Quarta-feira, 30 de novembro de 2016 - 18h43
No início deste ano, quando a Comissão Especial da Câmara analisava o relatório que autorizaria o processo de Impeachment da presidenta Dilma Rousseff, havia uma disputa de holofotes que seduziu juízes e membros do Ministério Público.
Muitos viraram ativistas para defender a atuação do juiz Sérgio Moro, que vinha sofrendo duras críticas por ter exorbitado de suas funções ao quebrar o sigilo da então presidenta em conversas telefônicas.
Em várias cidades houve atos públicos e até outdoors foram espalhados nas ruas com o rosto de magistrados e o chamamento de apoio ao juiz e à força-tarefa da Operação Lava Jato.
A Associação dos Juízes Federais (Ajufe) divulgou em nota que “as decisões do magistrado foram todas fundamentadas e embasadas na lei.
Não duvido que, fora o corporativismo desde sempre, muitos ativistas tenham acreditado realmente estar contribuindo com um esforço conjunto contra a corrupção e pelo fortalecimento da força-tarefa.
Como no clássico de George Orwell, A Revolução dos Bichos, em que o fazendeiro levou a culpa pelo que vinha causando desgraças à granja, magistrados personalizaram em Dilma as ameaças à Lava Jato.
Quem tirou o fazendeiro e seus auxiliares do caminho foram os porcos.
Tal como ocorre, os supostos salvadores da República, que também utilizaram a Operação para faturar politicamente e concretizar o golpe, impuseram um estado de coisas muito pior.
Os que expulsaram Dilma, colocaram em xeque o perseguido fortalecimento do judiciário.
Enquanto a casta de maior status do serviço público dormia, deputados aprovaram a emenda ao Pacote de Medidas Contra a Corrupção que prevê punição por abuso de autoridade a juízes e membros do Ministério Público.
Como na obra de Orwell, descobriram que o inimigo ao lado pode representar um perigo maior e agora, assistem embasbacados à tentativa de intimidação de parlamentares investigados.
É certo que precisam de freio, mas não sob o caráter da retaliação.
Talvez agora compreendam o que Dilma quis dizer com ter garantido realmente autonomia para investigar.
Na ficção o duelo bicho pelo bicho terminou pacificado só quando animais de quatro patas passaram a andar sobre duas, com forma de restabelecer a igualdade e a justiça.
Afinal, o maior inimigo não era o fazendeiro.
Na realidade, a confusão está apenas começando.
Os procuradores que atuam na Operação Lava Jato ameaçam renunciar coletivamente caso a proposta – sobre o abuso de autoridade – seja sancionada por Michel Temer.
A ministra do Supremo Tribunal Federal, Cármen Lúcia, criticou nesta terça-feira (29) o que chama de tentativa de “criminalizar o agir do juiz brasileiro” e alertou que toda ditadura “começa rasgando a Constituição”.
Causa espanto que só agora a ministra vislumbre afronta à Constituição.
“As vacas mugiam a canção, os cachorros latiam-na, as ovelhas baliam-na, os cavalos relinchavam-na, os patos grasnavam-na. Foi tal o enlevo, que cantaram cinco vezes corridas, de ponta a ponta, e teriam cantado a noite toda se não fossem interrompidos.”
Em muitas ocasiões ignoraram garantias constitucionais, mas foi há pouco, foi ontem, com a repressão violenta ao protesto de estudantes contra a provação da PEC 055, em Brasília.
A ministra não viu, nem os juízes e membros do Ministério Público, que de grão em grão, as galinhas encheram o papo se juntaram as raposas e o resultado é esse grotesco cenário de poderes em confusão e guerra.
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