Terça-feira, 14 de janeiro de 2020 - 12h07
Bagé, RS, 14.01.2020
Jornal do Brasil, n° 100 – Rio,
RJ
Domingo e Segunda-feira, 04 e
05.08.1968
Justiça de Cuiabá Entrava
Punição
à Chacina de Índios
[Sergio Galvão]
CUIABÁ E ARIPUANÃ ‒ O assassinato há cinco
anos de nove membros da tribo Cinta-Larga,
inclusive uma criança de colo e uma mulher [rasgada ao meio até quase o
pescoço] ‒ um dos mais bárbaros crimes contra os índios ‒ pode acabar sem
qualquer punição, porque a Justiça de Mato Grosso vem procurando inocentar os
culpados, por todos os meios, apesar dos protestos da população do Estado.
No momento em que o Governo Federal dá por
encerrada a investigação da matança de índios, com a conclusão dos inquéritos
no extinto Serviço de Proteção aos Índios ‒ o Ministro do Interior chegou a
afirmar que “o Executivo fiz tudo que lhe
cabia; a Justiça comum deve agora punir os culpados” ‒ o JB levanta todo um
processo em poder da 3ª Vara de Justiça de Cuiabá, para mostrar como funciona a
Justiça em um caso que envolve importantes seringalistas.
Crime
O processo na 3ª Vara de Justiça de Cuiabá,
prova que, em setembro de 1963, às margens do Rio Aripuanã, em Mato Grosso, nove índios da tribo Cinta-Larga foram
barbaramente assassinados pelos membros de expedição organizada por Francisco
Amorim de Brito, encarregado geral da firma seringalista “Arruda & Junqueira e Cia. Ltda.”, situada na localidade de
Juína-Mirim, às margens do Rio Juruena. Ficou provado que o chefe da expedição,
depois de ter assassinado uma criança de colo com um tiro na cabeça, arrastou a
mãe para perto de uma árvore e amarrou-a fortemente de cabeça para baixo entre
duas árvores, aplicando-lhe em seguida, com um facão de mato, violento golpe
que a dividiu até o peito. Os réus confessaram o crime.
Missão
Cumprida à Risca
Composta por Ataíde Pereira dos Santos,
Manuel Virgílio de Almeida, Ramiro Casta e Silvestre de tal, a expedição foi
chefiada por Francisco Luís da Costa, vulgo “Chico Luís”. Sua missão era colher poaia [ou ipeca ([1]),
raiz muito utilizada na homeopatia].
Após um dia de caminhada pelo mato, os companheiros
fizeram ver a Chico Luís que era perder tempo seguir à frente, argumentando que
o terreno era seco e, portanto, nele, não se encontraria poaia. Chico Luís
respondeu, porém, que a tarefa não era colher poaia, e sim “caçar índios”. A informação causou
protestos dos companheiros. ‒ Quem aguentar, vai. Quem não aguentar, passa pra
lá ‒ respondeu Chico Luís, dando a entender que estava disposto a cumprir as
determinações recebidas de Francisco Amorim de Brito, mesmo que fosse necessário
usar a força.
A expedição prosseguiu, caminhando na mata,
depois de ter atravessado o Rio Juruena. Após alguns dias de caminhada, os
mantimentos acabaram. Passaram a alimentar‒se de caça e palmitos até que
encontraram um roçado pertencente aos índios, onde existia batata, aipim e
cará.
Ali fizeram acampamento, armando barracas de
matéria plástica. Ao fim de sete dias, um avião reequipou a expedição de
munição, roupas, remédios e mantimentos. Lançado do avião, um bilhete assinado
por Francisco de Brito que continuassem em frente, pois adiante existia um Rio
e, provavelmente, também os índios. Após várias horas de viagem, chegaram ao
Rio, onde acamparam.
No dia seguinte, reiniciaram suas atividades,
quando em dado momento avistaram fumaça. Passaram a andar com cautela, até que
viram uma maloca, perto da qual alguns índios trabalhavam na construção de mais
duas. Tomaram posição de ataque atrás das árvores. Os índios não perceberam.
