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Silvio Santos

Pagamento de promessa a Santa Luzia dá nome à cidade em Rondônia


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O município de Santa Luzia D’Oeste, que completou 28 anos de emancipação político e administrativa domingo último (11), teve como primeiro nome “Vila Bambu”. O povoado surgiu com o início do movimento de migração interna de colonos do Projeto Integrado de Colonização Rolim de Moura em direção ao Vale do Guaporé.

Em busca de novas terras, os colonos se fixaram em 1978, no cruzamento da Linha 184 com a Linha 45, dando origem ao Núcleo Urbano de Apoio Rural “Vila Bambu”. Mais tarde o povoado seria rebatizado de Santa Luzia pelo então governador Jorge Teixeira de Oliveira em homenagem à Santa protetora dos olhos e que o curara de um “problema de visão”.

Logo o então distrito de Rolim de Moura foi elevado à categoria de ,município com o nome de Santa Luzia D’Oeste pela Lei Estadual n° 100, de 11 de maio de 1986.

A equipe de reportagem do projeto do Departamento de Comunicação (Decom), “Pioneiros – A História de Todos Nós”, entrevistou pioneiros que recontam importantes fatos do processo de colonização da região.

O primeiro prefeito de Santa Luzia, Pedro Lima Paz, é um deles. Segundo Paz, existem os que vieram para Rondônia apenas especular. Esses se deram mal e voltaram para suas terras. Vieram os que queriam apenas conhecer e vieram os que queriam realmente contribuir com o desenvolvimento e aproveitar as terras férteis da região.
 

Decom – Como foi que o senhor veio parar em Rondônia?

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Pedro Lima – Era agricultor no interior de São Paulo e viajei como caminhoneiro de 1977 até 1980. De Cuiabá (MT) a Rio Branco (AC) não existia asfalto. Sempre na procura de um local onde a terra fosse fértil. Aí tivemos a informação de que nessa região a terra era das melhores.

Ele conta ainda que desembarcou na antiga “Vila Bambu”, no dia 10 de maio de 1980 e desde então tudo o que tem feito é trabalhar pelo progresso do estado de Rondônia. Em especial pela região de Santa Luzia, conhecida também como Zona da Mata, onde já exerceu dois mandatos de prefeito e um de deputado estadual.

Decom – O senhor diz que chegou aqui solteiro, queimando lata e casou com quem? Ela é rondoniense?

Pedro Lima – Ela é mineira. Veio para cá com 3 anos de idade. Eu solteiro, prefeito, quando estava faltando seis meses para terminar o mandato eu já estava namorando com ela e casei. O nome dela é Mara Santos Silva Paz. Estamos com 25 anos de casados temos três filhos. Casei com 39 anos de idade, perdi esse tempão todo porque tinha medo de casamento. Sou católico.

Decom – O senhor tem ideia por que o governador Jorge Teixeira escolheu o nome Santa Luzia?

Pedro Lima – Ele chegou a “Vila Bambu”, reuniu todo mundo e disse que ali seria erguida a cidade de Santa Luzia, explicando que era uma forma de pagar sua promessa com Santa Luzia que o curara de uma doença na visão. “Então como a terra é fértil vou colocar o nome de Santa Luzia”. Lembra outra justificativa de Jorge Teixeira, no local onde escolheu para morar e onde abriu um comerciozinho na expectativa de arrumar um pedaço de terra.

De Rolim de Moura vinha uma firma tirar madeira, naquele tempo tinha muito mogno e cerejeira na região e eles vieram lá de Vilhena. O madeireiro chamava-se Arlindo Ribelato que vinha trazendo um trator de esteira em cima de um caminhão e nós viemos acompanhando, vinha outra serraria em cima de um FNM. De vez em quando eles desciam a esteira faziam um aterrozinho, fazia uma ponte. Batemos mais dois dias e meio pra chegar a Vila Bambu.

