Quarta-feira, 15 de janeiro de 2025 | Porto Velho (RO)

×
Gente de Opinião

Lucio Albuquerque

Há 36 anos Rondônia tomava forma de Estado


Lúcio Albuquerque

Repórter

jlucioalbuquerque@gmail.com

Eu sempre digo não ter saudades. Eu tenho lembranças.  E nesta sexta-feira, na Câmara de Cacoal, ao deparar com a capa do Diário da Amazônia lembrando que há 36 anos, dia 22 de novembro, que foi instalado o município de Ji-Paraná.

E aí passou um filme pela minha cabeça. Eu estava lá. Fazendo matéria para o jornal A Tribuna e para o Estado de São Paulo. A imprensa estava representada também pelo Edinho Marques (TV-Rondônia), Pinheiro de Lima (Rádio Caiari), o Ciro Pinheiro (pelo Alto Madeira) e peço desculpas se não lembro outros nomes.
 

O GOVERNADOR QUE PENSOU RONDÔNIA GRANDE

Aí vem à mente a figura que, sabe-se lá por qual razão, foi praticamente excluída da história de Rondônia, apesar da importância que teve para estruturar o então Território para que se criasse o Estado.

Falo aqui do coronel da Arma de Cavalaria Humberto da Silva Guedes, penúltimo governador do Território e que, conforme assessores de alto nível que trabalharam com ele e com seu sucessor Jorge Teixeira, atestam que Guedes foi o cérebro que permitiu a Teixeira dar sequência o projeto Rondônia-Estado.

Em 1975 Humberto Guedes assumiu o governo. Tomou providências que permitiram fazer andar melhor a “máquina” administrativa e massificou a presença da administração na faixa da BR-364, onde diariamente chagavam dezenas de famílias, viajando nas piores condições possíveis e se instalando à margem da  rodovia. Ali a figura gerencial do governador deixou de ser uma visita ocasional, mas praticamente constante, e mais ainda quando Guedes percebeu que com a vinda de tanta gente, de todos os pontos do país, extrapolava a capacidade de atendimento.

“Não se pode mais continuar pensando em Rondônia como Território. Vamos trabalhar no planejamento do Estado”, disse ele em várias reuniões que assisti.

E conseguiu que o presidente Ernesto Geisel criasse cinco novos  municípios, pela ordem de instalação: Ariquemes, onde tomou posse  como prefeito o professor Batalha; em Ji-Paraná que a partir da criação deixou de ser Vila Rondônia, o quarto nome da localidade; Vilhena com a posse de Renato Coutinho, Pimenta Bueno com Vicente Homem Sobrinho e, o último, Cacoal, com Catarino Cardoso dos Santos. Agora o Território tinha sete municípios, além desse  Porto Velho, criado em 1914 e Guajará-Mirim criado em 1926.
 

HAVIA QUEM FOSSE CONTRA

Mas havia quem fosse contra a emancipação daqueles então distritos do município de Porto Velho, especialmente comerciantes que alegavam o receio de terem de contribuir recolhendo aos cofres públicos o valor dos impostos cobrados na venda de produtos.

Havia os que simplesmente eram contra, alegando que não iria dar certo – citações que ouvi de muita gente quatro anos depois quando houve mobilização a favor da criação do Estado.

Mas o grosso da população dos distritos era a favor. E uma das justas razões era justamente a necessidade de cada comunidade ter seu próprio governo, e não continuar atrelado a Porto Velho distante e de difícil acesso – é bom lembrar que naquele tempo a BR-364 era inteiramente de barro e uma viagem de Vilhena, a 700 quilômetros, até a capital podia demorar dias.
 

AS INSTALAÇÕES

Saímos de Porto Velho rumo a Ariquemes, onde a cerimônia estve ameaçada por um temporal. As ruas eram de muita lama e o prefeito Batalha declamou alguns poemas de sua autoria. Uma boa parcela das casas eram simples taperas tendo como cobertura pedaços de lona preta.

Depois foi a vez de Ji-Paraná, onde o empossado foi o poeta e seresteiro Walter Bártolo. No terceiro dia foi a vez de Vilhena, onde Renato Coutinho foi o ungido. No quarto foi Pimenta Bueno, com o mineiro Vicente Homem Sobrinho.

