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Silvio Santos

RUI RAMOS 80 ANOS – Vivendo a vida


RUI RAMOS 80 ANOS – Vivendo a vida  - Gente de Opinião

No dia de Nossa Senhora Aparecida 12 de outubro, juntamente com o nosso editor Guarim Liberato e o fotógrafo Roni Carvalho, fomos cobrir a festa da padroeira do Distrito de São Carlos no baixo Rio Madeira. A viagem pela estrada que liga Porto Velho a Boca do Rio Jamari foi tranqüila. Desembarcamos em São Carlos por volta das 15h e logo depois encontramos o senhor Rui Ramos já todo pronto para acompanhar a procissão que acontece por terra e por água. “Uma imagem de Nossa Senhora Aparecida segue num andor em forma de canoa num barco motor e vai até a “boca” do Rio Jamari e de lá volta seguidas por vários barcos motor, rabeta, voadeira e canoas para o Porto de São Carlos”. Enquanto isso, uma outra imagem de N.S. Aparecida, sai da igreja inaugurada pelo Padre Chiquinho Pucci na década de 1920, pelas ruas do distrito até chegar à beira do rio onde se encontra com a procissão fluvial e as duas seguem até ao pátio da igreja onde é celebrado um ato litúrgico por uma Ministra da Eucaristia. Na conversa com o seu Rui Ramos antes da procissão, ficamos sabendo de várias histórias, entre elas a do canal que liga o Rio Candeias ao Rio Madeira mais conhecido como ‘A Vala do Dr. Martins’. “No tempo que trabalhava com regatão, entrava na Vala do Dr. Martins com um motor rabetinha porque lá não dava para entrar um barco grande a Vala é estreita e não da pra fazer a volta”. Rui Ramos atuou como “Regatão” no baixo Madeiros e seus afluentes, durante dez anos. “Trocava açúcar, café, roupa, sapato, sal e outras mercadorias por farinha, feijão, porco, galinha, milho e melancia com os beradeiros”. Os produtos da troca eram trazidos para Porto Velho onde eram vendidos.

Domingo passado, nossa conversa continuou, desta feita, durante a festa de aniversários do 80 anos do seu Rui Ramos que aconteceu no Clube do Sindsef e contou com a presença de todos os familiares vivos. “Veio gente de Manaus, do Acre e outras cidades da Amazônia, noventa por cento dessas pessoas que estão aqui são meus parentes” e olha que o Sindsef estava lotado.

Sexta feira passada 23 fomos até o comercio do seu Rui Ramos que fica no bairro Novo Estado em Porto Velho e resolvemos gravar algumas passagens de sua vida. Vamos conferir! 

E N T R E V I S T A 

RUI RAMOS 80 ANOS – Vivendo a vida  - Gente de Opinião
Zk – É só Rui Ramos?

Rui Ramos
– Rui de Alcântara Postigo Ramos. Nasci na localidade de Pariri no município de Humaitá (AM). Pariri era um seringal da nossa família, infelizmente, não posso dizer como era a vida lá em Pariri porque saí de lá, com 5 anos de idade e fui para Restauração uma localidade mais perto de Humaitá onde fui morar com minha tia Maria Letícia Postigo porque minha mãe faleceu.

Zk – Lá em São Carlos o senhor nos contou que conhece o Rio Madeira de ponta a ponta. Fale sobre essa convivência com o Madeirão?

Rui Ramos
– Quando completei 12 anos vim estudar no colégio Dom Bosco em Porto Velho. Acontece que meu pai faleceu muito novo, com apenas 42 anos de idade e então fui morar em Prosperidade, um seringal também de propriedade da nossa família, onde vivi até meus 17 anos. Comecei a namorar com a Maria Tavares, com quem casei aos19 anos de idade.

Zk – Tudo isso em Prosperidade?

Rui Ramos
– Fomos para São Carlos onde passei a ser comerciante.

Zk – E o conhecimento do Rio Madeira?

Rui Ramos
– Começou quando passei a regatear e também trabalhar com barco de pesca.

Zk – Como funcionava esse negócio de regatear?

Rui Ramos
– Regatear é o seguinte: Eu tinha um barco e saia pela beira do Madeira (foi aí que conheci o Madeirão), parava num porto comprava feijão, galinha, porco, farinha os produtos que o beradeiro tinha para regatear (oferecer). Eles me ofereciam esses produtos em troca dos produtos que eu tinha no barco “Regatão”, açúcar, café, roupa, sapato e outros que eles não produziam.

