inapropriado chamar de Cidade da Cultura aquele local, prioritariamente para atender nossas manifestações folclóricas, em particular as quadrilhas e os bois-bumbás durante as festas juninas, como parte integrante do já tradicional Arraial Flor do Maracujá. O colunista questionou a imprecisão da denominação argumentando que o espaço não apresenta condições para promover e divulgar todas as artes.

A opinião do professor foi de pronto rechaçada por Sílvio Macedo, o popular Zekatraca, que assina há muitos anos uma coluna neste site e num jornal escrito da cidade. Sílvio, denotando estar com o brio ferido, reagiu com certa dose emocional ao questionamento. Alega que pelo simples fato de servir de palco para o Arraial Flor do Maracujá, que divulga, além dos bois e das quadrilha juninas, nossa culinária e nossas músicas já se justificaria o nome que lhe foi dado.

É compreensível que, no primeiro momento, o contestador, um dos maiores conhecedores de nossa cultura de raiz, carnavalesco dos mais respeitados em nosso meio, compositor de sambas-enredo de sucesso para nossas escolas de samba,  fundador, junto com o saudoso Manelão,  do maior evento do Carnaval de rua da região Norte, a Banda do Vai quem Quer, tenha se sentido ofendido por achar que William desqualificou as manifestações culturais populares que tanto ama.

Entro na roda para esclarecer: li e reli a combativa coluna de William e não vi qualquer resquício de desconsideração aos espetáculos a que se destina a tal Cidade da Cultura. Ninguém, de sã consciência, especialmente um nativista confesso como ele, pode rejeitar o que emana do sentimento de nossa gente com tamanha força e emoção. Festas juninas, sem quadrilhas nem bois, não são festas juninas, simplesmente porque perdem sua maior essência, a alegria. Não se tratou disso, portanto. A crítica feita pelo professor objetivamente se referiu à estrutura do local, que não se presta a todas, repito, todas as expressões culturais. Se não se preta a todas, tem toda a razão o articulista ao dizer que é equivocada (megalomaníaca, segundo ele) a decisão de chamar aquele espaço pelo nome tão abrangente de Cidade da Cultura. Diante dessa crítica, introduziram, de modo forçado, no dia seguinte, uns pintores para registrarem alguns aspectos do espetáculo que lá ocorreu, com intuído  de dizer que lá também serve às artes plásticas. Mas não colou! Apenas uma encenação, a despeito da presença de competentes artistas visuais.

Na prática, podemos considerar que estamos em ano eleitoral. Políticos são useiros e vezeiros em pirotecnias nesses períodos. Inauguram qualquer coisa como se fosse algo muito maior e mais importante do que verdadeiramente é. Vejam o tal Museu de Gente de Rondônia. Fizeram uma “inauguração” com a presença autoridades, até com mesa constituída para entronizar os mentores do museu, para  apresentarem algo que confunde o virtual com o invisível. Na verdade, é apenas uma site na internet, sem qualquer atrativo estético, com total  incipiência de diagramação (péssima, diga-se a bem da verdade!), onde se tem acesso a umas poucas  imagens mal produzidas de depoimentos de algumas pessoas (devem ter sido feitas com filmadora de vídeo antiga, sem iluminação adequada etc.). E mais, para se chegar aos depoimentos, é preciso acessar oYou Tube, porque no site mesmo, nada. Durante o “evento”, como de praxe,  tome discursos cheios de autopromoção, com explícito viés político que não convence mais ninguém. Inclusive o tal site informa que qualquer pessoas pode enviar os vídeos de quem quiser para fazer parte do museu — por óbvio, somente aquelas que são bons exemplos de gente que viveu ou vive aqui deveriam constar nessa seleção. Vê-se que foi algo criado sem planejamento, sem critérios, “nas coxas” como se diz vulgarmente, e que, por isso, em nada enobrece a imagem das pessoas desta terra. E mais: sem apoio efetivo do governo.

Qualquer espaço com a denominação pomposa de Cidade da Cultura merece muito mais. Há cultura popular, mas também cultura erudita.  Ambas merecem o mesmo respeito. Por isso, o bom gosto, o conhecimento e o bom senso recomendam a quem pode mandar trocar esse  nome ridículo por Espaço de Eventos, ou coisa que o valha. Do contrário, estamos assinando em baixo que nossa cultura, em toda a extensão que a dispomos, foi reduzido a uma festa folclórica ou um pouco mais. Isso, senhoras e senhores,  depõe contra nossa imagem, tão estigmatizada por vivermos longe dos grandes centros culturais.

* Pesquisador da cultura latino-americana

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