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Silvio Santos

Raimunda Santana: A marreteira do baixo Madeira


Raimunda Santana: A marreteira do baixo Madeira - Gente de Opinião

No inicio deste mês, precisamente entre os dias 6 e 7, estivemos cobrindo os festejos de São Pedro no distrito de Nazaré no baixo Madeira. A localidade de Nazaré é considerada a cidade mais cultural do estado de Rondônia depois da capital Porto Velho. Nazaré é a cidade sede do Grupo Minhas Raízes um dos melhores grupos musicais de Rondônia. Inclusive foi selecionado pelo governo estadual, para representar Rondônia culturalmente, durante a Conferência Rio+20 que aconteceu na cidade do Rio de Janeiro entre os dias 12 e 22 de junho. Além disso, o Instituto Minhas Raízes é o responsável pela coordenação do festejo de São Pedro que este ano excepcionalmente, aconteceu no mês de julho e durante esse festejo, acontece várias manifestações culturais folclóricas, como a apresentação do boi bumbá Curumim, dança do Seringando, dança do Carimbo, dança do Bazeiro com o grupo Wakum’ã, apresentação do cantor Caribé entre outras atividades culturais. Dois barcos conhecidos como de Recreio aportaram no porto do Distrito completamente lotados, isto no inicio da noite de sexta feira 6, e num desses barcos desembarcou dona Raimunda da Silva Santana que encontramos mais tarde, numa banca armada nas proximidades da igreja, onde aconteceu bingos e leilões. Sábado dia 7 de manha cedo, ao caminhar pela passarela de Nazaré, encontramos dona Raimunda já com a barraca  armada e então tivemos a curiosidade de perguntar sobre as festas que acontecem praticamente durante o ano todo nas localidades do baixo rio Madeira. Foi então que ficamos sabendo que ela sabe e freqüenta atuando como “marreteira”, em todas elas sem exceção. “Gosto de ser chamada de marreteira, é melhor que camelô, pra mim camelô é quem vende produto contrabandeado da Bolívia, eu vendo produtos comprados em São Paulo”. Dona Raimundo apesar de ter casa montada em Porto Velho declara na entrevista que segue, que só para em casa após a festa do Jerico (a única que ela faz fora do rio Madeira) no mês de fevereiro. “Ai vou pra cãs e só saio de novo no final do mês de abril).

Vamos ficar sabendo quando e onde acontece cada festejo no baixo Madeira, de Porto Velho em Rondônia a Borba no Amazonas.

 

E N T R E V I S T A

 

Zk – Vamos às apresentações?

Raimunda Santana - Sou Raimunda da Silva Santana nascida no  dia 28 de agosto de 1943 no seringal “Guariba” no estado de Mato Grosso. Cortei seringa, produzi borracha e também trabalhei colhendo castanha, fiquei no seringal até meus 14 anos de idade.

 

Zk – Saiu do seringal direto pra onde?

Raimunda Santana – Fui pra Manaus de onde vim já com 40 anos de idade para Porto Velho.

 

Zk – A senhora prefere ser chamada de camelô ou marreteira?

Raimunda Santana – Eu me acostumei mais com o termo marreteira (Na Amazônia o termo Marreteiro quer dizer vendedor ambulante, aquele que sai vendendo de porta em porta, no caso da dona Raimundo de Porto em Porto). Comecei em Manaus vendendo perfume e como sacoleira. Lá em Manaus trabalhei durante 16 anos na Fetejuta onde era produzido saco de juta essas coisas.

 

Zk – Por que a senhora resolveu fixar residência em Porto Velho?

Raimunda Santana – Acontece que minha primeira filha casou e o marido dela foi transferido para Porto Velho. Nasceu o primeiro neto e continuei marretando em Manaus, mas, quando veio o segundo neto não resisti e vim morar em Porto Velho isso foi em 1982.

 

Zk – Quando a senhora chegou a Porto Velho continuou trabalhando como marreteira ou se ocupou de outra profissão?

