O jornal exibido logo cedo, na TV do café da manhã do hotel, acabou com o meu dia. Há muito tempo não desejava tanto estar em outro lugar, mesmo com fome, como aconteceu naquela manhã. E olha que tinha tudo para ser um lindo dia. Mala pronta para voltar pra casa, sol bonito lá fora, sensação de dever cumprido após uma cansativa viagem, mas, e sempre o mas vem seguido de um certo peso, a televisão invadiu o ambiente cheirando a pão torrado e ovos mexidos, para espalhar um aroma de dor e tristeza.
Os assaltos seguidos de morte, com uma avassaladora onda de aumento desse tipo de crime, era a manchete da hora. Os relatos emocionantes de pais e mães que perderam seus filhos de forma tão estúpida e violenta foram tão vivos, que me pareceu ser impossível digerir o dia. E não só aquele: qualquer dia. Não quis me revoltar com a busca por culpados, a impunidade, a fragilidade da lei, a falência do respeito ao próximo. Não foi isso que mexeu comigo.
Me vi paralisado com o garfo na mão. Uma xícara fumegando ao lado e aquele silêncio brutal dentro de mim. Me veio um vazio, um buraco, um abismo, um não-sei-o-quê de lamento. Percebi que não queria chorar essas tantas mortes. Quem os amava mais de perto já está fazendo isso. Meu desejo de não estar ali não se resumia a uma fuga. Óbvio que sei como é o país onde vivo e conhecer suas histórias faz parte dessa batalha que é estar aqui.
Eu não queria estar ali por conta da tristeza de não poder.
Queria não ouvir e ver logo cedo esse cenário monstruoso que vivemos, porque não acredito que estejamos aqui para isso.
E que grande merda é não acreditar e ao mesmo tempo ser pisoteado pela verdade das ruas.
Pois eu senti fome o dia todo. E ainda sinto agora. E não é de pão, nem de circo.
Domingo, 24 de novembro de 2024 | Porto Velho (RO)