Zk – E como era que o senhor fazia para transformar essa mercadoria em dinheiro?

Rui Ramos
– Quando estávamos com o Regatão lotado seguíamos para Porto Velho para vender as mercadorias.

Zk – Vendia na feira?

Rui Ramos
– Não! O pessoal ou como chamávamos naquela época, a freguesia sabia que por aqueles dias o Rui Ramos ia chegar com seu barco lotado de mercadoria e então iam esperar na beira do rio e eu vendia tudo sem sair do batelão.

Zk – O Seu regatão pegava muita mercadoria?

Rui Ramos
– Olha, meu barco era considerado médio, o nome dele era: “Boa Viagem I”. Passei nessa vida de regatão por aproximadamente 10 anos. Tinha o comercio em São Carlos e regateava pelo Rio Madeira

Zk – O senhor também contou para o nosso editor Guarim Liberato durante aquela conversa no dia 12, que São Carlos era terra de mulher bonita. Fale sobre as mulheres da São Carlos daquela época?

Rui Ramos
– Isso aí ninguém pode negar, era e ainda é, terra de mulher bonita. Minha namorada a Maria Tavares era professora e diretora do colégio além de ser muito bonita, assim como eram as filhas de Bento Macêdo e outras famílias das localidades vizinhas.

Zk – O senhor chegou a conhecer o Rodolfo Guimarães o dono de São Carlos?

Rui Ramos
– Quando fui morar em São Carlos o Rodolfo Guimarães já tinha vendido as terras para o Raimundo Ferreira um seringalista que era seringalista na BR que hoje é a 364.

Zk – E em São Carlos tinha seringal?

Rui Ramos
– Não! Porém, por ficar em frente à boca do Rio Jamari era uma espécie de Porto de embarque e desembarque de mercadorias que iam e vinha dos seringais existentes ao longo do Rio Jamari e do Rio Candeiras. Na realidade quem morava em São Carlos era o Raimundo Ferreira e o Julio Pantoja que era o genro dele.

Zk – Agora o senhor lembrou um fato que até hoje muitas pessoas não entendem. Por exemplo, o senhor disse quem morava em São Carlos era o Raimundo Ferreira e o Pantoja. Por que só os dois?

Rui Ramos
– Acontece que São Carlos mesmo, a localidade, era uma vila pequena. Acontece que cada proprietário de terra colocava o nome que lhe convinha. Então tinha a localidade de Santa Terezinha do Sebastião Avelino, tinha São Cristóvão que era da família do Bento Macedo, isso pro lado de baixo. Pro lado de cima onde eu morava tinha Itapirema, São José e Prosperidade que já era o nosso seringal. Hoje todas essas localidades fazem parte do Distrito de São Carlos.

Zk – O seringal Prosperidade era grande?

Rui Ramos
– Prosperidade era um seringal muito grande de propriedade do meu pai Fortunato Cândido Ramos. Prosperidade tinha uma produção média mensal de Mil Quilos de Borracha.

Zk – Seu pai era um seringalista muito considerado?

Rui Ramos
– Ele era muito amigo do coronel Aluizio Ferreira e em conseqüência fazia política em prol do Aluizio fato que herdei e continuei apoiando Aluizio Ferreira e sua política; Aliás, no meu tempo o Aluizio estava saindo e quem estava entrando era o coronel Paulo Nunes Leal.

Zk – Isso quer dizer que o senhor pertencia à facção conhecida como Cutuba?

Rui Ramos
– Naquele tempo tinha esse negócio de Cutuba e Pele Curta e eu era Cutuba por ser correligionário de Aluizio Ferreira e Paulo Leal.

Zk – No governo de Paulo Leal o senhor foi o que no Baixo Madeira?

Rui Ramos
– Fui delegado de polícia em São Carlos e representante do governador no baixo Madeira, ou seja, de Porto Velho até Calama.

Zk- Como representante do governo o que senhor fez pela população ribeirinha?

Rui Ramos
– Com ordem do coronel Paulo Leal mandei construir algumas escolas, muitas jovens encaminhadas por mim se formaram professoras. A Diretora de Educação era a professora Marize Castiel e ela sempre atendia nossos pedidos.

Zk – Como era a política desenvolvida no Baixo Rio Madeira. Tanto pelo lado dos Cutubas como dos Pele Curta?

