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Montezuma Cruz

Trator, queimada e pastagem ameaçam geoglifos amazônicos


 
 
Joaquim Cunha registra geoglifos em cartório, mas alerta para duas situações perigosas: o desinteresse e a devastação 

MONTEZUMA CRUZ 
Agência Amazônia  

 

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ROLIM DE MOURA, RO – Tudo tem mais de mil anos e faz parte de um conjunto de achados que se configuram patrimônio arqueológico da humanidade. Não é um simples documento o registro feito por Joaquim Cunha da Silva no Cartório de Registro de Imóveis em Rolim de Moura. Ao confiar a constatação de geoglifos, pedras e cerâmicas localizadas entre Rolim de Moura, Alta Floresta do Oeste e Alto Parecis, ele alertou estudiosos, o Ministério Público e o Governo Federal sobre a necessidade de uma discussão com base científica e antropológica. O que está no cartório de Rolim de Moura é a tese Real Eldorado-Paititi Reino Gran Moxos.

Acompanhado do juiz da 1ª Vara Cível de Rolim de Moura, Maximiliano Deitos, e do indigenista Evandro Santiago, o farmacêutico firmou um termo de declarações no dia 17 de agosto ao procurador da República em Ji-Paraná, Alexandre Senra. Praticamente, ele repetiu os dados sobre as mais recentes descobertas e fez considerações a respeito do perigo iminente da devastação. Apelou ainda à Polícia Federal e à Superintendência Regional do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, mas ainda não obteve resposta oficial.

Cunha explicou que, além da pesquisa de campo, suas descobertas fundamentaram-se em imagens do satélite CBER2 e do Google Earth. Este último faz sucesso entre o Povo Indígena Suruí, cujo líder, Almir Suruí visitou Genebra, no ano passado, para formalizar um convênio que lhe permitirá vigiar melhor as terras do Posto Indígena Sete de Setembro. Algumas linhas dessa reserva haviam sido invadidas em 1976 pela frente pioneira incentivada pela colonização dos Irmãos Melhorança, proprietários da Gleba Itaporanga. 

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 Sobrevôo próximo à Ilha de Porto Rolim permite ver o geoglifo com a serpente, o jaguar e o condor, tal qual mencionam alguns pesquisadores da história inca / LÚCIA RODEGHERI



Sobrevôo e expedições terrestres permitiram ao pesquisador chegar aos geoglifos por ele descritos dentro desse Real Eldorado-Paititi Reino Gran Moxos. Ele viu o paisagismo vegetal sobre relevo, levantamento de terra ou ilha artificial. E já antecipou a fatalidade, caso não sejam tomadas as devidas providências em relação à conservação dessas descobertas: “Nas áreas entre os geoglifos tem ocorrido queimadas e derrubadas com tratores, ambas com o fim de ampliação das pastagens”, disse Cunha ao Ministério Público Federal. 

Pecuária, madeira e fogo

Segundo ele, as queimadas anuais não respeitam as margens dos rios. O fogo já atingiu a Terra Indígena Massaco (421,8 mil hectares dos quais, apenas a metade controlados), entre os municípios de Alta Floresta do Oeste e Costa Marques. “A área mais crítica da reserva é o seu entorno, onde existe um acelerado processo de ocupação devido, principalmente, a 

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Áreas de pasto podem comprometer a continuidade da descoberta de peças com idade milenar na região entre Rolim de Moura e Alto Alegre dos Parecis / JOAQUIM CUNHA

atividades agropecuárias e madeireiras dos municípios vizinhos”, descrevem Ana Maria Canut da Cunha (Ibama), Camila Aparecida Lima (Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia) e Laura Dietzsch (Instituto de Pesquisas Ambientais da Amazônia), no levantamento divulgado em 2007, a respeito das áreas de maior risco de incêndio na Reserva Biológica do Guaporé.

Queimadas em lugares próximos a unidades de conservação contrariam a Resolução nº 13 do Conselho Nacional do Meio Ambiente. “Uma nova queimada seria desastrosa, porque destruiria os geoglifos”, alertou o pesquisador no termo de declaração. Conversando com o filho da proprietária de uma área de terras, o pesquisador soube do plano de ampliação da pastagem, inclusive com o uso de tratores de esteira. Essas máquinas já vêm sendo usadas nas derrubadas da mata original na região.

Cemitério inca 

 

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Esmeraldas encontradas numa propriedade rural foram fotografadas e devolvidas ao dono da terra. Joaquim Cunha acredita que há mais pedras e minérios nos municípios da região / ÁLBUM ELDORADO PAITITI

Assim, estão diretamente ameaçados a Pirâmide do Condor e o painel da Via Láctea, ambos em Alta Floresta do Oeste. Próximo à cabeça do geoglifo da Lhama existe um cemitério arqueológico com cerâmicas e ossadas. Cunha lembra que o curral da antiga Fazenda Glovaski foi construído sobre esse local. Uma descoberta acidental, já que o curral surgira anteriormente à descoberta do cemitério, detectado por ocasião da queda de uma árvore. Foi quando apareceram urnas funerárias.

