Quarta-feira, 23 de janeiro de 2019 - 08h41
A estreia internacional do
presidente Jair Bolsonaro revelou bem mais do que sua capacidade de quebrar
protocolos oficiais, despistar a imprensa e ir almoçar num self-service de supermercado, ou sua emoção legítima ao discursar,
agora na condição de Chefe de Estado, para uma miríade de líderes,
investidores, empresários e jornalistas dos quatro cantos planeta. A edição
2019 do Fórum Econômico Mundial, em Davos (Suíça), exibiu a faceta mais
dramática da esquerda brasileira: a amnésia.
Em seis minutos, Bolsonaro
apresentou um discurso enxuto e sem fantasias. Foi direto aos temas de
interesse de quem vai a Davos para o meeting
anual, apresentando as linhas gerais do que pretende realizar em sua gestão,
com foco principal nas privatizações, no equilíbrio fiscal, na segurança
jurídica e no combate à corrupção. Consumiu outros oito minutos respondendo,
com clareza apesar da tensão, às questões capciosas do alemão Klaus Schwab, fundador
do Fórum. Com apenas 22 dias de governo, após assumir um país devastado e em
frangalhos, a estreia internacional do novo presidente do Brasil cumpriu sua
missão.
No entanto, esses 14 minutos de
bolsonarismo na Suíça causaram uma verdadeira tromba d’água de lágrimas entre
os notórios “especialistas” da
imprensa, repercutindo diretamente nas redes sociais. O jornal espanhol El País cravou que “o discurso de Bolsonaro decepcionou Davos”; a BBC disse que o presidente “perdeu
a chance de mostrar uma agenda”; o norte-americano The New York Times classificou Bolsonaro como “a antítese de quem participa do evento” e “a face do populismo em Davos”, usando expressões como “Trump dos Trópicos”. Já as milícias
entocadas no jornalismo brasileiro partiram para o ataque, recheando sites e
blogs com barbaridades que foram de “fiasco
internacional” à “vergonha para o
Brasil”, enquanto os telejornais das grandes emissoras limitaram-se ao tom
lacônico, quase um desprezo arrogante. Um espetáculo de má-fé, em suma.
Em dias assim, é notável como a
amnésia pode ser uma oportuna aliada. Fingir esquecimento, ser vítima de lapsos
seletivos de memória, é algo próprio a quem faz da crítica um mero para-lama de
carro velho com pneu careca. Então, que tal uma visita ao passado recente, para
tentar reavivar a lembrança do que era o Brasil há cinco anos e o que disseram,
à época, esses doutos “especialistas”.
Ao final, é você, leitor ou leitora, quem irá tirar sua própria conclusão.
Vamos lá?
Há exatos cinco anos, em janeiro
de 2014, a então presidente Dilma Rousseff debutava em Davos. Nos três
primeiros anos de seu mandato preferiu não ir ao Fórum Econômico Mundial. As
manifestações de junho de 2013 sacudiram seu governo, já cambaleante pela
política econômica esquizofrênica e pelos primeiros sinais de que a era PT
chegaria ao fim em breve. Ainda assim, Dilma discursou por 35 minutos,
apresentando um Brasil idílico, “uma das
mais amplas fronteiras de oportunidades de negócio”, onde “o controle da inflação e o equilíbrio das
contas públicas são requisitos essenciais” e, pasmem os desmemoriados,
concluiu afirmando que “a
responsabilidade fiscal é um princípio basilar de desenvolvimento econômico e
social”.
Esse carrossel de falácias
rendeu manchetes nos principais jornais do mundo. O respeitado Financial Times não poupou elogios e estampou
que a presidente do Brasil havia lançado “uma
ofensiva de charme sobre as corporações”; a BBC disse que Dilma havia feito “um discurso sob medida”; o ex-presidente do Banco Interamericano de
Desenvolvimento (BID), Enrique Iglesias, avaliou a fala como “positiva e realista do potencial do Brasil”;
já Carlos Represas, presidente latino-americano da Bombardier — empresa que dois anos mais tarde se uniria à Airbus para
fabricação de aeronaves de médio porte com o objetivo derrubar a brasileira
Embraer — avaliou que Dilma havia feito “um
bom apanhado de suas realizações e planos” e concluiu garantindo ter “gostado muito” do que ouviu; executivos
de empresas brasileiras, como Bradesco e Itaú, saíram da apresentação
dizendo-se “convencidos de que a direção
do governo Dilma é correta”. Pois é... deu no que deu!
A propósito,
essa viagem internacional de Dilma Rousseff gerou escândalos que até hoje
repercutem nas contas públicas brasileiras. Depois de toda conversa fiada em
Davos, a imensa comitiva oficial — foram necessárias duas aeronaves: o Avião
Presidencial Brasileiro e outro jato da FAB — fez uma polêmica escala, fora da
agenda, em Portugal. Em Lisboa, a trupe vermelha ocupou 30 suítes nos luxuosos
hotéis Ritz Four Seasons e Tivoli. Sua Excelência ficou na suíte presidencial
do Ritz pela bagatela diária de R$ 26
mil, então equivalentes a 36 salários mínimos. Além disso, o crème de la crème da comitiva foi jantar
às margens do Rio Tejo, no Eleven, o
mais badalado restaurante lisboeta, flagrados à saída carregando sacolas com
vinhos caros e outras “lembrancinhas”.
Como esquecer a famigerada foto da presidente aparentando ter exagerado um
pouquinho nos vinhos portugueses durante o jantar? Tem gente que esquece!
Cereja desse
bolo de tolos, a turma deixou Portugal e foi direto para Cuba, onde Dilma
Rousseff desembarcou para inaugurar o Porto de Mariel, obra faraônica e
superfaturada executada pela Odebrecht e escandalosamente financiada pelo
dinheiro dos pagadores de impostos brasileiros através do BNDES, em acordo
firmado pelo então presidente Luiz Inácio da Silva — vulgo “Lula” — e a ditadura cubana, cujo sigilo
dos documentos se estenderá até 2027. Em números oficiais da negociata, o
Brasil emprestou à Cuba US$ 682 milhões — cerca de R$ 2,5 bilhões —, cujas
prestações vão até 2034. No entanto, desde junho de 2018 o governo cubano
oficializou o calote e parou de pagar a dívida. E quem é o fiador desta
bagaceira? O Fundo de Garantia à Exportação (FGE), criado pela Lei nº
9.818/1999 e bancado pelo Tesouro Nacional. Ou seja, o dinheiro do Povo
brasileiro pagou pelo porto cubano e também está pagando pelo calote.
Agora, após este breve passeio
pela memória recente, deixo com você, caríssimo leitor ou leitora, o direito de
concluir aquilo que melhor entender como moral da história. De minha parte,
cumpre apenas salientar que considero absolutamente tragicômica a amnésia da
esquerda e de seus tentáculos midiáticos. Não respeito aqueles que tão vergonhosamente
desprezam a memória.
*HELDER CALDEIRA é Escritor, Palestrante e Especialista em
Relações Institucionais. Autor dos livros “Águas
Turvas” (2014), “Pareidolia Política”
(2012), “Bravatas, Gravatas e Mamatas”
(2011), entre outros. Contato: helder@heldercaldeira.com.br
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