Muitos tiveram tempo de fugir para o mato, sete caíram mortos.
Ficou apenas uma índia, com seu filho no
colo. Ataíde propôs a Chico que levassem a mulher e a criança para a Missão do
Utiariti. Chico Luís não lhe deu ouvidos. Sacou de um revólver calibre .45, deu
um tiro na cabeça da criança e esquartejou a mãe.
Crime
Descoberto
A chacina teria sido ignorada como “segredo da selva” se dois anos mais
tarde, revoltados com os maus tratos de Chico Luís e Francisco de Brito, Ataíde
não tivesse fugido do seringal e contado a história ao Padre Edgard Smith, que
a gravou. Presos os integrantes da expedição confirmaram a história.
Nos depoimentos colhidos pelo presidente da
Comissão de Inquérito, Inspetor da PF Job Maia Salgado, muita coisa ficou para
ser apurada, inclusive as denúncias do padre Francisco Valdemar Veber:
‒ Não é de hoje que a firma Arruda &
Junqueira vem praticando crimes contra os índios, pois já organizou várias
expedições punitivas contra os mesmos; o seringal da firma Arruda &
Junqueira é apenas um argumento que serve de trampolim para outros empreendimentos,
como sejam a exploração de minérios e aquisição de fazendas, com o dinheiro
adquirido no Banco de Crédito da Amazônia; essas expedições têm por objetivo
afastar os índios das regiões ricas em borracha, cassiterita, ouro, diamante,
breu e outros minérios.
Conclusões
Finais
Muitas dificuldades encontrou a Comissão de
Inquérito. O padre Edgard Smith, autor da gravação, apesar de ter sido
insistentemente procurado em Mato Grosso, Brasília, Rio e São Paulo, não foi
encontrado. O mesmo ocorreu com o piloto Toschios Lombardi Xato, condutor e
orientador da expedição, Silvestre de tal, um dos acusados, está desaparecido
até hoje. Zuíno Boliviano, cujo depoimento seria uma peça forte no processo,
morreu afogado no Rio Juruena, “quando
pescava”. Francisco de Brito, organizador da expedição, foi assassinado
numa revolta de seringueiros.
Mesmo assim, o Presidente da Comissão de
Inquérito, com os dados que colheu, concluiu seu trabalho apontando os
componentes da expedição como Incursos no Artigo 121, Parágrafo 2°, Inciso IV,
do Código Penal.
E Antônio Mascarenhas Junqueira e Sebastião
Palma Arruda ‒ proprietários da firma Arruda & Junqueira e Cia. Ltda. ‒
como incursos nas penas do Artigo 121 e 25 do Código Penal.
As conclusões foram encaminhadas ao juiz da
3ª Vara da Justiça de Cuiabá, em 29 de junho de 1966.
Como
Age a Justiça ([2])
Em julho de 1966, o promotor público de
Cuiabá, Sr. Luís Vidal da Fonseca, levantou o problema da incompetência do
Juízo de Cuiabá, em virtude de o crime ter ocorrido no município de Aripuanã “que pertence à Comarca de Diamantino [Artigo
70, do Código de Processo Penal]”. Diante disso, o processo foi para a
Comarca de Diamantino. O juiz de Diamantino, Sr. Carlos Avalone, mandou o
processo de volta, porque Aripuanã pertence a Cuiabá. Reconhecida a competência
do Juízo de Cuiabá, o promotor Luís Vidal da Fonseca, alegando ter sido
advogado da firma Arruda & Junqueira ‒ com fundamento no Art. 214, I, IV e
258 “in fine”, do Código de Processo
Penal ‒ deu-se por suspeito para fazer a denúncia.
O outro promotor, Sr. Benedito Pereira do
Nascimento, não aceitou a suspeição do colega. O juiz na época, Sr. Domingos
Sávio Brandão Lima, concordou com o segundo promotor, e decidiu pela
competência do Sr. Luís Vidal da Fonseca, em 24 de setembro. O promotor
reclamou à Corregedoria de Justiça, que cassou o despacho do juiz Domingos
Sávio Brandão Lima, alegando, no dia 15.02.1967, que o conflito deveria ser
resolvido pelo Procurador do Estado.