Decom – A conversa tá ficando boa…

Pedro Lima – Vai ficar melhor. Aí fiz a primeira casa coberta com telhas de amianto e de madeira trabalhada. Naquele tempo as casas eram de pau a pique. Assim fui tocando. Muita gente fazia “marcação”, uma espécie de “grilo” (invasão), tenho marcação perto de Nova Brasilândia na 138. A gente ia de Santa Luzia a pé pela picada de 62 km, e arrumamos dez lotes, fizemos a derrubada e veio o Incra cortando. A linha 45 deu fora do eixo e nós perdemos a metade das marcações, de dez lotes de 42 alqueires ficamos com dez de 21. Em 1984/85 fui dando lote pra um, lote pra outro, para o pessoal que vinha do Paraná e Espirito Santo.

Decom – e o senhor veio de onde?

Pedro Lima – Vim do interior de São Paulo, cidade de Mequerobi. Santa Luzia era distrito de Cacoal e na eleição de 1982 eu indiquei o vice-prefeito de lá. Eles queriam que eu saísse, pois souberam que tinha sido vereador e presidente da Câmara na minha cidade. Não aceitei porque vim pra cá sozinho, solteiro e, naquela época, tinha muito bandido, pistoleiro matador de gente. Então pensei, não vou mexer com política e indiquei o gaúcho Carlito Duarte, que ajudou o Josino Brito a vencer a eleição. Ele estava perdendo para o Dr. Adegildo e quando abriram as urnas da Vila Bambu, o Josino obteve 280 votos, ultrapassando  o seu concorrente.

Decom – A politica então passou a fazer parte da sua vida em Rondônia?

Pedro Lima – Adegildo foi eleito prefeito de Cacoal e o vice foi o candidato de Santa Luzia. Em 1983, Rolim de Moura foi emancipado e Santa Luzia passou a ser distrito de Rolim. Em 1984 fui candidato a vereador por Rolim junto com o Valdir Raupp. Fiquei como primeiro suplente, assumi como vereador por um determinado tempo, até que aconteceu a emancipação de Santa Luzia.

Decom – Município de Santa Luzia d’Oeste?

Pedro Lima – A emancipação foi no dia 11 de maio de 1986. Fui candidato a prefeito, éramos cinco candidatos. Fui o mais votado e assumi a prefeitura. O mandato era de apenas dois anos de 86 a 88 para igualar o mandato com os demais municípios.

Decom – Fez o que pelo município?

Pedro Lima – Abri estradas, construi hospital, colégio, rodoviária, posto de saúde. Quando terminou meu mandato fui plantar café. Era cerealista, descapitalizei, tive que ir trabalhar na roça. Quando foi em 1990 chegou o senador Olavo Pires, que queria lançar um candidato a deputado estadual. Foi atrás de mim. Eu não queria, mas como ele insistiu muito, aceitei sair candidato para ajudar. Resultado, naquela eleição a Zona da Mata só elegeu um candidato a deputado estadual que fui eu.

Decom – E o segundo mandato de prefeito?

Pedro Lima – Cumpri meu mandato de deputado e não sai à reeleição. Voltei a cuidar da minha lavoura, estava sossegado quando em 1996 me procuraram para sair candidato a prefeito de Santa Luzia. Fui novamente o mais votado e fiquei até o ano de 2000. Se eu não pude fazer tudo, fiz tudo aquilo que pude pelo município. Devo tudo isso ao povo, porque sozinho ninguém chega lá.

Decom – Na criação de Santa Luzia quem estava com o senhor, quem lhe apoiava?

Pedro Lima – Criamos uma comissão de apoio para lutar pela emancipação de Santa Luzia e aí gera aquela ciumeira. Um daqui outro de lá, até meu compadre Dego saiu vice de um homem, um cabra não confiável, que dizia que ele era que tinha emancipado. Quem emancipou foi o povo. Eu costumo dizer: de não tivesse gente lá, nós não tínhamos como fazer. O progresso quem trás é o povo.

Decom – O que o levou a se desiludir da política?

