Segunda-feira, 25 de novembro de 2024 | Porto Velho (RO)

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Gente de Opinião

Silvio Santos

Rita Queiroz - Andando pelas picadas


Rita Queiroz  - Andando pelas picadas - Gente de Opinião 

Sexta feira passada quando o município de Porto Velho festejava seus 95 anos de emancipação, a artista plástica Rita Queiroz recebia convidados na Galeria Afonso Ligório da Casa da Cultura Ivan Marrocos, para apresentar sua mais nova coleção de artes plásticas. “Andando Pelas Picadas – Escamação Celular”. Quinta feira pela manhã conversamos com a artista durante a assinatura dos convênios dos Pontos de Cultura e marcamos uma entrevista para falarmos sobre a exposição. Não fomos a abertura da vernissage, deixamos para comparecer à Galeria no sábado de manhã. Ao entrarmos na Ivan Marrocos fomos informados que “a Rita Queiroz está lá no final da galeria”. Foi então que vimos nossa querida artista, sentada numa cadeira de balanço, num espaço separado da exposição por um vitral com motivos amazônicos. No espaço, além da cadeira de balanço feita com cipó, vimos uma mesinha de centro com uma bíblia aberta e um terço, mais ao lado, um balaio cheio de apetrechos como retalhos, agulhas de crochê etc. Na parede o retrato da mãe da Rita e ao lado desse retrato um cabide com o chapéu e o terno do pai da artista. “Essas coisas fazem parte da minha vida”.

Durante a entrevista ficamos sabendo que a exposição nasceu, graças a queda de uma rede. “Já tinha caído de rede em outras ocasiões, porém era a corda que quebrava. Dessa vez foi a própria rede que se partiu ao meio e eu fiquei sentada no chão”. Pois justamente ao ficar sentada no chão foi que Rita Queiroz fez uma viagem pela sua vida e resolveu dá um basta naquilo que ela classificou como um ciclo de sua vida. “Chega de viver brigando, discutindo com as pessoas em prol de maior respeito para com a nossa arte e cultura”. A partir de agora, Rita Queiroz vai se dedicar ao trabalho sócio/cultura e porque não dizermos financeiro das pessoas que residem na localidade de Santa Catarina no baixo rio Madeira que é de propriedade de sua família. “Esse programa Pontos de Cultura veio em boa hora, vamos desenvolver no beiradão, o que já fizemos em Porto Velho”.

A exposição Andando pelas Picadas, da Rita Queiroz é composta por cinco telas e três instalações entre elas a “Escamação celular” que representa o momento da queda da rede vivida pela artista e que serviu de inspiração para a criação dos trabalhos, que ficam na Casa da Cultura, até o dia 26.
 

Rita Queiroz  - Andando pelas picadas - Gente de Opinião

E N T R E V I S T A 

Zk - Em seu discurso na abertura da exposição, você disse que era o fechamento de um ciclo de sua vida. Quer explicar sobre esse fechamento de ciclo?

Rita Queiroz
– Penso assim, de dez em dez anos você tem uma mudança. È o fechamento do ciclo dessa minha luta, da minha briga, dessas minhas coisas todas. Já chega, parou por aqui.

Zk – Quer dizer que a partir dessa exposição, os artistas plásticos ficam órfãos da sua mais ferrenha defensora?

Rita Queiroz
– É! Parou por aqui. Fecho esse ciclo homenageando minha família e faço um passeio por dentro de mim mesma em busca de saber, por que até hoje essas minhas andanças pelas picadas, em busca dessa coisa tão misteriosa que é a arte e a vida.

Zk – Por falar nisso, como está a saúde?

Rita Queiroz
- A pressão sobe, estou intoxicada, não posso comer isso, não posso comer aquilo, a tinta me faz mal. Tudo isso me leva a procura de fazer um trabalho social junto ao povo de “Catarina”.

Zk – O que é Catarina?

Rita Queiroz
– Santa Catarina é uma comunidade que existe no baixo Madeira entre São Carlos e Calama que é de propriedade da nossa família há muito tempo. Ali vamos desenvolver um trabalho social através de um projeto que foi selecionado como Ponto de Cultura pelo governo de Rondônia. Esse projeto chegou em boa hora, vou fazer no beiradão o que fiz aqui em Porto Velho. 

