Sábado, 2 de fevereiro de 2013 - 05h33
Por MATIAS MENDES
Foi-se já o tempo em que escrever na Imprensa em Rondônia ainda tinha lugar para eventuais tapeadores que fingiam saber francês apenas repetindo em colunas sociais muitos “avec”, enrolavam no inglês com infindáveis “ok”, estropiavam a História com a balela de que as pedras da construção do Forte do Príncipe da Beira haviam sido transportadas de Belém e do Peru e havia até quem sustentasse a tese de que os textos para a Imprensa não podiam ser cultos para não parecerem rebuscados. O advento da internet que coloca ao alcance de qualquer lugar do mundo os textos aqui publicados reduziu a pó os antigos paradigmas vigentes aqui nas profundezas da selva amazônica, como costumava dizer o grande jornalista Paulo Queiroz. Agora qualquer omissão, involuntária ou intencional, qualquer cochilo, qualquer barrigada, qualquer deslize que se cometa vai mesmo passar pelo crivo das críticas dos observadores criteriosos dos textos publicados. Se o autor do texto tropicar, se estrumbica mais dias, menos dias.
Acontece isso com certa frequência comigo, não raro alguém cobra algum tipo de esclarecimento, pede mais detalhes de algum assunto deixado nas entrelinhas, reclama do uso excessivo de expressões estrangeiras, aporta algum dado a determinados episódios e assim por diante. No artigo anterior, por exemplo, em rápido painel que teci sobre os governadores do Estado de Rondônia, alguém pretendeu alertar-me de que eu havia esquecido o ex-governador Ângelo Angelim, o último inquilino do casarão onde hoje funcional mal e porcamente o Memorial Coronel Jorge Teixeira. No entanto, não foi por esquecimento que deixei de citar o ex-governador Ângelo Angelim, foi por omissão intencional, foi em razão de que o seu nome não teve qualquer relevância para o contexto do assunto abordado.
Destarte, o ex-governador Ângelo Angelim teve como papel histórico ser um mero divisor de águas entre os ciclos dos governantes militares e o primeiro governador de Rondônia escolhido pelo voto popular. Ele foi uma espécie de hífen da História, foi apenas uma espécie de secretário executivo do PMDB que guardou a cadeira destinada a Jerônimo Santana depois que o Coronel Jorge Teixeira foi traído pelos políticos por conta do fracasso de Amir Lando de tornar-se presidente da Assembleia Legislativa. O assunto é infando, pouco comentado, mas na verdade o Coronel Jorge Teixeira foi mesmo derrubado do poder pela sede de poder do PMDB. Como restavam poucos meses para as eleições gerais de 1986, o PMDB não quis queimar nenhum dos seus nomes de peso como Ronaldo Aragão, Tomás Correia, Orestes Muniz, Amir Lando ou mesmo Clóter Mota na ingrata, mas bem recompensada, missão de servir de governante fantoche, pau-mandado de Jerônimo Santana que ocupava então a Prefeitura Municipal de Porto Velho, mas era de fato quem já dava as ordens na esfera estadual de Governo.
Ângelo Angelim foi adrede escolhido pela pouca representatividade que tinha. Era um deputado de rabicheira, le dernier lieu, eleito no município de Vilhena onde ganhava a vida como professor. Na verdade, ele não havia de fato sido eleito, foi arrastado pelos votos de legenda. Tinha boa e sólida formação que lhe vinha da vertente religiosa, havia estudado em Seminários católicos, era formado em Filosofia, mas no Parlamento foi figura apagada, inteiramente ofuscado pelo brilho e o arrojo político de homens como Tomás Correia, Amir Lando, Clóter Mota, Sadraque Muniz, Ronaldo Aragão, isto para falar apenas de seus correligionários do PMDB, já que do outro lado pontilhavam políticos brilhantes como Jacob Attalah, Amizael Gomes da Silva, Zuca Marcolino, José do Prado, José Bianco, enfim, o deputado Ângelo Angelim não tinha qualquer perspectiva de voltar a eleger-se outra vez. Foi-lhe então proporcionada a oportunidade de se estabelecer na vida como governante aposentado mediante o sacrifício de passar alguns meses como o fantoche de luxo de Jerônimo Santana. No plano político, pela sua absoluta neutralidade de monge, ele não fez desafetos nem conquistou admiradores, limitou-se a cumprir o seu apagado papel e retirou-se discretamente da vida pública com sua polpuda pensão de ex-governador. Um cunhado seu, professor também, que lhe serviu de eminência parda, fez fortuna durante o seu curto período de governo e estabeleceu-se em Brasília como grande empresário do ramo de restaurantes, segundo os confiáveis assentamentos do meu Centro de Informações. Homem pacato e muito reservado, ele nunca mereceu da Imprensa nem críticas, nem elogios, passou de fato pela História do Estado de Rondônia como Pilatos entrou na oração católica do Credo.
De tal modo, o ex-governador Ângelo Angelim tem muito mais vantagens em ser omitido do que em ser citado, pois a omissão serve para poupá-lo dos aspectos desconfortáveis da sua biografia política que o caracteriza como um acidente político que beira a nulidade. E não vale a pena ferir a sua índole sabidamente pacata com certas lembranças que podem incomodá-lo de alguma forma. O certo mesmo é que nunca pesaram contra ele quaisquer acusações de desvios de conduta, ele limitou-se a cumprir o que lhe foi ordenado pelo seu partido, não complicou as coisas simples, nunca se queixou de haver sido vítima das circunstâncias políticas que lhe garantiram um futuro confortável, enfim, ele não foi um Atalíbio, não foi um Pillon, não foi um Donadon, não foi um Cassol, não foi um Válter Tocaia Grande, não foi um Roberto Sobrinho, foi apenas aquele que foi sem de fato haver sido, foi somente o hífen discreto entre dois ciclos distintos da História de Rondônia, não influiu nem contribuiu, não podendo nem mesmo ser acusado pela fortuna suspeita do seu cunhado, já que muitos anos antes João Goulart e Leonel Brizola haviam consagrado o princípio de que cunhado não é parente...
No entanto, de conformidade com o princípio latino de que “Amicus Plato, sed magis amica veritas”, expressão que o ex-governador Ângelo Angelim é perfeitamente capaz de compreender e declinar com o seu bom Latim aprendido no Seminário, mas que também o meu culto amigo Isaac Newton compreende e declina muito bem, já que no momento eu estou me livrando do estigma terrível que os latinos diziam “Nemo propheta in pátria sua”, sendo aos poucos absolvido do meu horrendo pecado cultural de haver aprendido línguas estranhas, estou respondendo apenas ao questionamento que me foi feito a respeito da não citação do ex-governador Ângelo Angelim no meu artigo anterior. Esclareço, portanto, que a minha omissão não foi por cochilo, foi de fato intencional para não expor desnecessariamente o inofensivo governante-tampão à crueza dos fatos que lhe marcaram a trajetória...
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