Pedro Lima – Essas mazelas, esses trem aí vão descontentando. A pior coisa hoje em dia que se tem pra fazer, é pedir voto e pedir prenda pra igreja católica. Você vai pedir voto, dizem logo: Lá vem um vagabundo, as vezes recebe pra não perder o cliente. Tudo isso me desestimulou de continuar na militância política.

Decom – No começo o que Santa Luzia produzia?

Pedro Lima – Feijão, arroz, milho e madeira. A economia na época era isso aí. Eu sempre dizia em 1980, daqui a dez anos vamos ter estrada, energia e escola. Não demorou um ano e o Teixeirão desceu de helicóptero numa pequena abertura que fizemos no meio da mata e falou: “Vim aqui pra dizer que vou mandar vir um topógrafo lá de Cacoal pra vocês escolherem uma quadra pra fazer um colégio que vai se chamar JK, escolher uma área pra vocês construírem uma igreja e uma praça para a Teleron. E já vou abrir estrada”.

Na frente tinha um dormitório e dias depois chega um mineiro dizendo que viera instalar a torre da antena. No dia seguinte, quando estava indo ao banco em Cacoal, vi em Rolim de Moura, na 25, as máquinas estavam começando o trabalho e a topografia em poucos dias chegou em Santa Luzia,. Foi muito rápido.

Decom – Quem foi o primeiro administrador nomeado pelo Teixeirão?

Pedro Lima – Foi Catarino Cardoso. Era “quatro por quatro” a reserva do município no perímetro urbano. A administração de Cacoal mandou tirar madeira para construir a escola e roubaram os mognos. A administração de Cacoal vendeu tudo pros madeireiros e nós ficamos com as cascas. Aí o Teixeirão trouxe o Catarino Cardoso que abriu mais ruas, entregou data (terreno), fez muito. Depois veio o Lair Laurindo e mais tarde o Valdir Roberto.

Decom– E o caso daquele cidadão que queria por que queria ser administrador?

Decom – Quando o Ângelo Angelim assumiu o governo em 1985, ficou aquele impasse: quem põe, quem não põe, para ser o administrador de Santa Luzia. Tinha um tal de Cesar Cassol que queria ser o administrador. O Valdir Raupp era governador e eu, Miguel Pioneiro, o Marcão, que era suplente de vereador, fomos falar com o Raupp que disse: “Vocês tão ficando doido, colocar esse homem lá, vamos criar cobra pra nos morder”. Eu falei: Valdir, diz ele que é da cozinha do Angelim, o pai dele e ele. Quem sabe ele pode conseguir alguma coisa para Santa Luzia. O Raupp então respondeu: “Se vocês querem vamos colocar. Se não der certo, a gente tira”. Não deu outra, quando emancipou foi contra mim. Sempre digo, não tenho nada contra ele, é trabalhador. “Agora, o dia que você me vê abraçado com ele, é briga e tem que apartar.

Pedro Lima – Promovia festas com músicas folclóricas, fiz o estádio, promovia torneios de futebol. Promovia as festa no aniversário da cidade, 7 de Setembro, compramos os instrumentos e montamos a fanfarra, apoiava o festival de música sertaneja. Depois que deixei a prefeitura o povo não teve mais interesse, não fez mais nenhuma festa. Lembro da festa dos estados que era muito bonita com desfile de carro de boi, rainha da madeira e tanta coisa bonita. Já falei pra esse prefeito que está aí, vamos resgatar as festas a nossa cultura, não sei, parece que ninguém tem interesse.

Decom – As pessoas  davam valor à terra?

