Domingo, 11 de novembro de 2018 - 19h18
A reforma trabalhista do Governo Temer (MDB), que
alterou mais de 200 pontos na CLT – conjunto de leis que protegia os direitos
dos trabalhadores – completa um ano neste domingo (11).
Ao longo desse período, as previsões catastróficas
de especialistas foram confirmadas e a reforma, que retirou direitos
fundamentais dos brasileiros, só serviu para agravar a crise do emprego e
renda. Atualmente, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE), 12,5 milhões de brasileiros estão desempregados.
Com a falsa promessa de ser uma “vacina” contra a
diminuição da oferta de vagas, a proposta de reforma atendeu a interesses do
mercado financeiro e dos empresários, segundo o analista político Marcos
Verlaine, do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap).
“Essa tentativa de alterar a CLT vem de muito tempo.
Não é uma coisa recente. Entretanto, desde a redemocratização, os empresários e
o mercado não conseguiram reunir os elementos para aprovar a mudança, que
seriam: uma bancada no Congresso com esse objetivo, força política na sociedade
brasileira e uma dificuldade do movimento sindical de resistir ”, disse
Verlaine.
Para enfraquecer os sindicatos, a reforma atacou a
fonte de financiamento das entidades. “Houve uma queda de mais ou menos de 80%
da arrecadação dos sindicatos com o fim da contribuição obrigatória. Isso
desequilibrou bastante as negociações”, afirmou.
As mudanças aprovadas há um ano, segundo Verlaine,
alteraram radicalmente as características da CLT e abriram espaço para a
precarização dos empregos.
“Sai a consolidação das leis do trabalho e entra a
consolidação das leis de mercado. A legislação vigente privilegia o patrão e o
mercado em detrimento do trabalhador”, resumiu o analista político. A criação
de novas modalidades de contratação, com flexibilização aguda dos direitos
trabalhistas, salários menores e pouca margem para negociação, dão a tônica da
reforma.
A reforma trabalhista contribuiu ainda para ampliar
os impactos da crise econômica, o que atrapalha qualquer perspectiva de
retomada do crescimento da atividade econômica, segundo a economista Marilane
Teixeira, pesquisadora do Centro de Estudos Sindicais de Economia de Trabalho
da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas).
“Esses contratos têm uma renda muito instável. Se você têm uma renda instável, você não planeja o futuro. Não tem perspectiva de assumir qualquer tipo de compromisso, contratação de crédito. Isso tem impacto sobre o consumo, a produção e o investimento. As medidas [da reforma] não têm condições de contribuir para que se retome a atividade econômica”, constata.
Renda
Segundo a pesquisadora Marilane, uma das mudanças da
reforma trabalhista mais aplicadas nos acordos coletivos dos últimos 12 meses,
por parte dos empregadores, foi a instituição do banco de horas.
Para os trabalhadores com carteira assinada, isso teve um impacto direto na remuneração pois afetou o pagamento de horas extras. “O banco de horas substitui as horas extras, que para boa parte dos trabalhadores já foi incorporada ao salário. Então teve uma queda de renda familiar. Isso é grave porque dois terços do produto nacional vem do consumo das famílias. Quando o consumo das famílias reduz em função da queda da renda familiar, o impacto é muito grande, disse.
Aposentadoria
O advogado Guilherme Portanova, especialista em
direito previdenciário, aponta o reflexo da reforma trabalhista nas
aposentadorias e benefícios pagos pelo Instituto Nacional do Seguro Social
(INSS). O percentual de crescimento da arrecadação líquida das contribuições,
descontadas dos contracheques e recolhida pelas empresas, teve redução de 58%,
na média de nove meses após a implantação da reforma, comparando com o mesmo
número de meses antes da reforma.
“A redução no ritmo de crescimento da arrecadação tem a ver com o desemprego em alta e, em boa parte, com a precarização do trabalho gerado pela reforma da CLT”, analisa. Antes da reforma, a arrecadação líquida média era de R$ 29,7 bilhões com um crescimento de 5,39%. Após a entrada em vigor das novas regras, a média ficou em R$ 30,4 bilhões, ou seja, o crescimento ficou em 2,25% apenas.
Ações
na Justiça
Um levantamento apresentado pelo Tribunal Superior
do Trabalho (TST) mostra que o número de novos processos trabalhistas caiu
36,2% com a reforma. De janeiro a setembro de 2017, as varas do trabalho
protocolaram 2,01 milhões de ações. Já entre janeiro de setembro de 2018, com a
reforma em vigor, foram 1,28 milhão.
Para Estanislau Maria de Freitas Júnior, advogado
especialista em Direito do Trabalho, pela USP, e em Políticas Públicas, pela
Fundação do Desenvolvimento Administrativo (Fundap), essa redução é reflexo da
mudança que desequilibrou a correlação de forças entre empregador e
trabalhador.
“As empresas continuam cometendo irregularidades e não cumprindo a lei. Mas com a reforma ficou mais arriscado para o trabalhador entrar com a ação por conta da regra nova, que obriga a parte que perde a ação a pagar as custas do advogado da outra parte. Essa é uma prática do direito civil que foi importada para o direito trabalhista na reforma”, disse.
Vagas
O principal argumento do governo Temer para aprovar
a reforma com cortes de direitos foi a geração de empregos. A estimativa do
então ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, era de 2 milhões de vagas nos
dois primeiros anos. A tese é parecida com a frase que o presidente eleito Jair
Bolsonaro disse, em agosto, na sabatina do Jornal Nacional, da TV Globo. “O
trabalhador terá que escolher entre mais direito e menos emprego, ou menos
direito e mais emprego”.
Os dados do Cadastro Geral de Empregados e
Desempregados (Caged), derrubam a tese em tom de ameaça. Nos 12 primeiros
meses, o saldo de vagas geradas no país foi de 372 mil, ou seja, faltaram mais
de 620 mil oportunidades de trabalho para chegar na meta de 1 milhão estimada
pela equipe de Temer para o primeiro ano.
“Foi um resultado pífio e muitas das vagas geradas
são de emprego intermitente, ou seja, o trabalhador foi contratado, porém, pode
ser que ele nem tenha sido convocado para trabalhar. Ou seja, continuou sem a
renda”, disse Verlaine.
De acordo com o técnido do Diap, o trabalho
intermitente, que estabelece a possibilidade de pagamento das horas
efetivamente trabalhadas, de acordo com a convocação do empregador, é um
indicativo forte da precarização do trabalho. “Para conseguir uma renda, ele
terá que trabalhar em vários lugares diferentes. E sem garantia de quanto vai
receber”, disse.
Outro problema relacionado ao emprego intermitente é
a contribuição para o INSS. Segundo a regra do governo, a contribuição mínima
tem como referência o salário mínimo, que está em R$ 954. Se o trabalhador
intermitente não consegue atingir este valor de renda por mês, ele terá que
fazer uma contribuição complementar da diferença para o INSS.
“Imagine como é grave. Além de ficar com a renda
comprometida naquele mês, ele pode ficar em débito com o INSS, caso não faça a
contribuição extra, e perder este tempo na contagem para a aposentadoria”,
explica o especialista em direito previdenciário, Guilherme Portanova.
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