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Francisco Matias

USINA DO JIRAU, O POMO DA DISCÓRDIA- PARTE 2


Por Francisco Matias(*)

1. A Usina Hidrelétrica do Jirau integra o Complexo Madeira que se constitui, no final e ao cabo, em um importante planejamento geoestratégico do governo brasileiro. Seu funcionamento, juntamente com o da Usina de Santo Antonio, irá propiciar suporte de energia elétrica à Usina Binacional Itaipu, o que reduzirá os riscos de apagões que tantos estragos causam às figuras políticas dos governantes de plantão e, pior ainda, às economias das regiões onde esses blackouts ocorrem. No entanto, a história desta usina hidráulica do Madeira tem sido permeada por fatos e acontecimentos que nem o melhor estrategista poderia prever. Primeiro foi o problema com a Bolívia. Em 2007, o presidente Evo Morales questionou o governo brasileiro sobre a liberação da licença ambiental desta usina, por um motivo geográfico: o salto do Girau (com gê), no rio Madeira, município de Porto Velho,  fica localizado na faixa de fronteira do Brasil com a Bolívia. Porto Velho, só a titulo de informação, é um dos nove municípios rondonienses situados na linha da fronteira boliviana. Evo Morales não se fez de rogado e exigiu a mudança da localização da usina, no que foi prontamente atendido pelo presidente Lula. Na sequência, a Bolívia criou uma confusão tremenda por causa do Acre, alegou que o Brasil havia dado um calote no pagamento e ainda levou de quebra uma usina, a do rio Beni, a ser construída em pleno território da Bolívia, como parte do Complexo Madeira.

2. Por isso, a Usina do Jirau (com jota) fica na cachoeira do Caldeirão do Inferno e não no salto do Girau (que não é uma cachoeira, convém frisar). Para completar o caldeirão infernal em que iria se meter, o consórcio construtor (ESBR, Leme Construtora, Camargo Correa e a francesa Suez) teve de refazer o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e o Relatório de Impactos Sobre o Meio Ambienta (RIMA). No plano político-administrativo, o presidente Lula, do alto do seu prestígio, demitiu a ministra Marina Silva, do Meio Ambiente, dividiu o IBAMA em dois quebrando ao meio sua influência, e ameaçou construir uma usina nuclear caso não fosse liberada a licença de construção do Jirau. Uma confusão para ninguém botar defeito. De todo modo, a Usina do Jirau saiu do papel foi para a prática, a despeito de todos os contratempos que enfrentou, enfrenta e, certamente, irá enfrentar.

3. Os fatos ocorridos nos dias 16, 17 e 18 de março 2011, e seus desdobramentos futuros, mostram que o Jirau é, na verdade, um caldeirão do inferno pronto para explodir seja por qual motivo for. As imagens mostradas na TV, nos jornais impressos e eletrônicos com filas de empregados percorrendo a pé a BR 364, a quantidade de ônibus incendiados e outros contratados emergencialmente formando uma extensa caravana para deslocar os 20 mil operários desalojados, tendo ao fundo nuvens de fumaça brotando dos escombros dos alojamentos, revelaram que a situação, se estava ruim, pode piorar. Tem um adágio popular no nordeste que diz assim: “cesteiro que faz um cesto faz um cento, só precisa ter palha e tempo”. Pois é. A peãosada não queima sua moradia, não destrói seu local de trabalho sem ter uma liderança profissional neste tipo de ação. Logo, o fogo foi apagado mas ainda resta fumaça no ar. E onde há fumaça há fogo. O caldeirão pode voltar a ferver. Palha e tempo são o que não faltam a quem tem este tipo de missão a cumprir, infelizmente.

4. Como resultado final restam os prejuízos financeiros, políticos e de cronograma da obra. O poder público, por exemplo, entenda-se governo do Estado, federal e municipal, gastou uma fábula do erário para mobilizar seu aparato de segurança envolvendo policiais militares, civis, federais e guarda nacional, aviões, helicópteros, locação de ônibus, deslocamento de pessoal militar do interior para a capital e uso, inclusive de aviões Búfalos da Força Aérea. O consórcio, por sua vez, além da paralisação das obras, amargou um prejuízo financeiro imenso ao ter de repatriar milhares de operários, adquirir alimentos e colchões e reconstruir tudo o que foi destruído no canteiro de obras. Por outro lado, a sociedade porto-velhense ficou em polvorosa. A UNIR foi evacuada, com medo de ocupação e vandalismo, o comércio baixou suas portas, algumas escolas ficaram sem aula e o medo pairou sobre a cidade com os boatos de saques, inclusive com detalhes, como se tivessem acontecendo. Na outra ponta do problema, os operários da usina que tiveram de se deslocar para a cidade de Porto Velho e, sem alojamentos adequados, pernoitaram em ginásios e casas noturnas, vigiados pela PM, sem saberem muito bem o que viria depois. Um caos que a História de Rondônia irá registrar ainda muito detalhadamente, quando as luzes forem acesas sobre os fatos que o originou.

Quem viver verá.

 

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Fonte: Francisco Matias - Historiador e analista político

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