Pedro Lima – Não davam muito valor. Mas eu sempre falava, vamos segurar os lotes. Vi um companheiro trocar um lote de 42 alqueires por um toca fita e um relógio, eu quase surrei ele. Briguei mesmo e ele dizia: “eu ganhei isso do Incra rapaz, não custa nada, vou pra frente e ganho outro lote. Quem veio com dinheiro se quebrou, voltou para trás. Aquele que veio sem condições, não tinha como voltar e tinha que ficar. Esses hoje estão bem, têm terra, fazenda, tem casa, tem gado. Eu cheguei a prevê: a madeira vai acabar, a lavoura vai indo e fracassa e o que vai prevalecer é a pecuária. Eu sempre fui formador de opinião e dizia, o lema aqui é arrumar terra. Vamos derrubar e plantar o pasto, cercar, depois faz o curral pois vai chegar a época que nós não vamos derrubar, quem derrubou, derrubou, quem não derrubou não derruba mais. Essa época estamos vivendo agora.

Decom – Tem uma história por aí do produtor que foi homenageado pelo Teixeirão. Como foi essa homenagem?

Pedro Lima – Tenho um amigo por nome Taboca que derrubou os 42 alqueires e disse ao Teixeirão: “olha eu derrubei, plantei café, seringa e cacau. Agora não tenho mais terra”. O então governador mandou o pessoal do Incra dar 300 hectares a ele, próximo de Alto Alegre, um município que ainda não existia na época e ainda deu uma medalha para ele como incentivo.

Decom – A história de madeira de lei abundante era real? O senhor chegou a botar serraria?

Pedro Lima – Nunca coloquei serraria. Fui um homem nesse lado meio sem sorte. Eu nuca vendi madeira, as terras que eu arrumei lá em Brasilândia não tinha mogno e nem cerejeira, só tinha madeira sem valor e as terras que eu comprava, geralmente já tinham sido explorada. Vinha aqueles aventureiros e eu falava pra eles; gente, vocês estão vendo, esse povo que está aqui explorando, não é o verdadeiro dono. O dono está vindo. Nós viemos fazer caminho para eles passarem e a cama para eles dormirem. Hoje estã aí o alqueire valendo R$ 25 mil. O p\sto está cheio de gado. Todo mundo é pecuarista, o professor, o funcionário do fórum, o trabalhador da prefeitura, prefeito, vice-prefeito, vereador são todos pecuaristas porque usaram a cabeça. 

Decom – Para encerrar essa nossa conversa. Deixe sua mensagem para a juventude?

Pedro Lima – Quero parabenizar todos os munícipes, pessoas trabalhadoras. Sempre digo: Pra Rondônia ficar mais bonita só depende de nós, do nosso trabalho e da nossa honestidade. Para Santa Luzia desejo Parabéns!

Pioneiro abriu primeira farmácia com 30 mil contos

Valdivino, “Dego”, acompanhou a equipe do Decom desde a chegada ao município de Santa Luzia e não parava de lembrar: “vocês não podem ir embora, sem antes ouvir o seu Miguel Amâncio. Ele foi um dos primeiros a chegar na antiga Vila Bambu e abriu uma farmácia. A história dele é muito bonita”. Miguel contou sua história, desde os tempos que saiu da cidade cearense de Iguatu e foi para São Paulo, depois Mato Grosso (MS) e finalmente Rondônia. “Cheguei a Ouro Preto d’Oeste em 1972 e o responsável pelo PIC disse que lá não tinha mais terra. Mas que estavam abrindo o PIC Gy Paraná, no seringal Cacaual, perto de Pimenta Bueno e que se eu quisesse podia fazer a inscrição ali mesmo”.

Amâncio não fez a inscrição porque não tinha resolvido sua vida em Mato Grosso. Mais tarde retornou a Rondônia e dessa vez com toda família. Embora tivesse comprado terra na Vila de Rondônia (Ji Paraná), ao passar por Cacaual resolveu ficar. Já em 1979 se separou da mulher e enfrentou o picadão com cacaio nas costas, no rumo da Vila Bambu, onde iniciou o negócio que passaria a ser a primeira farmácia de Santa Luzia. Durante a entrevista, as lágrimas escorreram de seus olhos várias vezes, lembrando de como foi duro mas, gratificante, cooperar com o surgimento do município de Santa Luzia.

Decom– quem é o pioneiro e primeiro farmacêutico da antiga Vila Bambu?

