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Gente de Opinião

Silvio Santos

O Bigode e o dono do bar do Bigode


O Bigode e o dono do bar do Bigode - Gente de Opinião
 

Meu nome é bonito, mas, prefiro ser chamado de Bigode. Assim o seu Francisco Augusto Freire começou a conversar com a gente, na manhã da última sexta feira 08, em seu estabelecimento comercial conhecido como Bar do “Bigode” que fica a rua Elias Gorayebe com a José Camacho. Solicitamos que ele vestisse uma camisa para que a fotógrafa Ana Célia fizesse as fotos para essa reportagem e quase perdemos a oportunidade de conhecer sua história. “Vou ter que vestir mesmo uma camisa, isso me incomoda”. Na realidade, esse detalhe é tradição cobrada pelos fregueses, tanto que enquanto gravávamos, um freguês chamou a atenção do entrevistado: “Que história é essa de vestir camisa Bigode desse jeito vou embora!”. Percebendo que realmente trata-se de marketing, concordamos que ele ficasse sem a camisa. Foi então que a entrevista fluiu com maior desenvoltura, “Vim do Ceará direto pro garimpo de cassiterita do Jucá”. Aí lembra de quando o governo federal fechou o garimpo manual de cassiterita. “Eles traziam os garimpeiros de caminhão de Ariquemes até Porto Velho e aqui, embarcavam em avião para onde a gente quisesse ir”. O bairro do Mocambo no tempo que Bigode mourou lá, era só festa. “Era tanto dinheiro circulando em Porto Velho que tinha garimpeiro que levava a mulherada pro banho da Torre enterrava dinheiro na areia e mandava elas procurarem, com um detalhe, era todo mundo nu”. Essa e outras histórias, você fica sabendo na entrevista que segue.

E N T R E V I S T A

Zk – Você veio de onde?

Bigode – Vi duma cidade chamada Ererê que fica no interior do Ceará. Saí de casa exatamente no dia 10 de outubro de 1968.

Zk – Qual o motivo da vinda para Rondônia?

Bigode – Garimpo de cassiterita! Na época me disserem e depois comprovei que era verdade, que aqui, em algumas áreas onde tinha a cassiterita, bastava afastar as folhas do chão que encontrava o minério. Meu objetivo era ficar rico extraindo cassiterita.

Zk – Em qual garimpo você trabalhou?

Bigode – Fui direto para o Garimpo do Jucá no setor Pombal. Como era um garimpo que ficava no meio da selva, para se chegar ao minério, era preciso derrubar a árvore cavar uns cinco seis metros de profundidade, de onde se ficava jogando terra pra cima com a pá e ali estava a cassiterita, era duro, mas, se não fosse a malária compensava.

O Bigode e o dono do bar do Bigode - Gente de OpiniãoZk – Fala sobre a incidência da malária no garimpo?

Bigode – Não era fácil não, principalmente pra gente que vinha do nordeste sem nenhuma experiência e o pior, sem orientação sobre como se proteger do carapanã que transmite a maldita malária. Com apenas 17 dias que estava trabalhando no garimpo do Pombal a bicha me pegou e me derrubou, a sorte foi que tinha pegado uma “Catinha” faisqueira como era chamada e mandei o dinheiro pra casa. Foram três anos de malária mal curada.

Zk – Nesse tempo mesmo com a malária retornando de vez em quando, você conseguiu dinheiro suficiente para tocar a vida sem precisar ser empregado?

Bigode – Não vou dizer que não ganhei dinheiro no garimpo. Saí com uma mixariazinha que deu pra passar algum tempo, não deu pra fazer mais porque o governo fechou o garimpo manual de cassiterita.

Zk – Como você avalia o tempo do garimpo manual de cassiterita em Rondônia?