Cacoal ficou por último. Foi o único que teve a presença de autoridades federais: o ministro do Interior Maurício Rangel Reis, o presidente nacional da ARENA deputado federal baiano Prisco Viana, além do governador Humberto Guedes e do prefeito de Porto Velho Antonio Carlos Cabral Carpintero.
 

CACOAL

Em Cacoal tomou posse o cidadão Catarino Cardoso dos Santos, uma liderança comunitária forte, não muito dada às letras, mas foi quem plantou a administração na hoje Capital do Café.

De Cacoal o Pinheiro de Lima fez a primeira transmissão via rádio (Caiari) e depois junto com ele fizemos a primeira transmissão de um jogo de futebol, do campo do Incra.

E é em Cacoal que, quando nós, que estivemos no local naquele dia de instalação de municípios, que surgem algumas lembranças interessantes.

Primeiro foi à disputa entre o governador Humberto Guedes e o presidente regional da ARENA Odacir Soares. Os dois não tinham boa relação de amizade e a coisa ficou pior quando da vinda dos aviões trazendo as autoridades.
 

O DISCURSO DO “SEU” CATARINO

Mas teve o discurso do “seu” Catarino. Na noite anterior, hospedados no hotel do Incra em Pimenta Bueno, assessores do governador foram mandados por ele para verem como estava o “falar”” do prefeito cacoalense.

Aí tiveram a ideia de escrever um discurso para o “seu” Catarino. E como ele enxergava mal as letras foram aquelas “de forma”, todas maiúsculas (tenho dúvidas se quem escreveu foi da jornalista Jussara Gotlieb ou se o jornalista Crio Pinheiro).
 

O certo é que a coisa ficou assim:

EXMO. SR. MAURÍCIO RANGEL REIS, MIN. DE ESTADO DO INTERIOR.

EXMO. SR. CEL. HUMBERTO DA SILVA GUEDES, GOV DO TERR. FED. DE RONDÔNIA.

E por aí afora. E o “seu” Catarino leu como estava escrito. Mas quase 20 minutos depois ele continuava lendo aquilo. O ministro, o deputado Prisco, o governador, o prefeito Carpintero e todos que estavam no palanque se entreolhavam, mas o “Exmo.” Continuava. Foi quando “seu” Catarino deu fim à coisa. Pegou o monte de papel almaço e anunciou que iria falar “como o povo sabe que eu falo”. E foi em frente.

Dali voltamos a Porto Velho e os cinco municípios geraram os “filhotes”, iniciados como pequenas comunidades a alguma distância de um lado e outro da BR-364 e que, por sua vez, foram depois transformados em municípios e, como no caso dos cinco primeiros e do Estado, ouvi de muita gente que aquilo “não vai dar certo”.

E deu.

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

Gente de OpiniãoQuarta-feira, 15 de janeiro de 2025 | Porto Velho (RO)

VOCÊ PODE GOSTAR

Há 37 anos morria o homem-lenda da Amazônia (II)

Há 37 anos morria o homem-lenda da Amazônia (II)

Conheci o Teixeirão (de 1979 a 2005 governador de Rondônia) no final da década de 1960, em Manaus. Nunca fomos o que se pode chamar de amigos. Quando

Há 37 anos morria o homem-lenda da Amazônia (I)

Há 37 anos morria o homem-lenda da Amazônia (I)

A 28 de fevereiro de 1987 o homem que virou lenda na Amazônia foi para o Valhalla. Se Getúlio Vargas escreveu que saía da vida para entrar na históri

Já deu na imprensa, mas... (É bom ver de novo)

Já deu na imprensa, mas... (É bom ver de novo)

O desabamento de fachadas de prédios no domingo, em Porto Velho, pode ser um aviso para possibilidades de eventos similares ocorrerem na “cidade vel

O DIA NA HISTÓRIA 6 de janeiro de 2024 – BOM DIA!

O DIA NA HISTÓRIA 6 de janeiro de 2024 – BOM DIA!

RONDÔNIA1918 – O tabelião José Vieira de Souza registrou os oito novos oficiais da Guarda Nacional em Porto Velho: um coronel, um major, quatro capitã

Gente de Opinião Quarta-feira, 15 de janeiro de 2025 | Porto Velho (RO)