Domingo, 27 de setembro de 2009 - 20h31
Por Francisco Matias(*)
1. Lendo os jornais deste domingo, 26.09.2009, deparei-me com um artigo que considerei muito importante para a História Política de Rondônia, publicado no Diário da Amazônia e no site www.gentedeopniao.com.br . Escrito por Antonio Serpa do Amaral Filho, o popular “Bazinho”, o artigo traz à tona um dos mais curiosos e escondidos fatos políticos de nossa região e, talvez do Brasil. O título do artigo é “Mortos da Caçambada, por quê?” Nele, Antonio Serpa do Amaral Filho faz um breve relato daquela tarde de 26 de setembro de 1962, e lá se vão 47 anos, em que um motorista de uma caçamba da prefeitura de Porto Velho, cujo prefeito era das hostes aluizista e, portanto, cutuba, no bairro Olaria, região da grande Porto Velho, investiu (a propósito ou acidentalmente, não se sabe ao certo), o caminhão contra um grupo de partidários dos peles curtas. As pessoas atingidas haviam terminado de assistir ao último comício do médico Renato Medeiros, que disputava a única cadeira do Território Federal de Rondônia no Congresso Nacional. Naqueles tempos, os territórios federais somente podiam eleger um deputado federal, e isto a partir da promulgação da constituição federal de 1946, no final da Era Vargas e do famigerado Estado Novo.
2. Na época, o Território Federal de Rondônia se dividia em dois municípios: Porto Velho e Guajará-Mirim e havia espaço para esse tipo de política provinciana, em que dois grupos ou correntes políticas assumem o controle administrativo, político e social. Era o caso dos cutubas, uma corrente formada por partidários do PSD e do PTB, cujo líder maior era o coronel e deputado federal Aluízio Ferreira, todo-poderoso mandachuva que fazia e acontecia, protegido pela força do “varguismo”. A corrente pele curta foi fundada por seu adversário político e ex-aliado, Joaquim Vicente Rondon, quando foi eleito a deputado federal, em 1954. Mas, a continuidade do grupo somente foi possível com a liderança do médico Renato Medeiros, também ex-aliado e protegido de Aluizio Ferreira, mas agora seu adversário desde criancinha. Também pudera: por ordens do coronel Aluizio, Renato Medeiros, juntamente com o engenheiro Wadih Darwich e o médico Ary Pinheiro (este parente e aliado incondicional do coronel Aluízio), foram presos pelo governador Jesus Burlarmarqui, acusados de comunistas e de pretenderem instalar uma “república socialista” no Território.
3. Mas, como bem disse Antonio Serpa do Amaral Filho, naquelas eleições de 1962, o caudilho Aluízio Ferreira, em pleno exercício do terceiro mandato de deputado distrital federal, anunciou seu afastamento da vida pública, dizendo que “ao decidir não concorrer, mandava a política para o inferno”. Nada mais disse e ninguém se atreveu a perguntar-lhe. Mas, na qualidade de chefe político, ele pretendia manter o controle da região e lançou o governador, coronel Ênio Pinheiro, como seu candidato, colocando no cargo o funcionário Milton Lima. Nos palanques, na imprensa e nas ruas, cutubas e peles curtas só faltavam se matar, porque o resto eles faziam. Tiroteios, brigas de rua, incêndios de comitês, agressões físicas e morais davam a tônica da vida política local. Em Porto Velho, maior colégio eleitoral, predominava o eleitorado “catega”, madeiro-mamoreano e dos patrões dos seringais, que fortalecia a base cutuba. Em Guajará-Mirim, a força estava com os peles curtas, que avançavam, inclusive, na cidade de Porto Velho sobre um contingente eleitoral representado por um eleitorado mais jovem, incrustado nas escolas e nos pequenos comércio e, porque não dizer, na prefeitura e no palácio Pres. Vargas.
4. O grupo aluizista sabia que a derrota estava para acontecer. As músicas satíricas dos peles curtas eram as mais cantadas e davam o tom da campanha, como por exemplo a paródia de uma marchinha carnavalesca que dizia mais ou menos assim: “.... asfalto é pra pegar cutuba, pele curta ele não pega não”, era cantada nas ruas para ironizar o asfaltamento da av. Presidente Dutra, na descida do Palácio, feito, é claro, pela prefeitura cutuba. Em tudo isso, a questão ideológica ficava a anos luz de distância, apesar da tendência socialista de Renato Medeiros e seus seguidores mais próximos. O que valia mesmo era a conquista do poder e este, os cutubas não pretendiam entregar de mão-beijada aos “pobres” peles curtas. Talvez tenha sido unicamente para assustar o povão que caminhava ao lado de Renato Medeiros naquele final de tarde de 26 de novembro, que o motorista da prefeitura investiu contra a massa, atropelando, ferindo, matando e assustando. Pode ser que tenha recebido ordens para atropelar todo mundo e, como se fosse um acidente, matar o médico Renato Medeiros. Talvez tenha falhado ou nem pretendido.
5. Mas, seja como for, a “caçambada” cutuba sobre os peles curtas talvez tenha sido, como questiona o autor do artigo, o maior atentado político da história de Rondônia. No final, o escritor Antonio Serpa do Amaral faz um apelo aos historiadores para uma explicação plausível para o fato e fala do documentário que será lançado pelo cineasta Zola da Silveira sobre a política cutuba/pele curta. Tive o prazer de conhecê-lo, e trocamos informações. Fui amigo do seu pai, o jornalista Dionízio Xavier da Silveira, o “velho Dió”, comunista orgânico, integrante das hostes dos peles curtas, mas depois, por uma questão de salvar a própria pele das perseguições do regime militar, ou, como me disse Zola da Silveira, por uma estratégia do Partidão, deu uma guinada para a direita, foi vereador pela Arena de Porto Velho e fundador do PDS de Rondônia. Por várias vezes questionei o Velho Dió sobre o fato e, infelizmente, ele nada me esclareceu. Chego a pensar que, a exemplo da maioria dos antigos políticos de Porto Velho, ele vivia amedrontado pela sombra do coronel Aluízio Ferreira, condição de uma época em que nada podia ser dito contra o caudilho, sob pena, quem sabe, de sofrer uma “caçambada” cutuba.
Historiador e analista político(*)
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