Raimunda Santana – Foi assim, quando cheguei aqui fui trabalhar no Hospital de Base, na realidade, na empresa Estacom que estava construindo o Hospital de Base como servente de pedreiro. Depois da inauguração do Hospital a única que não ficou trabalhando no Hospital como funcionária do governo fui eu, porque não quis, nós éramos 35 operárias.

 

Zk – Bom, o objetivo desse nosso bate papo é sobre o conhecimento que a senhora tem de todas as festas que acontecem no baixo Rio Madeira. Como foi que a senhora resolveu se dedicar a vender “bugigangas” nessas festas?

Raimunda Santana – Como disse, pedi as contas da Estacom e eles foram muito bons comigo, porque apesar de eu ter pedido demissão, eles me pagaram como se tivessem me dispensando e então recebi boa indenização. Então fui pra Manaus e comecei a trazer perfume (daqueles que a gente fala que é importado) pra cá. Naquele tempo a estrada de rodagem BR 319 funcionava o que facilitava muito. Comprei um terreno no bairro São Sebastião que estava começando, Passei dez anos vendendo perfume na beira do rio Madeira para os balseiros.

 

Zk – No tempo do garimpo de ouro?

Raimunda Santana – Isso mesmo ia de balsa em balsa, vendendo perfume para os garimpeiros, até que alguém chegou e disse, porque você não vai vender na feira, lá é bom. Foi então que coloquei uma banca na feira livre onde só vendia perfume.

 

Zk – E quando foi que a senhora deixou a venda de perfume de lado e partiu para a venda de tudo quanto é bugiganga?

Raimunda Santana – Tinha uma senhora que trabalhava numa banca ao lado da minha que me instigou a passar a vender esses produtos. No inicio eu comprava um objeto, vendia, voltava na loja e comprava dois e assim foi. Mesmo já tendo uma banca fixa na feira, não deixei de vender na beira do rio Madeira, ia nas balsas e nas embarcações vender meus produtos.

 

Zk – Foi então que resolveu descer o rio pra vender nas festas dos santos?

Raimunda Santana – Foi mais ou menos por aí. Certo dia estava eu vendendo num desses barcos recreio antes dele zarpar e uma pessoa chegou e disse: “Por que a senhora não vai vender lá em São Carlos, lá tem uma festinha boa!” e eu: E onde é isso? Resultado fui bater em São Carlos na festa de Nossa Senhora Aparecida. A única marreteira era eu. Na primeira festa levei apenas perfume. 

 

Zk – Daí pra frente a senhora passou a freqüentar todas as festas no baixo Rio Madeira. De Porto Velho a Borba as festas acontecem quando?

Raimunda Santana – No mês de agosto tem a festa do Coração de Maria em Cujubim, Em São Carlos tem a festa de São Carlos  que é no mês de julho e em outubro tem a festa de Nossa Senhora Aparecida. Em Calama faço a festa de São João em junho e de São Francisco em outubro.  Em Nazaré tema a festa de São Pedro em junho e a festa da Melancia em agosto. Agora vamos ter a festa da localidade de Santa Catarina que é o São Sebastião Fora de Época no dia 28 de julho, Tem a festa da localidade de Papagaio que é em novembro. Essa de Papagaio ano passado não teve porque a dona da localidade morreu, este ano os filhos já me disseram que vai acontecer. Em setembro tem a festa de Nossa Senhora das Dores em Manicoré. Em Novo Aripuanã faço a festa de maio e volto em dezembro para a festa de Nossa Senhora da Conceição. É claro que faço a festa de Santo Antônio em Borba.

 

Zk – Vamos organizar esse roteiro?

Raimunda Santana – Saio de casa no final do mês de abril e vou pra festa de Novo Aripuanã, de lá vou a Manaus onde passo uns três dias reabastecendo a banca de material e vou prum festejo numa localidade que não lembro o nome, onde acontece a Festa do Jaraqui, dessa festa volto a Manaus e então vou pra festa de Santo Antônio em Borba, daí vou pra Calama na festa de São João. Nazaré tem a festa de São Pedro também no mês de junho (este ano excepcionalmente aconteceu em julho), logo depois tem a festa de São Carlos no mês de julho e a de Catarina também em julho e daí só vou parar em casa em abril.