O procurador, Sr. Benjamim Duarte, decidiu
não haver impedimento. O Promotor não concordou e não fez a denúncia [abril de
1967]. Nesse ínterim, funcionava na Vara Criminal o Sr. Anselmo do Amaral
Falcão, que alegou não poder apresentar a denúncia, Já que sua mulher era
parente do acusado Sebastião Palma Arruda [julho de 1967].
De
Mão em Mão
O Juiz aceitou o impedimento e manteve o
processo para o Promotor substituto, Sr. Atílio Ourives, que não aceitou,
alegando que o Sr. Luís Vidal da Fonseca não estava impedido de funcionar no
processo, conforme decidira o Procurador, e pediu a remessa dos autos ao
Promotor competente.
Os autos voltaram ao primeiro Promotor, que
já não estava na Comarca. O processo foi então ao Sr. Zélio Guimarães, que
estava em exercício em setembro de 1967. O Sr. Zélio Guimarães, afirmando que o
Promotor competente era o Sr. Luís Vidal da Fonseca, não ofereceu denúncia.
O Juiz substituto em setembro, Sr. José
Nunes da Cunha, mandou o processo para o Procurador-Geral decidir. O
Procurador, Sr. Benjamim Duarte Monteiro, decidiu novamente que o Promotor
competente era o Sr. Luís Vidal da Fonseca, que já voltara ao exercício. Este,
em outubro mais uma vez recusou-se e fez nova reclamação à Corregedoria.
O Corregedor, que era o juiz autor do
despacho que o corregedor anterior cassara, decidiu em novembro que o conflito
deveria ser julgado pelo Procurador, julgando-se incompetente par ajuizar o
conflito. Um outro juiz, o Sr. Milton Ferreira Mendes, mandou oficiar ao Corregedor,
pedindo providências.
O Sr. Ataide Monteiro da Silva, atual
Procurador da Justiça, decidindo o conflito, aceitou a incompetência do Sr.
Luís Vidal da Fonseca e determinou que o primeiro Promotor intentasse a ação
penal competente de acordo com suas convicções jurídicas. Revoltado com o jogo
de escusas, o Procurador lembrou em seu despacho:
Desde agosto de 1966 perambulam os autos de “ceca em meca”, num jogo de escusas, de
desculpas e impedimentos, em desprestígio da Justiça, sem que o órgão da
acusação deduza em juízo a pretensão punitiva consistente na denúncia.
Não
Terminou
Diante disso, o processo foi para o promotor
Zélio Guimarães que apresentou a denúncia contra os componentes da expedição,
mas não denunciou os Srs. Antônio Mascarenhas Junqueira e Sebastião Palma
Arruda, sob a seguinte alegação:
Deixo de denunciar Antônio Mascarenhas Junqueira
e Sebastião Palma Arruda, por não ter ficado concretizada a anuência de matança
aos índios. Já que o objetivo da expedição era a exploração de minérios e
expansão do seringal.
Feita a denúncia, imediatamente o Juiz da 3ª
Vara, Sr Carlos Avalone, decretou a prisão preventiva dos acusados, marcando
para o dia 27 deste mês a audiência de interrogatório dos réus. O processo
deverá correr à revelia, sendo muito pouco provável que os acusados compareçam.
Apesar da boa vontade do Juiz Carlos Avalone, o prosseguimento ao processo será
muito difícil, Já que mais de mil processos estão em andamento naquela Vara
Criminal.
Além disso, não há como prender os acusados,
que estão bem acobertados e desaparecidos na selva amazônica, numa região em
que só eles conhecem os caminhos e os meios de sobrevivência. Mesmo que o
processo prossiga, resta a possibilidade de um hábil advogado alegar falta de
prova de corpo de delito, já que não houve reconstituição do crime, a Polícia nunca
chegou ao local e, mesmo que chegasse, nada encontraria, pois os corpos dos
índios teriam sido jogados no Rio. Como o caso é notório e revoltou a população
cuiabana, a esperança é que o corpo de jurados chegue a uma conclusão, sem
necessidade de recorrer ao STF.
