Quinta-feira, 19 de dezembro de 2019 - 13h16
É do Norte,
da Amazônia, de Letícia Maciel Nunes, uma das vagas na maior seletiva de dança
do país, a da Escola do Teatro Bolshoi.
Ela disputou com mais de 5 mil candidatos a
oportunidade de estudar no curso básico e técnico de dança clássica na filial
do famoso teatro da Rússia.
Vai passar oito anos em Joinville aprendendo a
técnica de balé pela metodologia Vaganova, com dança contemporânea e
disciplinas complementares ao lado de alunos de vários estados brasileiros e de
outros países.
De origem humilde, negra e indígena, começou a
estudar balé com a mãe numa escola no município de Candeias do Jamari que fica
distante 25 quilômetros da capital, Porto Velho.
Até passar, aos 10 anos na fina peneira do Bolshoi,
Letícia venceu várias batalhas na vida.
Quando a escola fechou, a mãe improvisou um estúdio
em casa e mais tarde o transformou numa ONG. A menina tinha aulas com a mãe no
município e como bolsista com a professora Talita Brasil, na capital.
“Ela sempre impulsionou, acreditou que ia dar certo e investiu muito na Letícia”, disse a mãe Maira Nunes Maciel, sobre a professora.
Em 2018 teve a primeira seletiva do Bolshoi em
Rondônia e por pouco Letícia não conseguiu vaga, chegou à etapa final com
outras três meninas.
A família perseguiu o sonho com a mudança para
Joinville este ano e lá, Letícia passou novamente por todas as etapas
classificatórias.
A etapa nacional de seleção foi em outubro e a
concorrência de mais de 100 alunos por 1 vaga.
A família retornou a Porto Velho para organizar a
mudança definitiva e deixar ativo o projeto da ONG Tenda Cultural NoaStudio que
existe desde 2014. É um projeto social de resgate de crianças e adolescentes
que vivem à margem da vulnerabilidade.
Letícia vem de uma família com sangue indígena Mura
e tem parentesco com o saudoso professor Manoel Maciel Nunes que criou no
distrito ribeirinho de Nazaré, o festival folclórico mais denso do estado. De
lá também, o Grupo familiar Minhas Raízes que produz instrumentos com
matéria-prima descartada pela floresta e que já gravou três cds.
A Escola que Letícia vai estudar dança clássica
oferece vários benefícios além do ensino gratuito de dança, entre eles, ações
artístico-culturais, alimentação complementar, apoio psicológico, aprendizado
com renomados mestres e assistência médica de emergência/urgência e
pré-hospitalar.
A família está arrumando as malas para seguir a
Joinville e Ludmila, a irmã mais velha, também é bailarina. A mudança envolve
custos e os pais se socorreram com empréstimos e doações.
“Todo o sacrifício vai valer a pena”, diz Maira.
A mãe identifica a nova bailarina do Bolshoi como
afro-indígena pelo sangue negro e indígena. Os Mura, etnia da família de
Letícia, ocupam vastas áreas nos rios Madeira, Amazonas e Purus. Vivem em
terras indígenas e centros urbanos como Porto Velho, Manaus, Borba, Humaitá e
Lábrea.
“Temos orgulho de nossas origens e foi isso que nos
motivou em cada batalha. No meio da maioria branca, entre estrangeiros, terá
sim, uma negra e indígena, de Rondônia”, ressalta a mãe.
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