Segunda-feira, 9 de julho de 2012 - 20h41
Por Francisco Matias(*)
1. A CONSTRUÇÃO DA FERROVIA MADEIRA-MAMORÉ - Não se trata apenas de coincidência histórica. O mês de julho exerce uma importante influência no processo de formação sociopolítica de Porto Velho e, por extensão, do estado de Rondônia. Algumas datas deste mês, apesar de equivocada e deliberadamente esquecidas, são marcantes para a existência do Estado, queiram ou não aqueles que se arvoram “donos da História”. Por considerar de suma importância a divulgação de fatos relacionados à história destas plagas do poente, esta coluna insiste dar sua contribuição para a restauração da memória histórica rondoniense, apresentando as efemérides mais relevantes de julho. Para começar, falamos do 4 de julho de 1907. Este poderia ser um dia como outro qualquer, não fosse a data da independência dos EUA, o Independence Day. Em todas as representações dos EUA pelo mundo afora ocorre esta comemoração. Onde houver uma representação qualquer norte-americana, a data estará sendo festejada. No ano de 1907, em pleno coração da Amazônia, às margens do rio Madeira, no porto conhecido como porto velho, situado em terras do município de Humaitá,AM, na fronteira com o Mato Grosso, técnicos e operários do consórcio May & Jeckill, (posteriormente houve a inclusão da empreiteira Randolph) lançaram a pedra fundamental da ferrovia Madeira-Mamoré.
2. Programada para ser construída em terras do estado do Mato Grosso, a partir da cachoeira de Santo Antonio, no rio Madeira, até a de Guajará Mirim, no rio Mamoré, a ferrovia teve seu trecho, estendido ao Amazonas, alterado em quase seis km. As razões alegadas foram relativas à geomorfologia, ao isolamento povoado de Santo Antonio, considerado “um antro de podridão”, de difícil acessibilidade, não adequado para a construção da estação inicial Madeira. Apesar de o governo imperial brasileiro haver construído no local um moderno porto para os navios a vapor, o megainvestidor americano Percival Farqhuar decidiu que o lugar menos insalubre seria o antigo porto amazônico, na área do município de Humaitá, chamado de porto velho, em razão do funcionamento, em Santo Antonio, do Porto dos Vapores, que passou a ser conhecido como “porto novo”. Do porto novo mato-grossense ao porto velho amazonense, o consórcio May, Jeckkil e Randolph completou a transferência de toda a infraestrutura de engenharia, material, técnicos e operários em abril/1907. Ali, no porto velho, foram construídos alojamentos, barracas e postos de apoio para o início das obras.
3. Contudo, os norte-americanos aguardaram o dia 4 de julho para o lançamento da pedra fundamental, simbolizado pela fixação de um prego de prata no primeiro dormente, como era praxe no início das obras ferroviárias norte-americanas. A razão da espera deu-se pelo forte simbolismo da data. Afinal, a Madeira-Mamoré seria mais uma bandeira dos EUA a ser fincada na Amazônia. Um empreendimento norte-americano, construído com now how norte americano, por técnicos e operários norte-americanos e, sobretudo, aliada à filosofia ocupacional da Amazônia praticada pelo governo dos EUA. Por isso, naquele dia 4 de julho de 1907, uma quinta-feira, surgia um núcleo populacional em forma de acampamento ferroviário, outro enclave dos EUA na Amazônia, consequência do processo de anexação do Acre, das negociações Brasil/Bolívia/EUA, do fechamento da questão com o Bolivian Syndicate e a Casa Bancária do Barão de Rothschild. Era, ao final, o porto indicado para sediar a Madeira-Mamoré, uma das compensações do Brasil à Bolívia, previstas no Tratado de Petrópolis, de 17 de novembro 1903, celebrado quatro anos antes. Começava a surgir um núcleo de povoamento, vinculado à nova estação inicial da Madeira-Mamoré, que os norte-americanos denominaram, inicialmente, Porto Velho of the Madeira River.
