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Lucio Albuquerque

Jerônimo Santana: 1º governador eleito de RO abre o jogo - (1ª parte)


 

 

H I S T Ó R I C O

  • Nome: Jerônimo Garcia de Santana
  • Nome político: Jerônimo Santana
  • Apelido político: Doutor Bengala
  • Natural de: Jataí (GO)
  • Profissão: Advogado
  • Participação política: Três vezes deputado federal, uma vez governador do Estado, uma vez prefeito de Porto Velho
  • Residência atual: Brasília/DF

 


 

  • "Eu não perdi. Me tomaram a eleição ao Senado em 1982".
     
  • "A bancada federal rondoniense só sabe dizem amém ao Governo".
     
  • "Qualquer burocrata de 3º escalão manda mais em Rondônia do que o governador".

     
  • "Para muitos Rondônia ainda é um grande Território".

 
 

 


O DOUTOR  BENGALA


Na segunda metade dos anos 1960 da conversa entre uma funcionária federal e um jovem advogado no aeroporto de Brasília pode ter sido o mote gerador do surgimento da maior liderança política de Rondônia entre os anos 1970 e 1990, o advogado goiano Jerônimo Garcia de Santana, que aqui ficou conhecido também por Doutor Bengala.

Naquela conversa a funcionária, que é filha da ativista política local Nazaré Cabeça Branca o advogado foi informado que no Território havia dificuldades em encontrar apoio jurídico para ações contra a União – o governador era nomeado pelo presidente da República e as ações judiciais contra atos do governador eram ações contra a União.

Ele surgiu em Rondônia no período dos sucessivos Atos Institucionais impostos pelos Governos militares ao país. Um deles extinguiu os partidos políticos e criou dois, a Arena – Aliança Renovadora Nacional, totalmente ligada ao Governo, que no então Território abrigava os remanescentes da corrente liderada pelo ex-governador Aluízio Ferreira, os cutubas, e o MDB – Movimento Democrático Brasileiro, onde se agruparam os adeptos do ex-deputado federal (cassado em 1964) Renato Medeiros, os peles-curtas. Jerônimo filiou-se a este último e tornou-se seu presidente, e do sucedâneo PMDB, até 1983.

Sua ação como advogado o fez ganhar reputação de coragem e a adesão, quase a idolatria, de pessoas, especialmente dos segmentos que há muito faziam, sem uma liderança forte, oposição aos sucessivos governos do Território Federal. Em 1970 Jerônimo ganhou a disputa pela única vaga para deputado federal e iniciou aí sua carreira política.


Suas andanças eram feitas às vezes com o apoio de uma bengala que acabou se transformando num apelido, Dr. Bengala e numa marca registrada pelos que se tornariam seus adeptos e, também, pelos seus adversários.

Deputado federal por três legislaturas seguidas, 1º governador eleito do estado e 1º prefeito eleito de Porto Velho desde a década de 1920, Jerônimo vive hoje modestamente em Brasília, doente e praticamente esquecido dos amigos e daqueles que o endeusavam quando estava são e no poder.

Mas quando fala a vibração, o tom da voz e o discurso em defesa de suas idéias sobre Rondônia  não deixam dúvidas de que, mesmo na condição atual, com um lado do corpo semi-paralisado, continua antenado com as coisas do Estado no qual teve parcela de participação para sua criação.

Jerônimo pode estar doente, mas usa a internet, lê muito e se mantém bem informado sobre a atuação da bancada federal rondoniense, um grupo que não tem coragem de lutar em defesa de Rondônia e que aqui (em Brasília)  só vota e diz sim ao Governo, ele diz, denotando a mesma força, nas palavras, de quando era são e tinha mandato na mão.
 
 

 

O INÍCIO DA CAMINHADA POLÍTICA
 

Ele parece voltar no tempo quando peço que defina a figura do Território, da mesma forma como pedi 30 anos antes numa entrevista que ele me concedeu sentado numa rede no Hotel Floresta (hoje sede do TRT em Porto Velho). Território era como uma cobra, cujo corpo estava lá e a cabeça aqui, diz Jerônimo, hoje um político aposentado na sala de sua casa, no Lago Sul, em Brasília, deslocando-se em uma cadeira de rodas, parte do corpo semi-paralisada, a barba por fazer e dificuldade para falar, mas com o mesmo raciocínio rápido.

Logo depois de chegar a Porto Velho, então uma cidade de pouco mais de 50 mil habitantes, no final dos anos 1960, Jerônimo assumiu o MDB. E nas andanças que fazia nas cidades e grotões do então Território nunca dispensava a crítica aos sucessivos governos, coronéis desempregados que iam para Rondônia, ainda repete ele rememorando frase que dizia sempre quando discursava na sua época áurea.

Nas convenções de Arena e MDB de 1970 só um partido tinha dúvida em escolher seu candidato à única vaga, a própria Arena, governista, que acabou indicando o jornalista Emanuel Pontes Pinto depois do grupo cutuba dar um golpe para evitar que o ex-governador Paulo Leal saísse candidato. No MDB era apenas uma questão formal a indicação de Jerônimo.

O Dr. Bengala ganhou aquela primeira disputa e já num dos meus primeiros discursos na Câmara Federal defendi a necessidade de Rondônia passar a Estado, porque como Território nós éramos um simples departamento de terceiro escalão do Ministério do Interior. Qualquer burocrata do Minter mandava mais em Rondônia do que o governador e o coronel que comandava o BEC mandava mais ainda.

Aqui pode ser agregada uma frase solta durante a entrevista: Ainda hoje, para muitas autoridades neste país, Rondônia não passa de um grande Território Federal, tudo porque nossos representantes parece terem medo de defender nossa terra.