Justiça
Fora da Lei
A Justiça de Cuiabá encontra dificuldade em
tudo, começando pelo tamanho da Comarca, que vai até as divisas com o Pará e o
Amazonas, numa distância de mais de mil quilômetros. A Polícia é muito pouca e
mal paga. Quando é necessário ouvir uma testemunha é preciso ir ao local. Na
maioria dos casos, o local só pode ser alcançado por avião. Por exemplo: como
mandar um oficial de justiça intimar uma testemunha em Aripuanã se a sede do
município fica a 900 quilômetros em linha reta de Cuiabá e o único meio de
transporte é o avião? Não existe dinheiro para isso. Por sua vez, não se pode
exigir que uma testemunha que está em Aripuanã venha depor em Cuiabá. De um
modo geral, um oficial de justiça nunca sai de Cuiabá. A Comarca está dividida
em três varas ‒ duas cíveis e uma criminal. Para a Vara Criminal existe apenas
um Juiz, que é o Sr. Carlos Avalone. Esta Vara acumula ainda as execuções
criminais e o Juizado de Menores. Além disso, existem ainda os crimes cometidos
nas fronteiras que vão para as mãos do Juiz da capital do Estado [Artigo 88, do
Código de Processo Penal].
Atualmente, existem mala de mil processos na
Vara Criminal. Como se não bastasse, os juízes da capital são sempre chamados
para substituir os Desembargadores durante seus Impedimentos, como férias e
licenças. A cadeia de Cuiabá é o que se poderia julgar de pior. Não existe uma
sala para a prisão de menores e muito menos uma sala para a prisão de mulheres.
Isto obriga os juízes a agirem fora da lei, mantendo menores com adultos e
mulheres com homens.
O Fórum funciona em uma residência alugada,
por sinal adquirida há cinco meses, pois antes as três Varas e mais um Cartório
[6° Ofício] funcionavam no porão da Assembleia Legislativa. Aliás, a Assembleia
Legislativa não tem prédio próprio, pois o edifício que ocupa pertence ao
Fórum, que foi alijado para dar lugar aos parlamentares. As melhores
dependências disse prédio estão com a Assembleia. O que sobrou está sendo
ocupado pelo Tribunal de Justiça do Estado.
Mais
Dificuldades
Nas épocas de júri, os juízes ficam
desesperados por não terem onde realizar as sessões. A média de mil processos
tende a aumentar. E, assim mesmo, só estão consignados os mais graves. Cuiabá
só tem um médico legisla. Quando entra de licença ou de férias, não se pode
fazer exame médico-legal. O Promotor Público acaba de abrir um processo contra
um médico psiquiatra particular ‒ existem dois na cidade ‒ porque se negou a
continuar fazendo exames de sanidade mental de graça. Só faz exames quando o
réu pode pagar. Na semana passada, o Juiz Criminal julgou em um só dia 23
processos prescritos. A prescrição, por sinal, tem sido a tônica dos processos
instaurados.
Segundo alguns advogados, a situação resulta
do desinteresse dos políticos, que, por conveniência, preferem manter a Justiça
como está, no interesse de figurões apaniguados ou afilhados políticos que
estão com seus processos em vias de prescrever. O Tribunal de Justiça do Estado
vem reagindo como pode a essa situação e tem recebido apoio do Governador Pedro
Pedrossian. Quando se pede à Assembleia a criação de mais uma Comarca, os
políticos logo pensam na criação de novos cartórios.