Bigode – Acho que foi o tempo que mais correu dinheiro em Rondônia, principalmente em Porto Velho cidade para onde todos os garimpeiros vinham a procura de diversão, em especial a procura de mulher nos puteiros. Pra você fazer idéia de como o garimpeiro era “besta”. Ele passava uma vida tirando cassiterita e em apenas uma noite gastava tudo com as mulheres. Teve caso de garimpeiro que levava as putas pro banho conhecido como “Torre”, que ficava pro lado do Areia Branca onde hoje funciona o “Papo de Esquina” (Balneário), enterrava dinheiro na areia e mandava a mulherada pelada procurar. Era aquela algazarra de mulher se rolando nua pela areia e o garimpeiro, também nu, assim como seus colegas, com um charuto na boca e um chapéu panamá na cabeça apreciando. Outra! Esse negócio de troco de Dez Cruzeiros e até de Cinquenta, ficava pro motorista de táxis. Naquele tempo dinheiro em Porto Velho era que nem folha caindo no outono. Aí veio a portaria e acabou com tudo.

Zk – Vamos falar do fechamento do garimpo manual de cassiterita. Da famosa Portaria?

Bigode – No dia 31 de março de 1971 saiu uma ordem dizendo que o garimpo manual de cassiterita estava proibido em Rondônia, acho que em todo o Brasil. Os garimpeiros de cassiterita cuja maior concentração era na região de Ariquemes eram trazidos para Porto Velho e aqui eram embarcados em avião da FAB e levados para seus estados de origem, quem quisesse podia ficar.

Zk – E você ficou?

Bigode – Eu e mais sete companheiros fretamos dois aviões do Maione e fomos pra Guajará Mirim, acontece que a maioria dos companheiros era de Guajará Mirim da Colônia do Iata. Ficamos por lá uns cinco seis dias e depois viemos pra Porto Velho.

Zk – O garimpo do Jucá ficava em qual região?

Bigode – Ficava onde hoje é o Campo Novo. Tinha duas pistas de pouso, Campo Novo e outra no local que ficou co0nhecido como Irã Iraque. A gente vendia o minério pra Civa e para a Minérios de Rondônia que era do Jucá.

Zk – Agora vamos falar sobre sua vida pós garimpo?

Bigode – Vim pra Porto Velho e como diz o peão, fiquei rodado, sem emprego. Lembro que fui ao palácio do governo atrás de conseguir emprego e um cidadão meu deu um papel, me mandou ir até um escritório que ficava na rua Natanael de Albuquerque e de lá me mandaram pro 5 º BEC onde fiquei trabalhando como braçal no setor de máquinas pesadas. Depois fui trabalhar na CIB na construção da BR-364 no Acre.

Zk – Como era esse trabalho?

Bigode – A BR-364 entre Rio Branco e Sena Madureira era dos piores trechos, se um sapo mijasse virava atoleiro, dizem que até hoje é assim. Foi lá que virei gente. Acontece que quando terminamos o serviço no Acre viemos para BR 319 essa que era para ligar Porto Velho a Manaus. Nossa equipe era baseada no entroncamento da rodovia de Lábrea com a 319, era um trabalho sofrido a gente pegava das 6 da manhã até as 10 da noite, nesse tempo eu já era meloso (responsável pelo abastecimento e lubrificação das máquinas).

Zk – E quando foi que decidiu fixar residência em Porto Velho?

Bigode – Primeiro foi em 1973 quando botei comércio na rua Guanabara com a Afonso Pena onde abri comercio em dezembro de 73, vendi e fui rever meus parentes no Ceará depois de 8 anos por aqui.

Zk – Na volta?

Bigode – Tina um dinheirinho que emprestei a juros e fiquei tocando a vida, em março de 1977 fixei residência permanente em Porto Velho e fui morar no Mocambo na pensão do seu Raul que ficava bem ao lado da casa do Chico Preto famoso por colar banca de jogo nos arraiais e pela venda de carneiro.

Zk – Como era a vida no Mocambo?

