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Silvio Persivo

As mudanças no mundo do trabalho reclamam novas formas de pensar


As mudanças no mundo do trabalho reclamam novas formas de pensar  - Gente de Opinião

Leio no jornal português “O Público” que uma pesquisa do Instituto Nacional de Estatística (INE) revela que as empresas portuguesas contatam mais frequentemente os seus trabalhadores fora dos seus respectivos horários de trabalho atualmente mais do que há quatro anos. Segundo ainda a mesma pesquisa  quase 40% dos funcionários tiveram solicitações de trabalho no seu período de descanso pelo menos uma vez nos dois meses anteriores. Segundo o inquérito, em 2015 mais de metade (56,6%) da população empregada no 2º trimestre afirmava nunca ter sido contatada profissionalmente fora do horário de trabalho. No trimestre equivalente de 2019, aquele valor diminuiu 3,9%, sendo agora 52,7% os que fazem tal afirmação. Em sentido contrário, 39,2% dos trabalhadores empregados hoje dizem ter sido contatados por questões da empresa em horário de descanso, pelo menos, uma vez nos últimos dois meses – a diferença entre os dois indicadores são os entrevistados que não sabem ou não respondem. Destes, 20,2% receberam este tipo de contato “uma ou duas vezes”, enquanto os restantes 19% revelam uma prática mais frequente. Na maioria desses casos (13,2%), os contatos são feitos na expectativa de que o trabalhador interrompa o seu período de descanso para resolver algum problema.  Os contatos fora do horário de trabalho são mais frequentes entre homens (49,1%, contra 40,3% entre as mulheres); funcionários com formação superior (61,2%) e trabalhadores por conta de outrem (56,8% reportam a existência destas práticas nos últimos dois meses). Dentro destes, o fenômeno é particularmente sentido pelos funcionários que têm vínculos com termo (60,5%). Também é significativo na pesquisa que quase um terço dos trabalhadores (28,8%) afirma trabalhar “sempre, ou muitas vezes” sob pressão de tempo, “tendo de terminar tarefas e trabalhos ou tomar decisões dentro de prazos considerados insuficientes”. Pouco mais de um terço da população empregada (34,1%) afirma ter total, ou muita, autonomia para decidir a ordem e o modo como executa as suas tarefas ou trabalhos. Bem, a pesquisa é portuguesa, mas, não deve ser muito diferente no Brasil. Parece que, apesar do descanso ser considerado um direito fundamental do trabalhador, a jornada de trabalho, que é o período estabelecido no contrato com a empresa que deve ser cumprido pelo empregado, está, cada vez mais sendo menos respeitada, principalmente, quando se trata de trabalhadores de nível superior ou especializados. O que se percebe é que a legislação brasileira (e mundial) gira em torno do emprego que, com o desenvolvimento da tecnologia e da inteligência artificial, ao meu ver, tende a diminuir muito. Mas, se o emprego tende a diminuir, ou, talvez, como pregam alguns, a desaparecer, o trabalho, certamente, não desaparecerá. A verdade parece ser que é preciso que se pense em novas leis mais adequadas a uma nova realidade. O enfraquecimento sindical não se dá à-toa. Reflete o fato de que a classe trabalhadora é, cada vez mais, fragmentada e heterogênea. Pensar que se possa agrupar interesses crescentemente difusos é uma tolice. A questão do futuro será como remunerar melhor o trabalho ou como criar uma forma de renda universal que se sustente num modelo onde só uma parte muito pequena da força de trabalho será contratada por empresas. A dissolução entre o trabalho e o descanso, que aumenta a olhos (e pesquisas) vistos, é um sintoma das profundas modificações do mundo do trabalho. E é preciso que se pense em novas formulas e não, como faz grande parte da mentalidade de esquerda, desejar que “direitos” se sustentem, quando não possuem, como contrapartida, o substrato econômico que os viabilize. É um belo discurso, o de falar em direitos, mas, a história demonstra que eles só existem quando a economia permite que possam ser sustentados.

 

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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