De um modo geral, os deputados só dão alguma
coisa à Justiça, se os Juízes cederem às suas propostas. Como os juízes não têm
cedido, as dificuldades aumentam a cada dia. (JB, N° 100)
A Esquerda Caviar
procura por todos os meios culpar os Governos Militares de massacrar as populações
indígenas brasileiras quando na verdade o que se verifica é que após a
Revolução Redentora de 1964 é que estas ações de extermínio foram devidamente
coibidas, apuradas e sancionadas. Continuando com a nossa entrevista:
Marcelo: Ele está dizendo que esse massacre do seu
povo foi lá no Rio da Eugênia ([3])
conhecido como Paralelo 11°, onde foram mortos 3.000 indígenas ou até mais ‒ é
isso que o pessoal fala. Mataram até as crianças e as mulheres usando açúcar
envenenado. (Marcelo)
Hiram: Gostaria de ouvir a versão do Cacique João
Brabo à respeito da morte dos garimpeiros nos idos de 2004. (Hiram)
Marcelo: Ele está dizendo que a mídia só divulga que
os Cinta-Larga assassinaram os 29 garimpeiros ([4]),
mas não divulga quantos índios morreram por envenenamento na década de 1970 ([5]),
foram milhares de Cinta-Larga. Tenho convicção de que se um índio invadir a
casa de homem branco o homem branco vai matar índio. Agora, graças a isso, tem
muita gente com medo de invadir nossas terras. A mídia fica dizendo que os
Cinta-Larga mataram os garimpeiros, na verdade foi uma etnia que convive com os
Cinta-Larga, que tinha conhecimento de tudo que aconteceu na década de 70, que
o fez.
Um parente chegou na Aldeia, de madrugada,
contando que garimpeiro ([6]),
que estava com malária, estava dizendo que estava preparado pra matar os índios
Cinta-Larga. A mídia não quer saber o que provocou tudo isso, só querem dizer
que o índio é assassino. (Marcelo)
Hiram: Só para esclarecer, aquele incidente do Paralelo 11° em que foi
colocado arsênico na alimentação, no açúcar, etc, teriam sido garimpeiros e
seringueiros os protagonistas? (Hiram)
Marcelo: Ele diz que foram os dois, seringueiros e
garimpeiros, porque os garimpeiros estavam de olho no minério e os seringueiros
na seringa. Eles se organizaram, cercaram a Aldeia, e colocaram veneno no
açúcar, na chicha ([7]),
jogaram gás tóxico. (Marcelo)
Marc: Antes do branco chegar, como era a guerra,
já que existiam três grandes grupos ([8])?
(Marc)
Marcelo: Ele está dizendo que antigamente entre os
clãs o que era mais brabo era o dele o Mãm. Os Kakín não podiam nem olhar com a
cara feia pra eles que eram imediatamente mortos, assados e devorados como se
tratasse de um troféu. Os Kabãn, não eram tão brabos e tinha medo dos Mãm e os
respeitavam, já os Kakín enfrentavam os Mãm e sempre eram derrotados neste
confronto, por isso, até hoje os Kakín não se aproximam muito dos Mãm. Os Mãm
são muito respeitados pelos outros clãs porque são robustos enquanto os Kakín
são mais magros. Os remanescentes dos Kakín proliferaram e vivem hoje no meio
dos Mãm. A maior população original é a dos Mãm, mas hoje existe uma
miscigenação muito grande dos três clãs originais. (Marcelo)
Hiram: Quais são as principais preocupações do
cacique, hoje, com tudo que está acontecendo em relação aos Cinta-Larga?