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Miguel Amâncio – Sou Miguel Amâncio de Souza nasci no dia 18 de fevereiro de 1927, na cidade de Iguatu no estado do Ceará. Do Ceará fui pra São Paulo, Mato Grosso (do Sul) e Rondônia.

Decom – Quando e por que o senhor veio para Rondônia?

Miguel Amâncio – Fiquei em Mato Grosso do Sul por 16 anos, ganhei algumas “coisinhas”, perdi e resolvi vir pra Rondônia porque tinha aquele apelo do governo federal, que prometia 100 hectares de terra. Era o ano de 1972. Cheguei lá em Ouro Preto do Oeste, falei com o coordenador. Na realidade, o coordenador mesmo, Assis Canuto estava em Porto Velho e quem me atendeu foi o responsável pelo PIC Ouro Preto que disse: “Aqui não tem mais terra, mas, em Pimenta Bueno tá abrindo o PIC Gy Paraná na região do Seringal Cacaual, se você quiser, pode fazer inscrição aqui e vai ganhar o lote lá”. Respondi, eu não quero fazer, mas, meu cunhado e mais uns três amigos que vieram comigo querem.

Decom – Por que o senhor não quis fazer a inscrição?

Miguel Amâncio – Não quis, porque não tinha terminado ainda meus acertos lá em Mato Grosso. Tinha que voltar para terminar a venda de um lote de terra que tinha e projetar a mudança da família para Rondônia, meu plano era Ji-Paraná.

Decom – Por que Ji Paraná?

Miguel Amâncio – Porque não existia outra cidade, Cacoal ainda não existia, só tinha o Projeto do Incra. Nessa volta demorei três dias de Fátima do Sul até Vila Rondônia (ainda não era Ji Paraná) em carro próprio. Isso foi em 1973. Primeiro vim sozinho e comprei um terreno na Vila Jotão que estava começando a ser aberta. Quando voltei daí, já com a mudança, parei em Cacoal e era aquele burburinho estavam invadindo tudo, cada um marcando uma data e achei melhor ficar por ali, porque naquele tempo a Vila Jotão era muito baixa, hoje tá uma maravilha. Mas naquela época era muito alagada. Para atravessar do Jotão para a Vila de Rondônia era muita lama, não gostando, resolvi ficar em Cacoal.

Fazendo o que?

Miguel Amâncio – Montei uma farmácia e fiquei trabalhando em Cacoal, era muito bom, passaram dois administradores, um era militar e, civil nunca se une com militar, é como cachorro com gato. Aquele militar começou com muita exigência, fiquei por ali, ganhei um pouquinho de dinheiro. Depois nomearam Catarino Cardoso como administrador distrital, Cacoal era distrito de Porto Velho. Naquele tempo só tinha dois municípios, Porto Velho e Guajará-Mirim. Com o pouco dinheiro que ganhei, consegui um lote e comecei a carregar um cacaio até o lote que era na beira da BR perto de Presidente Médici. Mas, era uma invasão cheia de problema, Zé Milton Rios era o seringalista mandão, até umas mortes andaram acontecendo. Graças a Deus eu não estava no meio. O pessoal de Médici andou agindo por lá. Então em 1979 separei da família. Eu me transferi para essa região que hoje é Santa Luzia. Deixei as propriedades, a farmácia e três salões na 7 de Setembro lá em Cacoal tudo para a mulher e os cinco filhos, dos quais três, duas mulheres e um homem já estavam casados. Era um projeto que tinha com a mulher desde quando morávamos em Mato Grosso do Sul de nos separarmos assim que os filhos estivessem criados. Naquele tempo estavam abrindo a Vila Bambu, ainda não era Santa Luzia.

Decom – O senhor lembra o dia que chegou  a Vila Bambu?