4. Esta pode ser considerada a data de julho mais importante para a formação do estado de Rondônia, na medida em foi inaugurada, oficialmente, a povoação que daria origem à cidade de Porto Velho. Mas não é. Os “donos” da História, brandindo documentos posteriores à data do 4 de julho, conseguiram, até por questões ideológico-partidárias e, sobretudo, por interesses comerciais, convencer as autoridades municipais e estaduais de que “não houve o 4 de julho de 1907”. Nesta linha de raciocínio, no ano de 1907, os norte-americanos esqueceram de comemorar o dia de sua independência. Portanto, historiadores e pesquisadores que levantam este fato baseados em fundamentos históricos e geopolíticos, estão, na ótica dos “senhores” da história, no mínimo “enganados”. E, assim, sob esta ótica e seguindo tal linha de raciocínio, as comemorações dos cem anos da Madeira-Mamoré ficarão limitadas, e muito menores do que poderiam ser, por se referir, pura e simplesmente, à Ferrovia e não à geopolítica internacional e interregional decorrente. Aliás, não se fala, de modo algum no 4 de julho, afinal, o simbolismo da data invoca ao “maldito” capitalismo e imperialismo norte-americanos, como se a ferrovia Madeira-Mamoré não fosse um empreendimento capitalista e imperialista norte-americano, ou, como se o 4 de julho fosse um pecado ideológico, indigno de existir. Como se a bandeira hasteada no pátio da estação inicial Madeira, a partir de 1907, não fosse a dos EUA. Como se aqui, na “beira” do Madeira, fosse uma região desvinculada das questões do Acre. Ledo Engano. Triste disputa. Os enganos e as disputas mais atrapalham do que ajudam na elucidação histórica da Madeira-Mamoré.
5. Daqui a poucos dias os governos municipal e estadual irão realizar uma festa para comemorar os cem anos de inauguração da ferrovia Madeira-Mamoré. Seria impensável a não ocorrência desta efeméride. Mas, o vazio histórico vai continuar até o dia em que as autoridades resolverem patrocinar pesquisadores para lançar novas luzes sobre as causas e efeitos da ferrovia. Ah! Foi o Tratado de Petrópolis e a compra do Acre que proporcionaram a épica construção da Madeira-Mamoré! Sim. Porque foi sob a égide do Tratado de Permuta de Territórios e Outras Compensações, firmado na residência do chanceler José Maria da Silva Paranhos Junior do Rio Branco, o Barão do Rio Branco, situada à rua Westphália, cidade de Petrópolis, Rio de Janeiro, que as partes interessadas, Brasil e Bolívia, resolveram ratificar e ampliar os termos do Tratado de La Paz, celebrado na cidade de La Paz quando tropas brasileiras e bolivianas ocupavam o Acre, e a região estava dividida entre o domínio do governo brasileiro e dos milicianos liderados pelo caudilho Plácido de Castro.
6. Mas, será este o limite histórico? Não, porque outros documentos diplomáticos foram firmados, a exemplo do Tratado de Ayacucho, de 1867, através do qual o Brasil reconheceu o Acre como posse territorial da Bolívia, abandonou os brasileiros ali radicados à própria sorte, liberou a navegação justafluvial à Bolívia e permitiu ao governo boliviano construir a ferrovia Madeira-Mamoré. Em outro acordo diplomático, o Brasil vai auxiliar à Bolívia, ao firmar, em 1882, o Tratado de Navegação e Construção de Via Férrea, em decorrência da derrota da Bolívia na Guerra do Pacífico, quando perdeu sua região costeira para o Chile e ficou na difícil condição de país mediterrâneo. Por este tratado, o governo imperial brasileiro autoriza a construção do porto dos vapores e envia comissões de estudo para o vale do Madeira. É o começo do envolvimento direto do Brasil com a Madeira-Mamoré.
Historiador e analista político*
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