Senadores, deputados, ONGs e estudantes e familiares do líder seringueiro reverenciam a memória dele.
MONTEZUMA CRUZ
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BRASÍLIA – O ministro da Justiça, Tarso Genro, disse hoje que, no próximo dia 10 de dezembro, o País “pedirá perdão a Chico Mendes”. Ele referiu-se ao ato de apreciação do requerimento de anistia política para o líder seringueiro e ambientalista Francisco Alves Mendes Filho e outros ex-perseguidos políticos da Amazônia.
Naquela data, no Teatro Plácido de Castro, em Rio Branco, capital do Estado do Acre, acadêmicos e pesquisadores de diversas áreas do conhecimento, organizações e militantes de direitos humanos, anistiados e demais interessados participarão da 17ª Caravana da Anistia, cujo tema é “Vinte anos sem Chico Mendes e 60 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos”.
A Lei de Anistia envolve as perseguições políticas de 1946 a 1988. O Comitê Chico Mendes e o Governo do Acre programaram diversos atos para lembrar Chico, em Rio Branco e em Xapuri, a 180 quilômetros da capital. Outdoors espalhados por cidades do Estado lembrarão que, duas décadas depois, "Chico vive".
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Marina e Minc, observados por Zuenir Ventura (e) /M. CRUZ |
“Ele foi o símbolo da reconstituição de uma utopia libertária e revolucionária”, afirmou Tarso Genro. O discurso emocionado ganhou aplausos dos participantes da sessão solene Congresso Nacional, que marcou os 20 anos do assassinato de Chico, ocorrido no dia 22 de dezembro de 1988, em Xapuri (AC).
"Utopia libertária"
Na primeira fileira, o jornalista e escritor Zuenir Ventura – autor de diversas reportagens e de um livro sobre Chico Mendes – ficou ao lado da atriz Lucélia Santos. O deputado José Genoíno (PT-SP) lembrou-se das suas andanças pelo Acre: “Nem eu nem o Chico tínhamos notoriedade na época”. Falou do jeito conciliador de Chico, mesmo nas calorosas assembléias do PT.
Ao verificar a lista de autoridades e convidados, o vice-presidente do Senado, Tião Viana (PT-AC), que dirigiu a sessão, anunciou que mencionaria os nomes durante o intervalo dos discursos. Foram mais de 40. Na mesa e no plenário estavam também presentes a família e diversos companheiros de Chico. Ao todo, cerca de trezentas pessoas.
O presidente do Senado, Garibaldi Alves Filho, falou no final do ato, reiterando seu compromisso com os ideais e a luta do sindicalista. Agradeceu a presença de companheiros de luta de Chico Mendes - "aquele que enfrentou poderosos e tombou vítima de balas assassinas".
Chico vivia ameaçado,
lembra o ministro Vanucchi
Da tribuna, o ministro da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, Paulo Vanucchi, emocionou um pouco mais o plenário, quando se dirigiu a Abrahim Farhat Neto, o "Lhe", indagando-lhe se lembrava das vezes em que denunciava, em Brasília, as sucessivas ameaças contra a vida de Chico.
“Você dizia que o discurso era cansativo, mas nos alertava que, se não fossem tomadas providências, Chico um dia seria morto. Lembra-se?”. Sentado quase no 'fundo' do plenário do Senado, Abrahim fez sinal de concordância. Dirigente estudantil nos anos 1970, ele foi companheiro de Chico e um dos principais colaboradores do extinto jornal “Varadouro”.
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Suplicy, Elenira Mendes e Raimundo Barros, vereador e sindicalista em Xapuri / M.CRUZ |
O senador Eduardo Suplicy (PT-SP) disse que a truculência da qual Chico foi vítima continua em ação no Brasil de hoje. Segundo o senador, foi a mesma truculência que levou ao assassinato da irmã Dorothy Stang e de líderes sindicais rurais na Amazônia e em outras regiões do País. O senador Cristovam Buarque (PDT-DF) sugeriu uma vigília no plenário, que intitulou de “Noite Chico Mendes”, para se definir quais as propostas do Parlamento e do povo brasileiro para Amazônia.
"Choro e sonho"
Para a deputada Perpétua Almeida (PCdoB-AC), a sessão do Congresso “faz reviver a luta de Chico”. “Aqui tem choro, mas também tem sonho”, ela disse. Lembrou o bilhete deixado pelo seringueiro “aos jovens do futuro” e declamou uma poesia escrita pelo deputado estadual Edivaldo Magalhães (PCdoB), feita pouco depois da morte de Chico.
O violão e a voz do cantor acreano Sérgio Souto despertaram mais sentimentos. Ele interpretou as músicas “Minha aldeia” e “Assim falou Francisco”. Aproveitando um dos trechos da segunda, a senadora Marina Silva (PT-AC) cumprimentou o ministro Minc, “companheiro de sina e risco”. “Espero que esta sessão seja profética, de reparação histórica”, disse. Marina foi companheira de Chico nos famosos “empates” feitos em seringais acreanos entre o final dos anos 1970 e os anos 1980.
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Acreanos, com Genoíno (C), antes da sessão / M.CRUZ |
Legado de Chico
“Em 2003, o Brasil tinha cinco milhões de hectares de reservas extrativistas e hoje, cinco anos depois, já tem onze milhões de hectares dessas reservas, beneficiando mais de cinqüenta mil famílias em todo o Brasil. Esse é o legado de Chico Mendes”, declarou. Citando Nelson Mandela e Martin Luther King, a senadora disse haver no mundo “homens virtuosos, capazes de transmitir as virtudes em instituições”.
Marina referiu-se ainda à fala da professora Raquel, ao final da apresentação de um grupo de alunos da Escola Pública da Quadra 326 Norte, que mostraram aspectos da História do Brasil do ponto de vista dos povos indígenas e dos escravos africanos. Eles retrataram alguns momentos da história do país desde o século 16. O grupo de alunos deixou em branco a interpretação sobre o Século XXI: “Sonhamos um Brasil com mais heróis e menos mártires”. Disse Marina: “Se fôssemos o produto do passado fez conosco, desenvolver a Amazônia é atraso, mas existe uma forma, que no meu entender é a sustentabilidade social, ambiental e cultural, que não veja apenas o lado econômico”.
“Ideal planetário”
“Ele deu a vida por esse ideal planetário tão bonito”, disse o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc. Dirigindo-se à senadora, chamou-a de “ministra Marina Silva” e confirmou investimentos de R$ 100 milhões no extrativismo do Acre. Em seguida, reafirmou sua disposição de participar das frentes políticas e ambientalistas daquele Estado, no fortalecimento das suas reivindicações.
Além da viúva Ilzamar Mendes e seus filhos Sandino e Elenira, e de Ângela Mendes, filha do primeiro casamento de Chico, integraram, também a mesa, o deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), o fundador da Aliança pelos Povos da Floresta, Ailton Krenak, ex-governador do Acre Jorge Viana e o líder sindicalista Raimundo Barros.
Fonte: Montezuma Cruz - A Agênciaamazônia é parceira do Gentedeopinião