 

Zk – Quer dizer que em janeiro, fevereiro a senhora ainda está nas festas?

Raimunda Santana – Em janeiro eu faço a festa da Ilha de Assunção, Dou uma paradinha e saio da beira do Madeira para em fevereiro ir para a festa do Jerico em Alto Paraíso.

 

Zk – Quando é que a senhora visita a sua casa em Porto Velho?

Raimunda Santana – (sorrindo) - Você disse certo! Visito minha casa no mês de março. Aliás, após a festa do Jerico venho pra casa e fico até o final do mês de abril.

 

Zk – Qual é o mês que realmente não tem festa no baixo Madeira?

Raimunda Santana – É o mês de abril.

 

Zk – A senhora falou em tudo quanto é localidade do baixo Madeira, mas, disse nada sobre Humaitá. A senhora não coloca banca no festejo de Humaitá por que?

Raimunda Santana – Humaitá foi o seguinte: Eu só tinha uma irmã e ela morava lá e eu fazia o festejo de lá. Acontece que há nove anos minha irmã morreu eu não me sinto em condições de vender nos festejos de Humaitá. Por isso faço o festejo de Novo Aripuanã que é na mesma época.

 

Zk – Entre os festejos que acontecem apenas no trecho do rio Madeira que fica no estado de Rondônia. Qual o que concentra maior quantidade de pessoas e o melhor para o seu negócio?

Raimunda Santana – O melhor entre os melhores é o de Nossa Senhora Aparecida em São Carlos.

 

Zk – O que a senhora vende na sua barraca?

Raimunda Santana – Miudeza tipo, piranha, bijuteria, óculos, brinquedo como carrinhos, bonecas e agora esse teco teco que está na moda.

 

Zk – Esses produtos a senhora compra na Bolívia?

Raimunda Santana – Não! Tem um rapaz que traz pra mim de São Paulo, às vezes uma amiga manda de Manaus.

 

Zk – Vou fazer uma pergunta que a senhora tem todo o direito de não responder. O que a senhora conseguiu vendendo esses produtos, o que a senhora tem de patrimônio?

Raimunda Santana – Nada! Só tenho uma casa mesmo. Não tem um marreteiro que seja bem de vida. Acontece o seguinte, por exemplo, se o senhor perguntar agora o preço de qualquer produto da minha banca eu vou dizer é tanto, se o senhor chegar a Porto Velho e eu estiver com a banca montada o preço vai ser o mesmo que pratico nas festas do baixo Madeira. Quer dizer, o preço que vendo em Porto Velho é o mesmo que vendo aqui e não podia ser, porque pra chegar aqui paguei passagem no barco tenho outras despesas, isso porque a concorrência é muita nos grandes festejos. Veja bem, esse brinquedo teco teco em Porto Velho e aqui é vendido a R$ 5 o que é comprado para revenda em São Paulo como é o meu caso. Já os que trazem da Bolívia vendem mais barato e mais, esses clandestinos chegam (se referindo a um vendedor que chegou de última hora em Nazaré), não pagam para montar a barraca e vendem mais barato é uma concorrência desleal. Esses ”piratas” só chegam no último dia e por não pagarem imposto e nem pra botar a banca vendem mais barato.

 

Zk – A senhora fica em pousadas ou fica em casa de amigos?

Raimunda Santana – O interessante é que praticamente em todas as localidades do baixo Madeira a administração constroe uma casa que serve de abrigo para quem vem participar do festejo. Acontece que isso só funciona quando vem muitos vendedores, aqui mesmo em Nazaré não fiquei na casa abrigo, porque estou sozinha e é perigoso. É assim.

 

Zk – E pra espantar os carapanãs?

Raimunda Santana – Olha, uso sempre o Boa Noite que alguns  chamam de Sentinela. Nunca peguei malária nos festejos do baixo Madeira.

 

Zk – Quanto custa, o espaço para colocar a banca?

Raimunda Santana – Em Borba o espaço custa R$ 100 acho que para o ano na festa do Jerico vai custar uns R$ 300. Aqui em Nazaré p

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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