Domingo, 24 de novembro de 2024 | Porto Velho (RO)

×
Gente de Opinião

Luciana Oliveira

Abram alas cabeças ocas, que o carnaval vai passar!


 
A gente nasce com a cabeça oca e não demora nossos pais vão colocando tudo o que aprenderam. Tanto em casa, quanto na escola, cedo nos ensinam a preservar os valores culturais que construímos ou herdamos e que constituem bens materiais ou imateriais indispensáveis, protegidos constitucionalmente. Nem bem aprendemos a falar e já estamos participando de festas juninas que remetem à tradições pagãs e cristãs, de séculos passados, de vários povos, de pais pra filhos. Tem festa o ano todo, mas, nenhuma amontoa tanta gente nas ruas como o carnaval, que é indissociável da memória do brasileiro tanto pelo mero aspecto cronológico, quanto o histórico.

Das formas de expressão que devem ser protegidas pelo Estado, o carnaval reúne os mais diversos e valiosos modos de criação.  São tantos os folguedos com inúmeras expressões artísticas de referências religiosas ou folclóricas que não é justo debater com quem ainda tem muito oco na cabeça sobre a tradição multicultural.

Simone de Beauvoir, que nada tem a ver com carnaval, disse uma frase que cai como uma luva em várias situações, inclusive a esta reflexão: “É preciso erguer o povo à altura da cultura. Não rebaixar a cultura ao nível do povo”.

Todo ano é a mesma cantilena quando chega fevereiro. Alguns agentes públicos demagogos se unem a fanáticos religiosos em uma cruzada contra o carnaval, sob o pretexto de que o dinheiro reservado à cultura deve ser aplicado em coisas ‘mais importantes’. Um ano inteiro pra cortar gastos sem qualquer valor material ou imaterial, muitos até imorais, e sugerem economia justo com um bem valioso como a cultura? Não, não são somente cínicos os que vendem essa ilusão, mas pessoas que têm, além de muito oco na cabeça, um cérebro emocional de baixíssima sensibilidade. É gente incapaz de enxergar e interpretar o lado bom das tradições carnavalescas, porque só processa o que sente de ruim. É gente empenhada em acabar com a capacidade do povo de produzir saber com artesanato, literatura, dança e música.

Eles sabem que fomentar a cultura é um dever do Estado, mas investem contra, promovendo o debate que se aprofunda entre preservar a tradição e promover a transformação do carnaval. Não há que se falar em antagonismos sobre o que tem ou não valor pelas extremidades, porque cultura popular é tradição/transformação em um processo constante e incontrolável. Tenho meus parâmetros pessoais sobre o que tem valor cultural e jamais me misturo, mas não posso enquadrar o direito de ir e vir e a vontade das pessoas no meu ponto de vista.

Os que regulam o uso das vias públicas também sabem disso, mas usam os problemas decorrentes de uma aglomeração festiva, com desfiles de blocos sem finalidade de lucro e de blocos com interesse puramente lucrativo para demonizar o carnaval de um modo geral.  O aumento dos índices de violência nunca comprovado comparativamente por períodos, o caos na saúde pública, as intempéries, enfim, são vários os pretextos que ensejam Termos de Ajustamento de Conduta que inviabilizam a promoção da cultura.

Vários municípios e estados cancelaram suas folias com a promessa de investir o dinheiro em saúde e disso nunca irão prestar contas, simplesmente porque é mentira. Os estragos da última enchente que suspendeu o carnaval na Capital até hoje não foram reparados.

Há três anos, as Escolas de Samba que formam gerações de músicos e artesãos não desfilam. Não é por falta de dinheiro, mas porque agentes públicos simplesmente desprezam a cultura carnavalesca e se dedicam a inibi-la. Só que não, porque esse ano haverá desfile, de blocos e de escolas de samba, “para tristeza de poucos e alegria de muitos”, como diria o general Manelão.

Luciana Oliveira
Empresária e Jornalista

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

Gente de OpiniãoDomingo, 24 de novembro de 2024 | Porto Velho (RO)

VOCÊ PODE GOSTAR

Ruanda vai taxar igrejas e acusa pastores de enganarem fiéis

Ruanda vai taxar igrejas e acusa pastores de enganarem fiéis

Proliferação de igrejas neopentecostais no país africano levou governo de Paul Kagame a acusar pastores de “espremerem dinheiro” de ruandeses mais pob

Levante feminista realiza encontro nacional para frear violência contra as mulheres

Levante feminista realiza encontro nacional para frear violência contra as mulheres

Luciana Oliveira, de Brasilia – Mais de 130 mulheres vindas de 20 estados do país participaram do evento em Brasília que durou três dias.Foram intensa

Quilombolas vencem eleição para prefeito em 17 cidades

Quilombolas vencem eleição para prefeito em 17 cidades

Candidatos que se declararam quilombolas venceram as eleições para prefeito em 17 municípios, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).A ma

Incêndio criminoso eleva tensão em terra indígena Igarapé Lage

Incêndio criminoso eleva tensão em terra indígena Igarapé Lage

No 247 – A terra indígena Igarapé Lage, do povo Wari é uma ilha cercada por fazendas. Tem mais de 107 mil hectares e fica no Oeste do Estado, próxima

Gente de Opinião Domingo, 24 de novembro de 2024 | Porto Velho (RO)