Segunda-feira, 31 de julho de 2006 - 06h02
No meio das maiores investigações que se tem noticia da história do Congresso brasileiro e da evidência de casos gravíssimos de corrupção envolvendo os governantes federais, inclusive com sérias evidências contra o ex-ministro da Saúde, Humberto Costa, e municipais, as palavras do presidente Lula da Silva de que a oposição sente ódio pelas coisas boas feitas em seu governo soam meio descabidas. Embora demonstrando um desmemoriamento gigantesco, e uma arrogância explícita, na afirmação de que com três anos e sete meses (das quais grande parte passou fora de Brasília ) não teve o menor constrangimento de dizer que "humildemente, não tem medo de sermos comparados (sic) com nenhum governo na historia do País, em nenhuma área". E se referiu às críticas dos adversários ao governo como se fosse dor de cotovelo afirmando "Que bom que as pessoas sintam tanto ódio, não pelas coisas ruins , mas pelas boas"
Pelo visto não passa por sua cabeça que são da lavra de seu governo o recorde de 240 mil sem-terras acampados em barracas, os formidáveis desmazelos do PCC, as invasões do Congresso, da Aracruz nem o envolvimento de um número recorde de parlamentares na cobrança de propina sobre ambulâncias superfaturadas sem contar as revelações degradantes que já haviam sido feitas nas CPIs do Mensalão, dos Correios e dos Bingos, na mais formidável falta de ética que já se assistiu de um governo. A imagem do parlamento em particular e da classe política desgastada, por mais que a generalização seja mentirosa e injusta, não parece ter nada a haver com seu governo ou com ele.
Nem parece que deseja que no processo eleitoral estas questões sejam discutidas. No seu entender, e pelo discurso que faz, como a prática política sempre foi uma história de apropriação ou de uso privado dos bens e serviços públicos, o que acontece no governo dele não tem nada demais. Só procura afirmar que isto se faz porque no seu governo se fiscaliza mais e que os que são pegos são punidos- o que é menos verdade. Também não gosta de que afirmem que o clientelismo, uso da máquina pública, toma-lá-dá-cá, negociação sobre emendas parlamentares, propina aberta ou dissimulada, tenha se tornado oficial com o uso de verbas para ONGs e entidades sindicais que se atrelam ao governo e as bolsas e vales usados, sem critérios técnicos, para fazer um tipo de clientelismo oficial que só tem de novo a tentativa de transformá-lo num novo Pai dos pobres. Porém não dá para se esquecer que provém do executivo um nível de audácia na corrupção que ultrapassa os limites do primarismo e desemboca na impunidade que cercou a quadrilha do mensalão e ameaça ser bisado com a máfia dos sanguessugas. O que Lula da Silva não tem como esconder é que todas distorções tem como fonte a utilização indevida do que é público para benefício do privado, sejam parlamentares, assessores, prefeitos, membros do executivo ou dos partidos. E isto não acontece em nenhum governo do passado e sim no de quem se apresenta como padrão de ética e de moral brasileira que, infelizmente, não vê, não ouve e não enxerga senão as coisas boas feitas no seu governo que nos levaram ao alto grau de descrença, de falta de respeito aos políticos e as campanhas de voto nulo. Claro que, para Lula, a culpa de tudo isto é da oposição, da imprensa e dos intelectuais que são incapazes de ver seu imenso sacrifício pelo país que os mais escolarizados estão doidos por dispensar. É um caso inconteste de autismo político.
Fonte: Sílvio Persivo
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