(Hiram)
Marcelo: Ele está dizendo que a grande preocu dele
com o que está acontecendo hoje é principalmente com a Comunidade, com os
indígenas jovens que estão perdendo a cultura nativa. Para não acontecer uma
tragédia ele sempre acreditou que pode orientar a Comunidade para não deixar de
lado a nossa cultura, porque se isso acontecer as pessoas não vão mais
respeitar a gente. Se já não estão nos respeitando, sem a nossa cultura, as
coisas só vão piorar. Estou muito preocupado porque a Polícia Federal já está
prendendo indígenas, preocupado com o Exército que a qualquer hora pode tomar a
Terra Indígena e nessa hora é preciso de uma liderança como a dele. Bem que o
pai dele disse que um dia a cidade ia crescer e iam invadir diminuindo a Terra
deles. A mata diminuindo e o calor aumentando em decorrência da derrubada da
mata. (Marcelo)
Marc: A população de Cinta-Larga está aumentando
e muitos moram na Reserva, há uma tendência dos Cinta-Larga migrarem para a
cidade? (Marc)
Marcelo: Ele disse que está muito preocupado, alguns
já abandonaram as Aldeias alugando casas na cidade. Muitos jovens que vem pra
cidade, hoje em dia, usam drogas que lhes oferecem e na Aldeia não tem droga,
não tem bebida alcoólica, só as bebidas tradicionais que oferecemos, em
ocasiões especiais, aos nossos jovens. O uso excessivo da tecnologia por parte,
principalmente, dos jovens que não sabem mais fabricar um arco ou uma flecha,
não querem caçar... Ele disse que não está aqui na cidade por que quer, mas
porque precisa tratar dos problemas de saúde. A vontade dele não era estar
vivendo na cidade mas na Aldeia. Ele agradece a vocês por terem vindo aqui, as
portas estarão sempre abertas pra vocês a qualquer hora e pede desculpas se fez
alguma coisa ruim para vocês, no passado, porque não os conhecia como agora.
(Marcelo)
Só depois desta
incrível entrevista com o Cacique Geral dos Cinta-Larga dei por encerrada,
definitivamente, minha homenagem à Expedição Rooseevelt-Rondon (1914). Minha
preocupação, agora, é com o futuro deste valoroso povo. Continuo envidando
esforços, junto com o Presidente da Associação PATJAMAAJ dos Povos Cinta Larga,
Sr. Oita Motina, para tentar viabilizar um projeto de pesca-turismo no Sul da
Reserva Roosevelt.
A extração criminosa de
madeira de lei, diamante e ouro, sem qualquer controle da reserva só seria
terminantemente resolvida quando, através do DNPM e FUNAI, fossem efetivados
contratos firmados com empresas idôneas que através do emprego científico do
Manejo Florestal e da Mineração Industrial os parte dos percentuais líquidos de
sua produção seriam repartidos com todas as famílias das aldeias proporcionalmente
ao número de membros de cada uma delas e outa parte, a ser determinada pelos
líderes comunitários de cada aldeia, para melhorias nas comunidades.
Não posso deixar de
agradecer aos digníssimos Policiais Militares e Bombeiros Militares de Cacoal
(RO) que nos apoiaram nos deslocamentos para o local de Partida (Aldeia
Rooseevelt) e na chegada na Balsa da Aprovale.
Após o encerramento da
missão o Exército Brasileiro, através da 17ª Brigada de Infantaria de Selva nos
apoiou no deslocamento até o 1º Pelotão de Especial de Fronteira “Real Forte Príncipe da Beira” e de lá
para Porto Velho (RO).
Logo depois do Capítulo
“No Caminho dos Semivivos”, vamos
fazer um relato desta interessante jornada.
Fonte:
JB,
N° 100. Justiça de Cuiabá Entrava
Punição à Chacina de Índios - [Sergio Galvão] ‒ Brasil ‒ Rio de Janeiro, RJ
‒ Jornal do Brasil, n° 100, 04 e 05.08.1968.
Solicito Publicação
(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel
de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador,
Escritor e Colunista;
·
Campeão do
II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)
·
Ex-Professor
do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);
·
Ex-Pesquisador
do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
·
Ex-Presidente
do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
·
Ex-Membro
do 4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)
·
Presidente
da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
·
Membro da
Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
·
Membro do
Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
·
Membro da
Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)
·
Membro da
Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
·
Comendador
da Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)
·
Colaborador
Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
·
Colaborador
Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
·
E-mail: hiramrsilva@gmail.com.
[1] Ipeca (Psychotria ipecacuanha): arbusto de apenas 30 cm de
altura, usado como planta medicinal. Conhecida também como Ipecacuanha,
ipeca-verdadeira, poaia e poia cinzenta.
[2] Outros tempos, velhos e seculares vícios de um sistema político
falido onde a justiça faz de tudo para privilegiar os poderosos.