Rita Queiroz  - Andando pelas picadas - Gente de Opinião
Zk – O que foi que fez com que você tomasse a decisão de finalizar esse ciclo de sua vida?

Rita Queiroz
– Um dos motivos foi não ter mais preocupação com o que está acontecendo, a gente está sempre ali, ta faltando isso, essa luta que a gente tem em relação a falta de apoio com o nosso trabalho, a falta de uma política cultural que tenha toda essa temática de valorizar o trabalho do artista, isso cansa muito.

Zk – Agora vamos falar sobre a exposição Andando Pelas Picadas da Rita?

Rita Queiroz
- Fazer uma individual é muito difícil, você tem que ter tudo, você tem que trabalhar, tem que botar dinheiro do bolso. Quando você faz coletiva não, são vários artistas e cada um faz sua parte. Quando é individual o trabalho é enorme inclusive você tem que pegar a temática para apresentar ao público.

Zk – Por falar em temática. Vamos detalhar a Andando Pelas Picadas?

Rita Queiroz
– São picadas, porque tanto faz o caboclo andando por uma picada, ou eu mesma andando por uma picada dentro de outra cultura, de outra cidade. Vale lembrar que picada é o mesmo que caminho e esses caminhos são muito difíceis porque você não sabe o que vem pela frente. Tanto faz você ser conhecido ou não, você sempre tem que estar com o terçado na mão lutando por alguma coisa, tanto no mato como na vida da cidade. Também representa a vida do artista, das andanças, desse caminho difícil. Quero dizer assim: Andando pelas picadas, descobri igarapés, igapós, rios, bamburrais e águas claras, turvas e escuras que representa essa luta, essa alegria, porque tudo isso tem alegria, tem a conquista, tem os amigos, tem essa coisa toda e navego hoje por essas estranhas correntezas em busca desse mistério, que é a vida e a arte. O artista nunca para, você termina um trabalho quando dá fé surge o outro, você está sempre buscando a criatividade essa coisa que vem da alma da gente.

Zk – Quando foi que você disse: vou pintar umas telas para expor na Galeria Afonso Ligório?

Rita Queiroz
– Esse trabalho que dei o nome de descamação celular começou justamente da queda de uma rede.

Zk – Rede?

Rita Queiroz
– A rede faz parte da minha cultura beradeira. Minha mãe me mimava na rede, embalei meus filhos na rede e até hoje. Aliás, hoje passo meu tempo maior numa rede, nem durma na cama mais. A rede pra mim é a companheira silenciosa, nela eu leio, durmo, as vezes escrevo e me balanço. Foi justamente numa dessas balançadas que a rede se partiu e eu caí.

Zk – A rede partiu ou foi a corda da rede que quebrou?

Rita Queiroz
– Foi a rede que partiu no meio e eu cai.

Zk – O que isso tem a ver com a exposição Andando Pelas Picadas?

Rita Queiroz
– Quando a rede partiu cai sentada no chão. Engraçado, dessa minha ficada no chão comecei a fazer uma viagem por dentro de mim mesma. De repente comecei a pensar longe, perto, foi então que pintou a idéia de fazer um trabalho com a própria rede.

Zk – E os lençóis entraram na exposição por que?

Rita Queiroz
- Só que a idéia da rede amadureceu aí veio os lençóis com os quais me embrulhei por muito tempo. Esses lençóis eu guardava para fazer pano para limpar pincel. Sorte que ainda restaram cinco lençóis e comecei trabalhar neles e a esse trabalho dei o nome de escamação celular – Coisa que sai do corpo da gente. O trabalho foi desenvolvido na reciclagem de objetos pessoais.

Zk – Por falar em queda de rede, nossos pais e as pessoas mais antigas, classificam a quede de rede como muito perigosa. Nessa sua queda não ficaram seqüelas?

Rita Queiroz
– Não, geralmente as quedas de rede provocam danos físicos, nesse caso não. Inclusive já tive vários tombos de rede. Uma vez a rede quebrou a corda. Agora, partir como partiu a rede dessa vez nunca tinha acontecido. Acho que esse acidente foi um aviso, tipo assim Rita ta na hora de parar com essa fase e começar outra. De repente aproveitei a queda e transformei em arte.