 

O primeiro governador eleito de Rondônia lembra que para nós tudo era difícil. A gente sempre estava remando contra a maré, mas não desistimos nunca. Ele recorda sua atuação na crise gerada pela portaria imposta pelo ministro Dias Leite, das Minas e Energia, em 1970, que levou à proibição da atividade garimpeira manual de cassiterita e gerou enorme caos sócio-econômico no Território.

Jerônimo, recém-eleito deputado federal, tomou posição imediata a favor dos garimpeiros, fez vários discursos na Câmara denunciando o fato e enquanto a gente enfrentava a Polícia (na época Guarda Territorial), o governador era localizado por jornalistas aguando plantas ao lado do Palácio Presidente Vargas.
 
 

 

DEPUTADO DE TERRITÓRIO 

Se hoje (a entrevista foi feita juntamente com os jornalistas Mara Paraguassu e Montezuma Cruz, em abril deste ano) com a bancada de oito deputados federais e três senadores eles dizem que é difícil conseguir alguma coisa para Rondônia, imagine naquela época que eu era sozinho numa multidão de parlamentares e sem apoio de ninguém. Muito pelo contrário, os governadores sempre trabalharam contra todo projeto que eu apresentava e ainda mais porque havia sobre a nossa cabeça o AI-5 (Ato Institucional número 5 que cassava direitos políticos e impedia concessão de habeas-corpus, dentre outras coisas).

O Dr. Bengala  faz uma volta ao passado, apesar da doença que impede movimentos e torna difícil o fato de falar, ainda mais como sempre foi seu estilo sempre alto: Rondônia tinha muitos problemas naqueles tempos do Território. Eu era o único deputado, ficava sozinho, implorando, pedindo a favor de Rondônia, contra a má vontade da Arena que fazia o que o Governo (Federal) queria. Então fazia muitos discursos, sempre calçados sobre documentos para garantir seriedade ao que eu denunciava. Até hoje não sei como não fui cassado em várias ocasiões.

Jerônimo foi o primeiro político rondoniense a entender a importância de se comunicar diretamente com o eleitor. Sem dinheiro, sem espaço no Governo, eu usava o que fosse possível de espaço no noticiário A Voz do Brasil para dar meu recado e dizer o que estava fazendo – àquela altura a Voz do Brasil era o noticiário mais ouvido em Rondônia, por onde normalmente também se tomava conhecimento sobre demissão e nomeação de governadores.

Desde seu primeiro mandato Jerônimo Santana criou um boletim informativo de suas ações, material impresso em preto-e-branco, deixado religiosamente a cada 15 dias em escritórios, lojas, repartições públicas e residências. Era o Jornal do Deputado cujas matérias, ás vezes, eram aproveitadas pelos veículos de comunicação locais.

Se no primeiro mandato, de 1970, a busca de votos se deu contra a máquina do governo e os cutubas, o de 1974, quando derrotou o médico Leônidas Rachid, da Arena, agora também havia outro adversário, os grupos mineradores de cassiterita que vinham sendo denunciados pelo Dr. Bengala.

 

Jerônimo ganhou outra vez e em 1978 foi o primeiro colocado na disputa das duas vagas para deputado federal – naquele ano os Territórios elegeram dois representantes ao invés de um único e o segundo colocado foi o advogado guajaramirense Isaac Newton.

Mas em 1978 Jerônimo já não era unanimidade absoluta dentro do MDB. Dois dias antes da convenção regional ele reuniu um grupo e anunciou quem seriam o quatro candidatos (a Lei permitia isso) para as duas vagas em disputa. Mas um grupo formado pelos vereadores de Porto Velho Paulo Struthos, Cloter Mota, e Abelardo Castro, liderado por um dos braços direitos de Jerônimo, Enjolras Araújo Veloso,  ao ver que não conseguira emplacar a indicação de Abelardo dentre os quatro nomes, decidiu partir para a disputa.

O grupo dissidente ganhou a convenção, mas acabou havendo um acordo, com a inclusão do nome de Abelardo na chapa capitaneada pelo próprio Dr. Bengala, candidato nato, mais Abelardo, Walmir Daves de Moraes e Carlos Melhoral.

 

Da campanha um então aspirante a oficial da Guarda Territorial e, hoje, aposentado como coronel e ex-comandante da Polícia Militar, tem uma lembrança de uma das marcas do discurso de Jerônimo. Eu havia sido destacado pelo governo do Território para dar segurança ao deputado que denunciou ter recebido ameaças físicas. Mas ele pedia sempre para eu e minha equipe chegarmos um pouco depois dele aos locais onde ia se reunir ou fazer comício.

O oficial cumpriu sua parte, mas lembra que esse fato, de não chegarmos junto com ele, dava o gancho para seu discurso de se dizer perseguido. Ele iniciava sua fala dizendo que o governo mandava a polícia para gravar o que ele dizia. Aí, como nós chegávamos depois dele, conforme ele mesmo pedira, quando estávamos estacionando a viatura ele voltava no discurso e dizia que nossa presença era a prova da sua afirmação de estar sendo vítima de perseguição.
 

 

No próximo domingo:

  • Os projetos para a criação do Estado
  • O constante temor de uma cassação
  • A entrada de Múcio Athayde no PMDB rondoniense
  • A derrota na disputa pelo Senado em 1982
  • As conversas com Jorge Teixeira
  • As vitórias nas disputas da prefeitura e do Governo
  • O ostracismo social e político  
     

Fonte:  Lúcio Albuquerque - jotalucio@bol.com.br
 

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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