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Silvio Santos

Minha Vivencia e conhecimento sobre a cidade de Porto Velho + As quatro portas do Mercado Municipal


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As quatro portas do Mercado Municipal

 

A história da construção do Mercado Mu­nicipal é cheia de percalços. Basta lembrar que sua edificação começou, graças a uma pendenga entre o Superintendente (prefeito) Major Fernando Guapindaia de Souza Bre­jense e a administração da Madeira-Mamo­ré Railway Co.  

Quando Joaquim Augusto Tanajura assumiu a superintendência con­denou a obra, aí vemos que já naquele tem­po, nossos políticos tinham a mania de des­fazer o que seus opositores haviam iniciado, só para ficarem com os louros de assinarem como sendo suas, as obras da cidade.

Tana­jura não conseguiu o apoio da população para pôr em prática sua ideia e então abandonou a construção, que ficou totalmente paralisada por vários anos e com certeza, a área da cons­trução foi tomada pelo matagal. Anos de­pois, já em seu segundo mandato (1923) Tanajura conseguiu seu intento e mandou demolir o que Guapindaia havia construí­do, e ao retomar a construção Tanajura não conseguiu nem terminar os alicerces da obra.
Para encurtar nossa conversa, o Merca­do Público Municipal de Porto Velho só foi concluído em 1950, na gestão do prefeito Ruy Brasil Cantanhede.

Nossa intenção nessa matéria, é falar sobre as Quatro Portas de entra­da e saída que existiam no prédio do nosso Mercado Público Municipal.

 

A BANCA DE JORNAL DO SEU BARROSO

 

Pelo lado do  hoje  Calçadão Manelão ou pela porta que ficava para o lado do Palácio Presidente Vargas,  existia a Banca de Jornal do "seu" Barroso que por algum tem­po, só vendia o jornal Alto Madeira. Ali se reuniam nas manhãs de domingo e até em dias de semana, os chamados "categas" me­tidos a intelectuais, para discutir as notícias publicadas no jornal.

Entrando mais um pouco, deparávamos, com a "Banca" do Boy onde a gente podia degustar deliciosas iguarias como mingau de milho (mungunzá), tapioca, pamonha e é claro, aquele café com leite (in natura) a famosa média, Boy era marido da famosa tacacazeira dona Chiquinha.

No espaço a direita dessa porta, ficavam as "bancas" dos verdureiros. 

Pelo lado de fora do mercado que ficava no rumo da José de Alencar, tinha o Caldo de Cana do J Lima (a famosa saltenha só começou a ser produzida muito depois). Pro lado do Banco da Borracha, ficava a taber­na do Zé Curica, o Zizi e a boutique "Veadinho de Ouro" do Zé Carlos Lobo. Na esqui­na da Travessa Renato Medeiros (hoje calçadão Manelão) com a José de Alen­car existiu também a lanchonete do "seu" João (aquele que até bem pouco tempo ti­nha um lanche no terreno da Casa de Cultu­ra).

 

A BANDA DE MIÚDO DO BODÓ

 

Pela porta da Presidente Dutra, tinha o açougue do Bodó. Esse açougue era especi­al, porque só vendia "miúdo" de boi fígado, bobó, rim, coração, tripa grossa, tripa fina, livro, mocotó e carne morta. O interessante é que naquele tempo, era praticamente im­possível se comprar um quilo de fígado, ou um coração inteiro. Bodó e o outro açougueiro conhecido como Faca Cega, só ven­dia a famosa "misturada".

Um quilo de "mis­turada" era composto por um pedacinho de cada parte do miúdo, ou seja, um pedacinho de fígado, um pedacinho de coração, um pedacinho de rim, um pedacinho de car­ne morta e um pedação de bobó. Vale sali­entar, que esse açougue só funcionava à tar­de.  

Para se conseguir uma "panelada" completa (mocotó, tripa fina, tripa grossa, bu­cho e o livro), era complicado, era um pou­quinho de cada coisa também, essa prática era para que o Bodó e o Faca Cega atendes­sem maior número de fregueses.

Pelo lado direito de quem entrava por essa porta, foi instalado o primeiro frigorí­fico de Porto Velho. Seguindo no rumo da Henrique Dias tinha a Casa Rio Madeira cuja especialidade era a venda de material de caça e pesca (no dia do incêndio ninguém conseguia encostar com tanta bala disparan­do).

No rumo do palácio depois do açougue do Bodó tinha uma barbearia; e a alfaiataria o seu Tancredo.

Era em frente a essa porta, que fica­va o CARRO DE MINGAU do seu DEGA. O Dega che­gava ao ponto, por volta das cinco horas .da madrugada com sua "banca" ambulante, puxado por um boi.


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A PORTA DO ZÉ RISADA

A Porta da Henrique Dias

Desse lado também aos domingos e até em dias de se­mana, encontrávamos muitos "categas" na taberna do seu Elias Ribeiro ou na taberna do Luiz Gomes tomando uma cachacinha ou apenas batendo papo. Da entrada dessa porta se ouvia as gargalhadas do seu Zé Risada.