Miguel Amâncio – Cheguei a Vila Bambu, no dia 8 de fevereiro de 1980, onde só tinha o boteco do Paulo Rodrigues – Paulão – e  botecozinho. Não havia estrada, era carreador entre os lotes. Aqui era um projeto de 4 km por 4 km para uma futura cidade que o Incra reservou. Então peguei 36 contos (mil antigos) de remédio da farmácia em Cacoal e disse: vou abrir uma farmácia lá na Vila Bambu. Combinei com a “finada” (ex-mulher): Se eu ganhar dinheiro lá, venho pagar isso aqui, quero 30 dias. Se não der certo, devolvo os remédios e vou pro lote lá no Muqui. Chegando aqui aluguei um barraco de pau a pique, passado 30 dias voltei lá e paguei os 36 contos. Felizmente tinha muita madeira, Mogno aqui era uma mina, entrou uma firma pra tirar madeira e lotou de gente, aumentei a farmácia, fui trabalhando, deu tudo certinho. Não tinha estrada para Rolim de Moura carreguei cacaio nas costas indo a pé pra Rolim, tinha um carreador, mas, não tinha ônibus nem nada.

Decom  – O senhor casou de novo?

Miguel Amâncio – Casei com a dona Abdael Almeida de Souza temos os filhos: Miguel Amâncio de Souza Filho e a Rosimeire Amâncio de Souza Machado.

Decom – Quando foi que o Teixeirão resolveu investir na Vila Bambu?

Miguel Amâncio – Teixeirão chegou aqui um dia, ali era muito homem, um gaúcho que tinha qualidade, tenho saudade dele. Ele chegou reuniu o povo e disse: “Olha gente, assumi o governo de Rondônia e estou vendo que está tudo por fazer, mas vamos abrir a boca e dizer: somos rondonienses”.

Lembro como se fosse hoje, ele disse: “Quero trabalho, trabalho e trabalho eu garanto a vocês que vou trabalhar. No dia 7 de agosto, prosseguiu Teixeirão, lá na beira do rio Anta o trator vai berrar, começando a abrir a estrada”. Isso era o mês de abril daquele ano e disse mais, “Rolim de Moura será um polo muito importante para essa região, as ruas e avenidas terão 100 metros de largura. Vai ser realmente a referência da região”. Quando foi no dia 7 de agosto, um trator D-7 chegou e derrubou um Ipê grande em cima daquela serra e começou a abrir a estrada, foi uma riqueza os anos que o Teixeirão trabalhou aqui, ele foi incansável, ele visitava, não vinha com policial atrás dele não, era aquele bonezinho na cabeça, uns três companheiros, conversando com as pessoas, como nós estamos conversando aqui. A situação foi melhorando para todo mundo e começaram a falar na transformação do Distrito em Município, o estado precisa crescer e para isso era preciso ter mais municípios.

Decom– E como foi que a Vila Bambu passou a se chamar Santa Luzia?

Miguel Amâncio – Zé Perdido e outro companheiro dele se perderam na mata da região e não tinha jeito. Ficaram dois dias no mato e então fizeram uma promessa com Santa Luzia: “se Deus abençoasse que se eles saíssem na 45 que era a Linha mestra, pela qual conseguiram chegar a qualquer propriedade, iriam pedir para o Teixeirão mudar de Vila Bambu para Santa Luzia”.

Dizem também que o Coronel Teixeira tinha recebido uma “graça’” de Santa Luzia por um problema em sua visão e por isso colocou o nome da Santa na cidade.

Decom– Quem foi o primeiro administrador de Santa Luzia?

Miguel Amâncio – Foi Valdir Roberto, depois veio o Catarino Cardoso. Quando aconteceu a primeira eleição para prefeito, o povo elegeu o Pedro Lima que foi um bom prefeito, um cabra muito trabalhador de muita garra, honesto.

Decom – Como o senhor se sente ao ter participado da criação de Santa Luzia hoje uma cidade bonita, próspera?

Miguel Amâncio – Sinto muito prazer, apesar de hoje não ter mais força para nada, não ter mais saúde, mas me sinto satisfeito de ter ajudado, entrei com o espirito de progredir. Meus filhos que moram em Cacoal me chamam para morar lá, mas eu não vou. Não vou porque gosto de Santa Luzia.

