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Francisco Matias

RONDÔNIA E O MÊS DE JULHO – PARTE I


FRANCISCO MATIAS, ESCREVE

RONDÔNIA E O MÊS DE JULHO – PARTE I

RONDÔNIA E O MÊS DE JULHO – PARTE I - Gente de Opinião

O militar Aluízio Ferreira, considerado “O Nacionalizador”

1.A NACIONALIZAÇÃO DA MADEIRA-MAMORÉ - O processo de formação sociopolítica, histórica e econômica de Rondônia reúne vários fatores geopolíticos marcando uma profunda interrelação com algumas das mais intrincadas questões nacionais, internacionais e interregionais. Neste contexto, diversos mitos fundantes, materiais, e/ou, imateriais, foram, e ainda são, responsáveis pelo surgimento da sociedade rondoniense ao longo de três séculos de povoamento. Talvez a ferrovia Madeira-Mamoré seja o mais importante mito fundante material do estado, considerando-se seu projeto, os interesses internacionais envolvidos e as graves condições em que ocorreram as duas fases de sua construção: a primeira, em meados do século XIX (1870-1880), e a segunda no início do século XX, (1907-1912). A Madeira-Mamoré transcende regimes e sistemas de governo. O Império e a República permeiam sua existência.

2. Portanto, além do 4 de julho, dia do lançamento da pedra fundamental da ferrovia e da fixação simbólica do cravo de prata no primeiro dormente, outras datas do mês de julho têm importância geoestratégica para a existência do estado de Rondônia. No ano de 1931, o 10 de julho marcaria a vida de Porto Velho, município pertencente ao estado do Amazonas, de Santo Antônio e Guajará Mirim, ambos no estado do Mato Grosso, da Madeira-Mamoré, e, em um futuro próximo, do estado de Rondônia, em virtude da decisão do grupo Forbes, acionista maior da empresa The Madeira-Mamoré Railway Company, de paralisar os serviços da ferrovia. Foi o pano de fundo para a Madeira-Mamoré tornar-se a primeira empresa de capital estrangeiro a ser nacionalizada no Brasil. Era o início da Era Vargas (1930-1945), cuja política era nacionalista e contrária aos EUA. Havia o rufar de tambores nacionalistas executados pelo gaúcho Getúlio Vargas. A Madeira-Mamoré era uma empresa anglo-canadense, muito problemática política e economicamente para a filosofia autoritária de uma ditadura que começava a tomar conta do país: a Ditadura Vargas.

3.Contudo, os problemas geopolíticos, econômicos e contábeis da empresa Madeira-Mamoré serviram apenas como pano de fundo utilizado pelo presidente Getúlio Vargas para não atender aos diversos pleitos da empresa por recursos do governo para tocar seus serviços. Na verdade, a Madeira-Mamoré estava em decadência desde sua inauguração em 1912, não somente

por conta do declínio do primeiro ciclo da borracha (1850-1920), mas, sobretudo, pelo mal que o Tratado de Petrópolis lhe causou. Berço e túmulo da ferrovia, o acordo firmado em Petrópolis, em 1903, estabelecia que o valor pago pelo Brasil à Bolívia, 2 milhões de libras esterlinas, deveria ser aplicado na construção de ferrovias ligando a Bolívia ao Brasil e à Argentina. Prego batido, ponta virada. Por isso, a Madeira-Mamoré nasceu agonizante. A situação piorou com a quebra da Bolsa de Valores de Wall Street, em 1929. A empresa anglo-canadense, ex-norte-americana The Madeira-Mamoré Railway Company negociava seus títulos e ações em New York, na agora falida Wall Street. Era fácil juntar os fatos para que Mr. Willian Cameron Forbes, o novo dono da Madeira-Mamoré, decidisse pelo fechamento da empresa no Brasil. Isto ocorreu no dia 30 de junho de 1931.

4.Dez dias depois, um telegrama do ministro da Viação, José Américo de Almeida ao capitão Aluízio Ferreira, em Porto Velho, comunicava a decisão do governo Vargas de reativar os serviços ferroviários, readmitir os funcionários, encampar a empresa e nacionalizar seus ativos. Do telegrama constavam trechos do decreto-lei número 20.200, de 10 de julho de 1931. Por este decreto-lei, o capitão Aluízio Ferreira assumiria a direção da empresa Estrada de Ferro Madeira-Mamoré, e se tornaria o primeiro brasileiro a administrar uma empresa de capital estrangeiro no Brasil, na medida em que as negociações com o grupo Forbes e o governo Vargas estavam em curso e se estenderiam por mais seis longos anos até ser consolidado o processo de nacionalização. Desta forma, a Madeira-Mamoré passou da condição de empresa privada estrangeira, para empresa estatal brasileira. E lá se vão oitenta e seis anos.

5.Como se pode observar, o processo de nacionalização da Madeira-Mamoré não estancou com a edição do decreto-lei 20.200/1931. O governo Vargas teve de abrir várias rodadas de negociação com o consórcio anglo-canadense, proprietário da empresa. Desse modo, o presidente Getúlio Vargas expediu o decreto-lei 24.569, de 06 de julho de 1934 (olha o mês de julho na história!!) deliberando sobre a revisão do contrato de arrendamento firmado entre o sindicato Farqhuar e o governo brasileiro em 25 de fevereiro de 1909, conforme o decreto 7.344/1909, no governo do presidente Nilo Peçanha, ainda vigente em 1931. As conversações continuaram, envolvendo a diplomacia brasileira e os representantes de Willian Cameron Forbes. Somente no dia 05 de abril de 1937, o governo declarou encerradas as negociações e expediu o decreto-lei 1.547/1937, através do qual foi rescindido o contrato de arrendamento com a empresa The Madeira Mamoré Railway Company, com sede nos EUA e, não nacionalizada, evidentemente. A partir de então, os ativos da empresa Madeira-Mamoré no Brasil foram incorporados ao sistema estatal brasileiro. Estava encerrado o processo de nacionalização da ferrovia Madeira-Mamoré.

Historiador e analista político*

Porto Velho, 10.07.2017

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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