[3] Afluente da margem direita do Rio Capitão Cardoso, acima da
confluência com o Roosevelt. João Brabo mescla a história do Massacre do
Paralelo 11° com o envenenamento dos Beiço-de-Pau, crime ocorreu perto da Barra
dos Rios Tomé de França e Miguel de Castro com o Rio Arinos, aumentando,
consideravelmente, os números de vítimas que, segundo os relatórios oficiais,
oscilava de 9 a 30 vítimas.
[4] O inquérito da Polícia Federal avalia que esse número é
bastante superior, chegando a mais de uma centena de mortos. Os Cinta-Larga
estavam inquietos com as ameaças feitas pelo garimpeiro Baiano Doido, que vociferava,
a todo momento, que mataria qualquer índio que tentasse retirá-lo da reserva. O
Cacique Oitina Matina afirmou que:
Cada cidadão tem direito de se defender e
pagar pelo que fez de errado. Nesse assunto eu nem estou do lado do índio nem
do lado do branco, todos os dois estão errados. Mas não vamos denunciar os guerreiros.
Podem esquecer isso.
[5] 1971 ‒ Os Cinta Larga
mataram dois funcionários da FUNAI, Possidônio Bastos, que chefiava o subposto,
e o radiotelegrafista Acrísio Lima. Segundo os Cinta-Larga, o ataque foi uma
retaliação à ação de um dos garimpeiros que impedido de “namorar” uma índia teria passado veneno no pilão de fazer “chicha”. Na verdade o suposto
envenenamento foi apenas uma epidemia de gripe que vitimou parte da população
de várias aldeias.
1972 ‒ Em
dezembro houve uma salutar confraternização com os funcionários do Posto
Indígena Roosevelt.
1973 ‒ No final de janeiro
receberam presentes e almoçaram com os funcionários do posto, estabelecendo
relações harmônicas. A partir de outubro, os Cinta-Larga começaram a frequentar
pacificamente a margem esquerda do Rio Aripuanã, em frente à Vila Aripuanã.
1974 ‒ Três
famílias Cinta-Larga, no dia 12 de janeiro, entraram na Vila de Aripuanã
distribuindo artesanatos procurando estabelecer relações de amizade. Alguns
meses depois, 69 Cinta-Larga visitaram Aripuanã e acabaram contraindo o vírus
da gripe. A doença dizimou quase metade da população Cinta-Larga dessa região.
1976 ‒ Descoberta de ouro no igarapé Jurema,
afluente do Ouro Preto. A exploração de ouro atraiu a atenção dos Cinta-Larga
que passaram a frequentar o local e contrair novas doenças.
[6] Baiano Doido.
[7] Bebida alcoólica artesanal, obtida pela fermentação de determinados
cereais, raízes, sementes (milho, mandioca, etc.).
[8] Os grupos Cinta Larga são Mãm [com várias subdivisões ‒ MãDut,
MãGap e MãGuip], Kakín [com subdivisões] e Kabãn [sem subdivisões]. É provável
que, anteriormente, houvesse maior nitidez na distribuição demográfica destas
divisões: Os Kabân ao Norte, na região dos rios Branco e Vermelho, os Mâmderey
no Meio, e os Mâmjiwáp nas cabeceiras dos Rios Tenente Marques e da Eugênia. Os
Kakín eram numerosos e guerreavam contra os Kabãn e Mãm que se uniram para enfrentar
os Kakín reduzindo significativamente sua população. Após a instalação dos
postos da FUNAI foram feitos sucessivos remanejamentos alterando sua distribuição
espacial.
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – X
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Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – VI
Silva, Bagé, 11.12.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 224, Rio de Janeiro, RJ Quarta-feira, 25.09.1963 Lei das Selvas T
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – IV
Bagé, 06.12.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 186, Rio de Janeiro, RJSábado, 10.08.1963 Lacerda diz na CPI que Pressõessã
Qualquer Semelhança não é Mera Coincidência – III
Bagé, 02.12.2024 Continuando engarupado na memória: Jornal do Brasil n° 177, Rio de Janeiro, RJQuarta-feira, 31.07.1963 JB na Mira O jornalista H