Rui Ramos
– Pelo lado dos Pele Curta não sei dizer. Agora pelo lado dos Cutubas quem comandava era eu. Paulo Leal e Enio Pinheiro eram os líderes e eles tinham um barco e nesse barco a gente trazia aquele pessoal todo pra votar em Porto Velho.

Zk – Quando o senhor se mudou de vez para Porto Velho foi morar aonde?

Rui Ramos
– Fui morar no Triângulo, depois fui para rua Jamari com a Rafael Vaz e Silva sempre como comerciante. Fui para a rua Abunã e creia a Feira da Liberdade e hoje estou aqui no bairro Novo estado com o meu comercio.

Zk – Na festa do seu aniversário que aconteceu no dia 18 tinha muita gente. Era tudo da família?

Rui Ramos
– Noventa por cento era. Basta lembrar sou pai de 12 filhos sendo oito mulheres e quatro homens e mais um bocado de netos e bisnetos.

Zk – Nessa sua luta pela sobrevivência deu pra fazer o pé de meia. Hoje o senhor vive bem?

Rui Ramos
– É claro que a gente sempre quer mais, porém, trabalhei para ter uma velhice tranqüila. Hoje vivo da renda dos imóveis que construí ao longo desses 80 anos e do meu comercio, aliás, ser comerciante é minha vida.

Zk – Vamos voltar ao tempo que o senhor trabalhava com barco peixeiro. Qual o peixe preferido pelos consumidores?

Rui Ramos
– Daquele tempo até hoje o peixe preferido de todos ou da maioria é a Jatuarana e o Tambaqui aquele que era chamado Tambaqui do Madeira que chegava a pesar 20/30 quilos.

Zk – Por falar em lago e o Cuniã?

Rui Ramos
– Hoje os jacarés tomaram conta do Lago do Cuniã, mas no meu tempo, cansei de fazer pescaria de Pirarucu no Lago do Cuniã. Eu abri uma estrada para o Lago do Cuniã.

Zk – Aquele picadão que vai por terra de São Carlos até o Cuniã?

Rui Ramos
– Não! A estrada que estou falando é fluvial. Acontece que teve um tempo que a Marize Castiel passou pro lado dos Pele Curta e então passou a perseguir os Cutuba e foi então que transferiu a Maria para o Cuniã e para encurtar a distância, abri uma estrada no igarapé do Cuniã. Saí cortando cipó, abrindo caminho até chegar lá, esse caminho fluvial, acho que até hoje é usado pela população, apesar de já ter uma estradinha por terra.

Zk – Por falar em estrada fluvial o senhor navegou pela “Vala do seu Martins”?

Rui Ramos
– O engenheiro Martins foi uma pessoa muito importante para todos os ribeirinhos, principalmente os que habitavam o Rio Candeias. Ele tinha seringal no Candeias e para trazer a produção precisa dar uma volta muito grande pelo Rio Jamari para poder chegar no Madeira. Foi então que resolveu abrir o que ficou conhecido como a Vala do Doutor Martins. Da localidade conhecida como Aliança ele comandou os homens que saíram abrindo a Vala na picareta no rumo do Rio Madeira. Não sei quanto tempo durou essa empreitada, só sei que foi concluída e até hoje os moradores do Rio Candeias utilizam a “Vala” para chegar mais rápido ao Madeira. Eu regateei muito na “Vala”, com um motorzinho rabeta porque lá não comporta barco grande.

Zk – No dia da festa do seu aniversário, seus irmãos Heitor, Osvaldo, seu genro Carioca e outros estavam comentando que o senhor até hoje é danado em se tratando de conquistar mulher. Isso é verdade?

Rui Ramos
– É o que eles dizem. Por eu tratar muito bem as mulheres eles falam que sou meio danado por mulher, mas não. Mulher eu respeito como se deve respeitar.

Zk – Outra conversa, era que o senhor mesmo com 80 anos está procurando uma companheira. O senhor confirma essa conversa?

Rui Ramos
– Não é verdade. Por enquanto não estou querendo companheira para morar. Moro com minhas duas filhas mais novas que estão fazendo faculdade e cuidam muito bem de mim. Mulher pra viver comigo não quero não. A gente tem que se conformar com a idade.

Zk – Qual a receita para se chegar aos 80 anos de idade com tanto vigor?

Rui Ramos
– Sempre andei bastante e trabalhei bastante. Nunca bebi e nunca fumei e nem gosto de perder sono. 

Fonte: Sílvio Santos - zekatracasantos@gmail.com   
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