Sexta-feira, 28 de outubro de 2016 - 05h03
“Quando o roçado chegou a 170 metros, admirei uma árvore com o tronco muito grosso e perguntei que árvore é essa? Isso é um Angelim! E eu disse, aqui temos a primeira serraria de Alvorada
”
Morre João Távora
pioneiro de Alvorada D'Oeste
João Távora, um dos fundadores do município de Alvorada do Oeste (RO), faleceu aos 72 anos de idade, na madrugada de quarta feira dia 26, vítima de um Acidente Vascular Cerebral – AVC. João estava internado no hospital de Cacoal desde segunda feira. O pioneiro deixa dez filhos, 23 netos e sete bisnetos.
Em 2014 cumprindo pauta do Departamento de Comunicação do Governo Estadual - Decom, entrevistamos João Távora Filho. A entrevista também gravada em vídeo não foi publicada à época e hoje faz parte do acervo do “Museu da Pessoa” em fase de implantação na Superintendência de Turismo de Rondônia – Setur.
Em homenagem ao principal idealizador de Alvorada D'Oeste publicamos a entrevista que foi gravada no ano de 2014 e que pela primeira vez será do conhecimento público.
Alvora D'Oeste o sonho de um piá
Zk - É verdade que quando o senhor tinha apenas 11 anos de idade, sonhou em ter um sítio que depois seria transformado em cidade, com o nome de Alvorada?
João Távora – Meu nome é João Távora Filho, nascido no dia 15 de setembro de 1944. Aconteceu, que quando Juscelino Kubistchek decidiu criar Brasília, um de seus seguranças chegou e disse: “Tão dizendo que o senhor é louco”, no que ele respondeu: “Se eu não fosse louco não chegaria à presidência”. Então copiei dele essa atitude, de construir uma cidade no meio do nada, no nosso caso, no meio da floresta, essa decisão, tomei quando tinha apenas 11 anos de idade. O sonho também era colocar na cidade o nome Alvorada em homenagem ao palácio de Brasília.
Zk – Em que ano o senhor veio pra Rondônia?
João Távora - Vim de Cidade Gaúcha norte do Paraná perto de Umuarama, Cianorte e Paranavaí. Cheguei a Rondônia especificamente no distrito de Presidente Médice no dia 13 de agosto 1974.
Zk – E Alvorada?
João Távora – Ao chegar a Médice abri uma bicicletaria e também trabalhava como pintor. Certo dia chegou o Sebastião Alves Néri conhecido como Sebastião Preto e perguntou: “Você quer comprar uma marcação?” e eu: O que é marcação? “Marcação é terra!”. Fica a quantos quilômetros? “É bem aí” (fazendo o gesto com o beiço) “52 km e tem que ir a pé com o cacaio nas costas” - E o que é cacaio? Fui indagando sobre tudo, pois de mato não conhecia nada. Para encurtar a conversa, viemos pra cá (Alvorada), marquei esse lote onde estamos hoje e faz parte da cidade e fomos roçando sem experiência nenhuma, éramos o único “pó de arroz” da turma. Em 1979 já com as plantações, o rancho feito, trouxe a família para morar no sítio Alvorada. Quando a professora Zenaide (ex-esposa) começou a fazer as matrículas da primeira turma de alunos da escola que passou a funcionar no sítio ‘Santo Antônio’ de propriedade do senhor Antônio dos Santos e da dona Maria da Penha.
Zk - Para chegar até a primeira turma de alunos, muito água passou por debaixo da ponte. Certo?
João Távora – Farei um breve relato sobre essa história. Na data marcada, saímos de Médici rumo ao km 52: Satilião, Furtuoso, Nelson Preto, Antônio Santos, Zé Carlos Caetano, Zezinho, Chaguinha, Moises Amaral, Epaminondas, Zé Heleno, Pedrinho, Valdo, Arinaldo, Zé Balbino, Joaquim Barbeiro, Satilinho, Tião Preto, João Távora, Joventino, Dalmo, Sebastião, Aristides, Cachimbo de Ouro, Jorge Mariano e Zé Moraes. Quem tinha bicicleta pedalava pela picada aberta pelo INCRA até a 4ª Linha. Já com o cacaio nas costas e guiados pela topografia, percorremos até a 6ª Linha e pernoitamos no “Rancho das Pimentas”. Na madrugada do dia seguinte, após delicioso “Quebra Torto” (café com comida), continuamos e após descansarmos no topo da serra da 6ª Linha, caminhamos até o barraco próximo ao Rio Ricardo Franco (Muqui), jantamos e pernoitamos sobre folhas de coqueiros. Continuamos o trajeto até chegarmos ao barraco do senhor Satilião no km 50. Foram distribuídos os mutirões para cada Marcação e assim a gente ficava. Quando acabava a mercadoria voltávamos para Médice, rever a família, trabalhar para arrecadar mais dinheiro e comprar mercadoria para voltar para a Marcação.
