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Francisco Matias

ELEIÇÕES 2014 – O VOTO NORDESTE




              ELEIÇÕES 2014 – O VOTO NORDESTE   

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“Mas doutor uma esmola, a um homem que é são, ou lhe mata de vergonha, ou vicia o cidadão”.
Essa estrofe do verso do compositor cearense Humberto Teixeira, médico e político, faz parte de uma música cantada por Luiz Gonzaga na década de 1940, na vigência do Estado Novo.

1.Na época, o povo nordestino passava por mais um período de seca, fome, empobrecimento e êxodo. O presidente Getúlio Vargas tomou as providências que todos os governantes que o precederam haviam tomado e tomariam aqueles que o sucederam: mandou distribuir dinheiro, comida, promessas vãs e construir açudes. Era uma forma de bolsa família, com o intuito de prestar auxílio a famílias carentes flageladas e submetidas a paliativos que, se resolveram temporariamente a fome, não solucionaram o principal problema: o uso da miséria com fins eleitoreiros, políticos e de permanência no poder. Foi assim e tem sido assim desde que o imperador D. Pedro II se disse disposto a “empenhar seu anel real para aplacar a fome do o povo do Nordeste”. Pois bem. Vamos voltar para os tempos do presente.

2.Depois do resultado do segundo turno,  o fator Nordeste -  e os nordestinos pobres - entraram na pauta da discussão politica, tendo como tema principal o programa Bolsa Família e seus efeitos na votação majoritária para a candidata Dilma Rousseff. Muito se falou sobre esse pacote de bondades que o governo do PT implantou “nesse país”, com ênfase ao Nordeste, mas de alcance nacional, e – pasmem -, internacional. Sabe-se agora que até no Paraguai o Bolsa Família funciona com fins eleitorais. Ah!, os indígenas também recebem os benefícios desse programa. Os índios votam. Mas foi no Nordeste que o Bolsa Família deu maior retorno eleitoral, por isso a discussão que tenta, injustamente, satanizar o programa do governo petista.

3.No meio de toda essa história tem uma história não contada e que o petismo, o lulismo, o dilmismo e o bolivarianismo preferem empurrar para baixo do tapete. Senão, vejamos. Alguém aí se lembra da ARENA? Não. Pois bem. A ARENA, ou Aliança Renovadora Nacional, era o partido que dava sustentação ao regime militar na época do bipartidarismo tutelado imposto pela ditadura de 1964. Os generais só permitiam o funcionamento de dois partidos, ARENA e  MDB (Movimento Democrático Brasileiro) que abrigava a esquerda e a centro esquerda na luta democrática contra a ditadura militar. A ARENA, o maior partido político da América do Sul. Seu maior reduto eleitoral estava no Nordeste. Por que será? Simples. O coronelismo adrede ao regime militar, distribuía comida e dinheiro ao povo do sertão, do agreste e das periferias das grandes cidades, além de outras ações paliativas que em nada resolviam os problemas das populações atingidas pela seca, fome e desemprego rural. O poder comprava voto, e ganhava todas e se mantinha no poder. A oposição acusava a ARENA de ser “o partido do Nordeste”, porque ganhava maciçamente na região e perdia no centro-sul.

4.No limiar da década de 1980, com a abertura democrática, surgiram outros partidos políticos. A ARENA deu lugar ao PDS, Partido Democrático Social, e o MDB virou PMDB, Partido do Movimento Democrático Brasileiro. Foram criados o PT, o PTB, o PSB, o PDT e outras legendas. O PDS, partido de sustentação do governo militar, não fez diferente, seguiu a cartilha assistencialista e venceu no Nordeste mas perde no centro-sul. É a fome, doutor! É a seca e falta proposital de políticas públicas efetivas de combate à pobreza endêmica do sertão, de fixação do homem no campo, de fortalecimento da produção. É o Nordeste sertanejo usado eleitoralmente por quem manda (e desmanda).

5.Mas vamos avançar um pouco mais nessa história. Vamos à década de 1990. Mais precisamente às eleições de 1994 quando o sociólogo Fernando Henrique Cardoso,FHC, hoje demonizado pelo PT, venceu o operário Luís Inácio Lula da Silva no primeiro turno. Era o tempo do Plano Real e de melhoria na economia. O povo nordestino, com a moeda de real nas mãos, estava feliz. Não deu outra: votou no candidato do governo (o presidente era Itamar Franco, que lançou seu ministro da Fazenda, FHC). Não deu outra: vitória no primeiro turno. Lula amargaria sua segunda derrota para presidente.  Em 1998, veio a reeleição. Novamente ficaram frente a frente a esquerda sindical, Luís Inácio Lula da Silva, e o presidente Fernando Henrique Cardoso, FHC. Mais uma vitória no primeiro turno. Lula perderia sua terceira eleição para presidente, duas vezes para FHC no primeiro turno. Não é à toa que o PT demoniza FHC.

6. Mais uma vez o Nordeste definiu a questão. O candidato Lula, em entrevista nacional, fez a seguinte observação: “É, infelizmente, o Nordeste vota pelo estômago”. Quando venceu as eleições, em segundo turno, em 2002, o presidente Luís Inácio Lula da Silva, de olho no voto estomacal dos nordestinos, lançou o programa Fome Zero difundido mundo afora. Daí para o Bolsa Família foi um passo, e uma certeza: “...Infelizmente, o Nordeste vota pelo estômago”. Taí o resultado. Por isso, quando se vê nas redes sociais as críticas ao Bolsa Família e aquele mapa destacando o Nordeste como “Cuba do Sul”, não faz sentido. O Bolsa Família não pode ser criticado, nem retirado e nem transformado em bandeira de partido político nenhum. E o Nordeste não é petista, nem lulista, nem dilmista, nem comunista. É GOVERNISTA. Seja qual for o governo. Na ausência de melhores alternativas, um pouco de comida, um dinheirinho pra “bodega” e um afago nas crianças pálidas, é o bastante para, como cantou Luiz Gonzaga, “viciar o cidadão”. Tá eleito, ô xente!

Historiador e analista político*

Porto Velho, 02.11.2014

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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