Decom – Para encerrar esse nosso bate papo e em homenagem ao aniversário de 28 anos da emancipação de Santa Luzia que foi festejado dia 11 de maio, gostaria que o senhor deixasse uma mensagem à juventude da cidade. Pode ser?

Miguel Amâncio – No momento a gente fica meio assim “apertado” para dar uma mensagem, que poderia futuramente servir muito pra eles, nós estamos numa época muito difícil para a juventude. Eu diria o seguinte: Que esses que estão aí, que chegaram depois de mim (muito emocionado), evitassem os horrores da criminalidade que existe, as drogas, as enfermidades que estão matando o povo. Eu gosto do meu Brasil, gosto de Santa Luzia.

 Zé Mineiro quase perde inscrição feita no Paraná

“Quer assistir uma Folia de Reis de Verdade vem aqui no fim do ano”. Com 79 anos incompletos, foi assim que Zé Mineiro recebeu a equipe de reportagem do Decom e contou toda a trajetória de sua vida desde quando chegou em Rondônia em 1977 e desembarcou no acampamento que futuramente se transformaria no município de Cacoal. O Incra de Cascavel (PR) havia reservado três lotes de terra em Rondônia e quando cheguei no órgão em Cacoal queriam cancelar o documento de inscrição.

Gente de Opinião

Decom – Fale sobre onde o senhor nasceu e por que veio para Rondônia?

Zé Mineiro – Sou mineiro, nasci no dia 02 de julho de 1935 em São Domingos de Araçuaí, e fui para Teófilo Otoni onde me criei. Trabalhei com boiada, com tropa, passei muito tormento. Em 1960 me casei e então fui para o Paraná onde morei 17 anos e não consegui uma terra pra trabalhar, viver a vida e criar meus filhos. O destino quis e eu vim pra Rondônia. Meu nome completo é José Gonçalves de Abreu, mas pode me chamar de “Zé Mineiro”.

Decom– Em qual ano o senhor veio para Rondônia?

Zé Mineiro – Era 1977 quando ainda não existia estrada, os coitados dos motoristas levavam até 60 dias viajando de Cuiabá a Porto Velho. Quando aqui cheguei, vamos voltar um pouco.

Decom – Pra onde?

Zé Mineiro – O Incra de Cascavel (PR) me deu três lotes de terra aqui em Rondônia. Quando cheguei, o Incra de Cacoal começou a “dar pra trás comigo” e durante uma discussão eles falaram que iriam cassar meu “mandato” (documento que trouxe de Cascavel), acontece que eu tinha uma amizade muito grande no Paraná e quando ficaram sabendo que o pessoal de Cacoal estava querendo cassar o meu documento, ligaram e disseram: “Vocês nem sabem com quem estão mexendo, esse homem é analfabeto mas, é uma grande autoridade nossa”. Aí eu vim e comprei uma marcação (lote de terra) que fica na Linha 92. No primeiro ano colhi 800 sacas de arroz e exportei tudo para Manaus.

Decom –  Nesse tempo essa marcação ficava em Santa Luzia, Cacoal ou Costa Marques?

Zé Mineiro – Não ficava em nada, porque não existia nada, era tudo mato. A gente veio acompanhando a estradinha do Incra lá de Pimenta Bueno até determinado local perto dessa área que hoje é Rolim de Moura, dali a gente botava o cacaio nas costas e entrava na mata no rumo da marcação de cada um.

Decom– O que vinha no cacaio?

Zé Mineiro – Comida, cobertinha pra dormir e as ferramentas. A espingarda não podia faltar, pois através dela a gente conseguia o alimento que chamamos de mistura, que era carne de caça de todo jeito. Para o senhor fazer ideia, quando uma pessoa adoecia a gente colocava dentro da rede e levava a pé até Rolim de Moura onde o doente embarcava numa camionete e seguia para tratamento em Cacoal.

Decom – Quem era o médico?