Bigode – O Mocambo pra mim era nota dez. Na minha época era festa o ano todinho ao lado do cemitério, não tinha briga, não tinha maconha. Tinha o Antônio do Violão a pensão da dona Guiomar pioneira que merece ser mais ouvida pelas nossas autoridades. Esse “vagabundo” do Hokney fica dizendo que naquele tempo eu namorava a Boneca o que não é verdade. O Hokney é meu amigo e gosta de fazer essas brincadeiras.

Zk – Você frequentava os clubes sociais da época tipo Imperial, Danúbio

Zk – Eu gostava de festa. Se você me perguntar quais os puteiros que frequentei vou falar da Mãe Preta, Tambaqui de Ouro, Tatá. Chegava por ali onde se formava a "muvuca” que era o canto da Marechal Deodoro com a Afonso Pena tomava um cafezinho ou um mingau no Dega e partia para a conquista. Um forró que gostava de frequentar era o do Januária que ficava na Sete de Setembro com a Salgado Filho, frequentei muito a Taba do Cacique e tantas outras casas noturnas.

Zk – No tempo que essas casas funcionavam os boêmios, costumavam ser bancados pelas mulheres. Você chegou a ser gigolô?

Bigode – Em Porto Velho não. Fui no tempo do garimpo, quando adoeci e fiquei sem poder trabalhar, vivia por conta de uma mulher a Cacilda uma morena acreana, veja bem ela não me sustentava apenas saia comigo de graça, passamos uns três anos enrolados a outra era a Maria Conhaque o nome já diz tudo, isso no garimpo na cidade não.

Zk – Como foi que você veio parar nesse ponto da José Camacho com a Elias Gorayebe que ficou famoso como a Calçada da Fama?

Bigode – Foi o seguinte: em 1981fui minha segunda viagem pro Ceará e quando voltei aluguei o ponto ali da frente, depois de 7 anos resolvi montar comércio no bairro Novo Horizonte que estava começando como Cidade do Lobo e lá o negócio estava muito devagar aí o Coelho muito meu amigo chegou comigo e disse: “Bigode tu vai se acabar aqui na Cidade do Lobo, vai lá pro meu ponto, tu não vai pagar nada”. Esse Ponto é aquele ali em frente só que do outro lado do primeiro que montei aqui. Com a chegada do asfalto o Coelho resolveu montar o armarinho dele e eu tive que sair e no dia 15 de agosto de 1992.

Zk – Esposa?

Bigode – Há 34 anos vivo com a Nilda e temos três filhos, dois homem e uma mulher.

Zk – E a Calçada da Fama como surgiu?:

Bigode – Isso aí foi muito bom, o Doutor Samuel Castiel me deu uma forma muito grande ao montar aqui no meu estabelecimento o Programa de Rádio que reunia toda tarde sábado a boemia de Porto Velho. O Hokney ajudou muito também. Depois o negócio pegou de vez e passou a reunir os boêmios no meio da semana. Meu amigo saudoso Colombo e seu violão, vinha pra toda sexta feira e ficava tocando até enjoar e os boêmios cantando, ele não cobrava nada pra animar a festa, tinha também o Genésio da Guitarra só que ele cobrava cachê mas, era muito bom e aos sábados depois do meio dia o Samuel montava o equipamento e fazia o seu programa que era transmitido pela rádio Transamazônica direto da “Caçada da Fama no Bar do Bigode”, isso aqui ficava repleto de gente, era gente até pelo meio da rua.

Zk – A turma diz que você é ignorante. É verdade?

Bigode – Sou mesmo! Se me tratarem mal sou ignorante, se me tratar decente sou decente. A prova de que o pessoal gosta do meu atendimento é a frequência é a freguesia que vem aqui é tido gente boa, são empresários, comerciantes, profissio9nais liberais que inclusive trazem suas esposas e filhos. Tenho freguês que frequenta meu comercio a mais de trinta anos. Como é que sou ignorante! Isso é lenda, é conversa pra boi dormir. Tem um detalhe:

Zk – Qual?

Bigode – Pé de cana não frequenta o meu bar porque não dou guarida a esse tipo de gente, não sou chegado a cara que fica “serrando”. Aqui todo mundo é amigo!

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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