Zk- Esse episódio da sua vida está bem claro na instalação onde vemos uma pessoa sentada no chão justamente no que restou de uma rede. O interessante é que o boneco ficou tão perfeito, que a gente pensa que é uma pessoa realmente que está ali sentada. Agora a roupa que está vestindo o boneca era sua também?

Rita Queiroz
– Àquela pessoa que está ali dei o nome de escamação celular, ela está com a minha roupa. Cortei algumas roupas minha em retalhos e fui pregando. São objetos da minha vida pessoal.

Zk – Quanto tempo você levou para concluir as telas dessa exposição. São telas e instalações?

Rita Queiroz
– A exposição é composta de telas e instalações. Tirando a da rede, as demais peças foram criada de dois meses para cá. São cinco telas em pano velho (lençóis), que me deram muito trabalho. Se pintar em tela própria já é trabalhoso imagina pintar em pano velho.

Zk – A pintura nos lençóis diz o que?

Rita Queiroz
- Tem um “balaio” que chamo de lixeira que há cinco anos venho botando ali todos os meus dissabores, tudo que aconteceu comigo de raiva de felicidade estava na lixeira. Como nunca mais tinha feito uma exposição individual boa como foi a “Lendas da Amazônia”, surgiu da lixeira isso aí. Achei engraçado que depois de tirar toda aquela confusão, mágoa, briga da lixeira, saiu um trabalho desses, um trabalho que veio mexer com o meu lado emocional, espiritual, do ontem, hoje e do amanhã. Isso elevou minha pressão e me deixou meio doente aí também veio o vitral.

Zk – Vamos falar sobre o vitral com motivos amazônicos?

Rita Queiroz
– O vitral representa um espaço que foi o começo da minha vida com meus pais. Meus pais vieram do nordeste na época da borracha, meu pai chegou a ser seringalista. No inicio pensei em trazer uma casa de palha depois de analisar os fatos, lembrei que apesar da nossa casa ser coberta de palha os móveis de dentro eram no estilo Luiz XV, eram móveis bonitos trabalhados em vidros e quem mandava na época eram os cristais, tinha aqueles cálices, aquelas taças de cristal coloridas. Então resolvi fazer essa representação em vitral. Fiz essa divisória com tema amazônico e tem a cadeira de balanço, o balaio com as coisas que fomos educadas para fazer, crochê, tricô, pra mexer com colcha de retalho. Não fui criada para ser o que sou hoje. Fui criada para ser dona de casa e até professora e nesse balaio tem essas recordações. Tem a bíblia da minha mãe que era muito católica, tem o chapéu e o terno do meu pai. Esse cantinho da exposição que fica no final da Galeria é o cantinho da família Mendonça Queiroz

Zk – Vamos deixar um pouco a exposição para falar sobre o Ponto de Cultura. Como vai funcionar esse Projeto?

Rita Queiroz
– Esse projeto vai abranger quase tudo dentro da área de arte visual, quero mesmo atingir o bom artesanato e a tecelagem. Por que? Porque vai dar retorno financeiro. Quero que esse pessoal tenha uma vida melhor porque até hoje, por incrível que pareça, muito deles ainda vivem do peixe com farinha e andam descalço. Quero que eles aprendam a fazer as coisa. Que daqui a três anos, tempo de vigência do convênio com o Ministério da Cultura e com o Governo Estadual, que eles somem os ensinamentos na vida social deles.

Zk – Você vai atuar como instrutora no Projeto Santa Catarina?

Rita Queiroz
– Vou ficar mais como gestora do Projeto e to selecionando as pessoas para levar para lá. Nossa idéia é produzir bio jóia, a tecelagem terá bastante destaque por que vamos poder mexer com todas as fibras que a natureza nos dá.

Zk – Para encerrar a exposição fica na Casa da Cultura até quando? As telas estão a venda?

Rita Queiroz
– A exposição fica até o dia 26 deste mês de outubro. As telas da exposição não estão a venda, serão doadas aos meus familiares. Agora pintei umas telinhas que estão expostas dentro da canoa. Essas telas estão sendo vendidas a R$ 40.

Zk – Quer dizer. Graças a rede rasgada ganhamos uma super exposição da artista plástica Rita Queiroz.

Rita Queiroz
– Coloca na entrevista que é a exposição da Rita da rede rasgada (sorrindo muito). 

Fonte: Sílvio Santos - zekatracasantos@gmail.com   
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