Sexta-feira, 22 de dezembro de 2023 - 12h23
Localizada às margens da BR-364, no perímetro urbano
de Porto Velho, a comunidade indígena Cassupá e Salamãi é composta hoje por 14
famílias, numa área de cerca de cinco hectares. Além da demarcação e posse
definitiva do território, eles sonham em trabalhar na própria terra e dali
poder tirar e ampliar a segurança alimentar das famílias. Sonho que começa a
ganhar forma com a implantação de um sistema agroflorestal comunitário,
idealizado pela Organização dos Povos Indígenas Cassupá e Salamãi (OPICS), que para
ser implantado contou com a parceria da Ação Ecológica Guaporé (Ecoporé),
Instituto Socioambiental (ISA) e Redário (articulação entre redes e grupos de
coletores de sementes).
Antes das 7h da manhã o movimento na área preparada
para o plantio, um antigo campo de futebol, já era intenso. Bocas de lobo
cavando em sincronia, mudas sendo posicionadas de acordo com o croqui que
mostrava a modelagem do SAF preparado junto com a comunidade, e a mão de obra
voluntária chegando uma a uma para se juntar ao mutirão de plantio, realizado
no último dia 15 de dezembro.
Aos 70 anos, liderança mais antiga do povo Cassupá,
seu José Inácio Cassupá foi um dos primeiros a chegar e só arredou o pé após a
última muda plantada. Para ele, o sentimento era de realização. “Há tempos que a gente andava procurando uma
entidade que pudesse ajudar a gente na restauração do campo ou mesmo numa
plantação, porque essa terra aqui já pertenceu a nós”, conta ele, já
imaginando como estará a área num futuro próximo e o legado que fica para as
próximas gerações. “Daqui há um ou dois
anos espero ver mais evoluído, ver o futuro das nossas crianças aqui. A gente
vai fazendo, vai construindo e deixando para os próximos”
Presidente da OPICS, Selmo Cassupá de Sousa vê no
projeto, além da reconversão produtiva da área, a possibilidade de geração de
alimento e renda para as famílias da comunidade. Ele conta que, devido a
limitação do tamanho da área, a maioria dos moradores acabam tendo trabalhos
informais fora da comunidade como fonte de renda. “E isso aqui [o SAF] vai ajudar muito na geração de renda e alimentos
para essas famílias. A gente espera daqui já alguns meses poder colher os
frutos daqui, poder ajudar na alimentação e vender”, projeta.
O projeto de implantação do SAF vai diretamente ao encontro
dos desejos da comunidade, visando exatamente melhoria da qualidade de vida e
renda deles, tendo os sistemas agroflorestais como ferramenta para a promoção
da segurança e autonomia alimentar, geração de renda e mitigação das mudanças
climáticas.
O modelo pensado para a área inclui espécies
florestais nativas e culturas anuais de vários ciclos. A engenheira agrônoma e
Presidente da Ecoporé Sheila Noele explica que a ideia é que, a partir do
arranjo produtivo proposto, a comunidade extraia alimentos e renda da área
durante quase todo ano. “Aqui as espécies
principais de curto e médio prazo são o abacaxi e a banana, então ano que vem
essa área já estará produzindo e a comunidade vai poder consumir, vai poder
vender, trocar entre si os produtos daqui”, explica. Noele reforça que a
implantação do SAF é uma iniciativa da própria comunidade. A Ecoporé, Isa e
demais parceiros são o aporte financeiro e técnico para o pontapé inicial.
Marcelo
Ferronato, coordenador técnico da Ecoporé, ressalta que além da produção de
alimentos, o uso de adubação verde, como o feijão de porco, é fundamental para
o sucesso da área, uma vez que esta planta fixa nitrogênio, elemento
fundamental para o crescimento das demais plantas do sistema. “A banana, por exemplo, para crescer e
produzir consome muito nitrogênio e o feijão de porco disponibiliza este
nutriente de graça, sem ter que adicionar adubo químico na área como a uréia, o
que aumenta a rentabilidade da produção ao reduzir o custo com insumos
externos".
Além
disso, a expectativa é de que a comunidade possa colher cerca de 500 quilos das
sementes de feijão de porco daqui a cerca de cinco a seis meses. "E essa produção será totalmente
adquirida pela Rede de Sementes da Bioeconomia Amazônia (RESEBA), uma
iniciativa da Ecoporé para dar suporte a restauração de ecossistemas por meio
da semeadura direta", finaliza Ferronato.
A ação em Porto Velho faz parte de um projeto maior,
que acontece também nos estados de Roraima, Mato Grosso e Pará, realizado pelo
Instituto Socioambiental com apoio da União Européia, inclui a parceria com
instituições locais parceiras, que consiste na implantação, estudos e
disseminação de modelos de restauração econômica com diversidade de espécies, a
fim de aliar os benefícios ecológicos, geração de renda e segurança alimentar,
explica a analista sênior de restauração ecológica do ISA.
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