Zé Mineiro – O doutor Adegildo e o doutor Ramiro era quem atendia em Cacoal. Esses dois médicos atendiam todos os cacaeiros da região. Naquele tempo a Malária era a pior doença, muita gente morreu de malária e hepatite.

Decom – O senhor pegou malária?

Zé Mineiro – Estou com toda essa idade – 79 anos – e não conheço o que é malária graças a Deus. Dos meus filhos só um pegou malária porque não ouviu meu conselho. Malária não pega em todo mundo. Naquela época para não pegar malária eu misturava a fruta da Santa Inácia com a Jurubeba e de manhãzinha tomava uma talagada daquela mistura,

Decom – O senhor é benzedor?

Zé Mineiro – Rezo em criança, para picada de cobra também e outras coisas, esse trabalho é realizado graças às bênçãos de Deus. Ainda hoje se eu estiver com saúde rezo nas pessoas, uso nessas benzeduras a planta conhecida como Vassourinha de Nossa Senhora. Você quer saber qual a oração que faço durante a reza! Isso é segredo, se eu disser quebra o encanto, agora eu não tenho poder de curar ninguém, quem cura é Deus.

Decom – Agora gostaríamos que o senhor falasse sobre a implantação do município de Santa Luzia. Conhece essa história?

Zé Mineiro – Quem registrou isso aqui foi o finado Teixeirão, depois colocaram um cidadão lá de Cacoal que não lembro o nome agora, para administrar o município. O primeiro prefeito eleito de Santa Luzia foi o Pedro Lima ele foi tão bom que foi prefeito por duas vezes, ele realmente fez Santa Luzia. Depois vieram outros. Graças a Deus hoje Santa Luzia está de parabéns, porque as pessoas que assumiram a prefeitura fizeram por merecer, inclusive esse que esta no poder agora. Aliás, quando o Jurandir (atual prefeito), era policial, eu gostava muito do trabalho que ele fazia com as crianças, criou a Guarda Mirim e a população quando tinha festa, aplaudia o desfile da Guarda Mirim.

Decom– Hoje o senhor planta o que no seu sítio?

Zé Mineiro – Comecei cultivando café, tinha 18 mil pés de café, com isso fui preparando as coisas, comprei terra para os filhos, comprei casa, mas, você sabe, filho não dá valor, jogou fora, mas, estamos vivendo.

Decom/– O que o senhor lembra da formação da história de Santa Luzia?

Zé Mineiro – Aqui teve muito sofrimento.  Era muito difícil,  principalmente a saúde e em segundo lugar a educação. Para estruturar a cidade deu trabalho, porque os governadores priorizavam as cidades mais desenvolvidas, por  exemplo, tudo que se produzia aqui ia pra Rolim de Moura e a nossa cidade foi ficando em segundo plano.

Decom – Santa Luzia está completando neste dia 11 de maio deste ano de 2014, 28 anos de emancipação política. O que o senhor tem a dizer sobre mais um ano do município que o senhor ajudou a implantar?

Zé Mineiro – Me sinto muito animado porque o povo deu valor a Santa Luzia. Santa Luzia é o que é hoje, graças aos cacaeiros e aos migrantes que vieram e valorizaram a terra. Esse progresso (com raríssimas exceções) também é graças aos prefeitos que administraram o município inclusive o atual.

Decom/Sms– O senhor é casado?

Zé Mineiro – Sou casado há 58 anos com a dona Geralda. Tivemos onze filhos, mais de 30 netos e quase 20 bisnetos.

Decom– Para encerrar nossa conversa?

Zé Mineiro – Fiquei muito contente com a entrevista porque isso é uma coisa que é preciso, nós que já somos idosos, passar o que conhecemos, nossa experiência de vida e a história para os jovens. Afinal de contas, construímos a casa para eles morarem. Parabéns Santa Luzia!


Fonte
Texto: Silvio M. Santos
Fotos: Conhecer.tur.br/Robson Paiva/Contra-regra Nil
Decom - Governo de Rondônia

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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