Zk – E o sítio Alvorada quando surgiu?
João Távora – Quando resolvi abrir realmente o sítio Alvorada o meu sonho, começamos a roçar e o povo chegava: João Távora você tem mercadoria pra vender? Não! Tenho pra trocar em dia de serviço. Quando o roçado chegou a 170 metros mais ou menos, admirei uma árvore com o tronco muito grosso e perguntei que árvore é essa? Isso é um Angelim! E eu disse, aqui temos a primeira serraria de Alvorada e os companheiros: Serraria de Alvorada, só porque o sítio dele é Alvorada vai ter uma serraria? Quase no final do lote, uns 540 metros, me deparei com outra árvore grossa e perguntei pro seu Epaminondas (falecido), que árvore é essa? É um Mogno! E disse, isso aqui vai ser para construir a igreja católica... Igreja católica no meio da mata, esse baixinho tá pirando, comentavam os cacaeiros. Nesse ínterim, consegui duas tábuas de madeira, coloquei justamente onde hoje é o semáforo no centro da cidade, e escrevi: “Breve neste local, Sítio Alvorada” pintei também o símbolo de Brasília.
Zk – E a cidade propriamente dita como começou?
João Távora – Ganhei a confiança dos companheiros e vendo a dificuldade de todos, no dia 5 de agosto de 1979, os convidei para uma reunião no sítio Alvorada isso consta em Ata, e durante a reunião falei: Gente, to vendo a dificuldade que passamos em ter que ir à Médici fazer compras, vamos abrir uma clareira nos quatro lotes iniciais da Linha 52, para iludir comerciantes a virem pra cá e acabar essa nossa dificuldade. Cada requerente pagava a importância de 200 Cruzeiros por cada documento.
Zk – Clareira aberta e os lotes negociados e depois?
João Távora – Quando fomos iniciar a cidade, convidamos o Padre Romano que veio de Ji Paraná a pé até a linha 52 e rezou no dia 21 de janeiro de 1980 a 1ª Missa Campal além de colocar a pedra fundamental da futura Matriz de Alvorada.
Zk – Como o INCRA entra na história de Alvorada?
João Távora – Quando fui pra Ji Paraná juntamente com o Toninho Geraldo que era o administrador de Médice visitar o prefeito Assis Canuto, pedi pra ele (Canuto), fazer a vistoria do INCRA em Alvorada e ele ligou pro Doutor Josemar e disseram que haviam feito marcação em Alvorada e eu disse que não. Então fomos conversar com o Josemar eu, Toninho Geraldo, seu Jovelino e o seu Otávio Dourado. Quem é João Távora perguntou o Dr. Josemar, sou eu! O senhor disse pro Dr. Canuto que não fizemos vistoria, você tem certeza? Tenho! Aí vieram os técnicos e após nossa afirmação, foram escaladas duas pessoas para fazer o trabalho. Isso foi em 1.977.
Zk – Qual o seu relacionamento com o governador Jorge Teixeira?
João Távora – O gabinete do Teixeirão era dentro do helicóptero, e o chão que ele gostava de pisar era em cima de tambor de combustível para ser ouvido pelo povo. Ele conhecia todos de Alvorada pelo nome. No dia 22 de abril, ele desceu do helicóptero numa clareira que a gente fez. Fomos lá e me identifiquei e ele então me disse: “Deus guia os pioneiros cacaeiros de caráter, na frente, depois de tudo pronto, o diabo tange os ratos atrás”.
Zk – E a emancipação política aconteceu quando?
João Távora – O Projeto de Lei de emancipação do Município de Alvorada D’Oeste foi de autoria do deputado estadual Gersi Badocha. O município foi criado através da Lei estadual 103, assinada pelo então governador Ângelo Angelim no dia 20 de maio de 1986.
Zk – Criado o município o prefeito eleito e empossado assim como os vereadores! João Távora o idealizador de tudo, foi contemplado pelo menos com uma placa de reconhecimento?
João Távora – Quando o Teixeirão disse que os ratos tomariam conta estava certo. No primeiro mandato veio um pessoal do Sul e tomou conta da cidade por 26 anos, enterraram a cidade, não deixaram Alvorada se desenvolver, só o bolso deles. Tem esse bairro onde moro que o povo colocou o nome de João Távora já tentaram trocar, mas como já existe CEP essas coisas todas, deixaram.
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