No espaço onde ficava o comercio do Zé Risada ficavam os boxes onde se comerci­alizavam secos e molhados. O Zé Risada se destacava dos demais, justamente, pelo bom humor ou pelas risadas escandalosas que eram ouvidas em todo o Mercado.

Em frente a essa porta, do outro lado da rua, ficava o armazém do Tufic Matny onde os funcionários do governo territorial compravam "fiado".  

Seguindo pelo lado do mercado ainda pela Rua Henrique Dias no rumo da José de Alencar, existia o sapateiro (consertador de sapatos) boliviano José Ca­macho que depois passou a vender Gás em botija e bicicleta Monark e transformou-se num grande empresário.

Pro lado da Presi­dente Dutra, bem na esquina, tinha o "seu" Wilson da Motorista cuja especialidade era a compra de sucata, (vendi muito alumínio, metal e cobre pro seu Wilson). Na esquina da Henrique com a José de Alencar era o comercio de José Oceano Alves cuja especi­alidade era a compra de produtos regionais como couro de animais silvestres, borracha, ipecacuanha, sova e outros.

Foi justamente por esse lado do merca­do, que segundo dizem, começou o incên­dio.

 

A PORTA DO PONTO CAÇULA

 

Essa era como se fosse à entrada princi­pal do mercado. Ficava pela José de Alen­car e era justamente a porta onde se forma­va a famosa "fila da carne" (depois vamos falar sobre essa fila).

Então na entrada dessa porta existia o famoso "Ponto Caçula"; sabem de quem era esse co­mércio, era justamente do seu Pedro Pacheco Dias um dos sócios da Casa Saudade. Seu Pe­drinho como era conhe­cido, foi um dos comer­ciantes mais queridos do Mercado Municipal, pela maneira como re­cebia seus fregueses, do Ponto Caçula ele conseguiu os recursos para construir o Bar do Canto (Carlos Gomes com Júlio de Castilho) o Bar mais antigo de Porto Velho. Logo a direita de quem entrava por essa porta, fica­va o espaço onde se vendia peixe e mais al­guns boxes com secos e molhados.

No espa­ço do lado esquerdo ficavam as bancas ou açougues onde se vendia carne verde (carne de boi).  Como podemos notar, o ponto caçula era praticamente o único ponto nesse corredor de entrada onde se comercializa­vam os chamados secos e molhados.  

Yedda  Bozarcobv na obra "Porto Velho - Cem anos de História 1907 - 2007" escreve: " ... O pa­vilhão destinado à comercialização de car­ne verde possuía quatro portais, piso de mo­saico em duas cores e as paredes eram revestidas com azulejos brancos numa altura de 1,80 m".

Pelo lado de fora, no sentido palácio do gover­no tinha a Casa Girão de José Girão Macha­do cuja especialidade era a venda de armas de fogo (revolveres, espingardas, rifles etc.) além de munição, aí também o estampido de balas foi destaque durante o incêndio. O Cabo Piaba se transformou em herói, justa­mente com o soldado Sebastião ao enfren­tar o fogo e as balas na tentativa de conter as chamas, do outro lado da rua, no hoje edifício do INSS tinha a Agencia da empre­sa aérea Cruzeiro do Sul o prédio era conhe­cido como "Prédio do Bechara" e a loja da família Chaquiam.

 

A fila da carne e o trem boiadeiro

 

Naquele tempo, nem todo dia se vendia carne (verde), nas bancas dos açougueiros do Mercado Municipal e então, quem quisesse comprar pelo menos um quilo de carne, teria que ainda de madrugada, colocar a sexta na fila (deixava a sexta e ia para casa dormir ou então dormia lá mesmo).

Aconteceu de muitas vezes, a pessoa ao chegar à beira do balcão na sua vez de ser atendida, o açougueiro anunciar que “ACABOU A CARNE”. Muitos açougueiros recebiam propinas dos “CATEGAS” (pessoas que exerciam cargos importantes no governo do Território ou da Estrada de Ferro Madeira Mamoré e Empresários), para guardar carne, cujas sextas seriam pegas depois. Quando alguém descobria essa “mutreta” a confusão estava formada e só parava com a chegada dos Guardas da Guarda Territorial.


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O TREM BOIADEIRO

 

Lembro que no meu tempo de menino/adolescente, era comum acontecer uma correria generalizada, principalmente pela rua 7 de Setembro. Para a maioria, essas correrias eram motivo de muitas risadas pois, muitos na realidade, nem sabiam do que estavam correndo; essa algazarra era provocada geralmente no dia que chegava na estação da Estrada de Ferro Madeira Mamoré o TREM BOIADEIRO uma composição ferroviária, que trazia Gado (BOI) da Bolívia, para ser abatido e vendido nos açougues do Mercado Municipal e durante a condução do rebanho rumo aos Campos de engorda ou matadouros acontecia, de um Boi se desgarrar e desabar na carreira, fazendo as pessoas também correrem com medo do Marruá.

Epílogo - Comer carne de boi em Porto Velho até meados da década de 1960, era coisa pra Catega!

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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