Cunha alerta para a destruição de geoglifos no entorno da Reserva Biológica do Guaporé, no distrito de Izidrolândia, em Alta Floresta do Oeste. E lembra a importância de se conservar as áreas com vestígios da antiga civilização em território brasileiro. “Entre outras, posso citar o fato de os nativos da América já terem calendário de 365 dias há mais de dois mil anos. Eles usavam esse calendário o planejamento de suas atividades, inclusive a agricultura.

Domesticação de plantas

PORTO VELHO, RO – “Os índios se apresentavam como especialistas na movimentação de terra – earthmovers, na denominação em inglês – e criaram um grande laboratório de domesticação de plantas na região que compreende os Andes, provavelmente nesta parte da Amazônia Brasileira também.

“É possível que a mandioca, amendoim e mesmo a goiaba tenham sido domesticadas nesta região”, comentou o pesquisador Evandro Ferreira, do Parque Zoobotânico da Universidade Federal do Acre (Ufac). A mandioca, com certeza, conforme exame de DNA feito pela Embrapa Biotecnologia, de Brasília. O pesquisador Luiz Joaquim Castelo Branco Carvalho, estima que a planta-mãe da mandioca tenha entre 10 mil e 12 mil anos e é originária de terras bolivianas, rondonienses e acreanas.

Estudos indicam a existência, no mundo, de oito centros de domesticação e difusão de plantas que estão na base alimentar do homem. O mapa de Vavilov sugere que esta região da Amazônia foi um desses centros. (M.C.)

Quem já procurou Paititi 

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Joaquim Cunha (durante incursão na floresta no sul do Estado de Rondônia) procurou o Ministério Público para descrever as peças encontradas e os geoglifos que poderão despertar universidades, Patrimônio Histórico e sociedades internacionais de pesquisa para novos estudos / ÁLBUM ELDORADO PAITITI



  - PORTO VELHO – Estes são alguns dos mais conhecidos exploradores que fizeram expedições em busca do Paititi: Carlos Neuenschwander Landa (Peru), médico; Juan Carlos Polentini Wester (Argentina), padre; Gregory Deyermenjian (EUA), psicólogo; Paulino Mamani (Peru), cartógrafo. Estas são as áreas exploradas, como possíveis localizações: a zona fronteiriça entre a Bolívia e o Brasil e a parte oriental do Peru, a leste do rio Vilcanota.

Nicholas Asheshov escreveu: “Há mais chance de se ganhar na loteria do que de encontrar El Dorado ou Paititi, mas cada expedicionário preferiria encontrar a cidade do que ganhar a loteria. Para descobrir o desconhecido passado é tão bom quanto, e mais crível e possível que, ver e tocar um UFO. Mostre-nos o homem que possa provar que El Dorado e Discos voadores não existem!”.

“Se não nos mobilizarmos, essa história continuará com falhas, a exemplo de outras que aqui se passaram”, diz o pesquisador Joaquim Cunha. Para o historiador Francisco Matias, sobreviventes incas correram para a Amazônia Ocidental brasileira, na vã tentativa de fugir ao degolamento a que haviam ido condenados pelos espanhóis. “No coração da floresta amazônica, eles construíram um templo e um grande cemitério para onde os sobreviventes levavam os corpos daqueles que eram assassinados”.

Ainda conforme Matias, os incas exploravam o minério de estanho (cassiterita), com o qual fabricavam seus ornamentos e peças. Ou seja: há séculos os povos maia e inca conheciam a técnica de produzir estanho e cobre. “Também produziam ouro, prata, bronze, rubis, esmeraldas e outras 

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A estatueta de cobre foi encontrada num sítio em Alta Floresta. O pesquisador visitou várias propriedades com restos de minério e cerâmica. Segundo o historiador rondoniense Francisco Matias, os incas conheciam há séculos a técnica de produzir estanho e cobre / JOAQUIM CUNHA

gemas preciosas, e conheciam a técnica de lapidação. Conheciam 144 elementos químicos e a técnica de embalsamar cadáveres”. Quem sabe, os vestígios encontrados entre Rolim de Moura e Alto Alegre dos Parecis evidenciem que tenha sido mesmo aqui o novo território inca, pós-massacre. (M.C.)

▪ Em 2001, o arqueólogo italiano Mario Polia descobre o relatório do padre Andrea Lopez nos arquivos dos jesuítas em Roma. Este relatório falava acerca da misteriosa cidade de Paititi, ou talvez Eldorado – um reino perdido situado nos lados inexplorados das florestas peruanas, na região abrangida pelas densas e hostis selvas amazônicas.

▪ Segundo esse relatório, os missionários Jesuítas daqueles tempos, liderados pelo Padre Andrea Lopez, teriam encontrado Paititi, ou Eldorado (segundo descreveram uma cidade adornado pelo ouro, prata e pedras preciosas) e pediram, então, a devida permissão ao Papa para evangelizar os seus habitantes, o que foi de pronto negado e abafado pela Igreja Católica, escondendo ainda a sua localização, de modo a "evitar uma corrida do ouro ao local e, ainda, a eventual ocorrência de uma histeria em massa". (Wikipédia)
 
 

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Na Procuradoria da República, o alerta do pesquisador: desmatamento, fogo e pasto comprometem a descoberta / REPRODUÇÃO



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24/08/09
GEOGLIFOS, PEDRAS E CERÂMICAS REAVIVAM O SONHO DO PAITITI

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