Terça-feira, 2 de abril de 2013 - 20h02
Educar para a vida é um dos temas mais debatidos quando se fala em educação e filosofia ou humanidades, de forma geral. Os filósofos da antiga Grécia falavam na necessidade de se cultivar o bom senso, a sabedoria prática. Vejamos uma idéia/sugestão inicial de prudência em Epicuro (341-270 a.C): de todas as coisas, a prudência é o princípio e o supremo bem, a razão pela qual ela é mais preciosa do que a própria filosofia.
Também foi este o caso clássico de Aristóteles e o livro Ética a Nicômaco. Tratou da Virtude como a busca da excelência em cada ação, ou seja, de fazer bem feito, do melhor modo possível. A Virtude ainda seria objeto e desafio da filosofia renascentista, mas aí como Prudência, como a qualidade de quem faz com bom juízo, adequado aos propósitos (fins), mas com a escolha razoável (racional) dos fins.
Maquiavel, na novela A Mandrágora (de 1513), está preocupado com a moral. Essa imagem está clara na introdução do próprio romance: “Não é que ele participe da sordidez. Queremos dizer que ele a usa para atingir as finalidades superiores que são a razão de sua vida” (1994, p. 25). Ou, a exemplo dos motivos que justificaram a sedução de Lucrécia por Calímaco: “Tua astúcia, a tolice de meu marido, a ingenuidade de minha mãe e a malícia de meu confessor me levaram a fazer o que, por mim, eu nunca teria feito; portanto, quero crer que isso tenha sido determinação do céu — e quem sou eu para recusar o que o céu quer que eu aceite?” (1994, p. 102-3). Assim, a prudência é ter ciência da paciência e, portanto, paciência com a consciência. Esta é, em síntese, a reta razão que pode unir conhecimento e moderação. E também por este caminho vemos que há muitos maquiavelismos possíveis, isto é, há muito mais relações entre os meios e fins, do que a vã política pode supor.
Agora vejamos como esta questão pode ser relacionada à fixação conceitual da excelência, em Hannah Arendt: “A excelência em si, arete como a teriam chamado os gregos, virtus como teriam dito os romanos, sempre foi reservada à esfera pública, onde uma pessoa podia sobressair-se e distinguir-se dos demais” (Arendt, 1991, p. 62). Para Arendt, a antiga filosofia cristã favorecia a perspectiva integrativa entre excelência e prudência:
Conviver no mundo significa essencialmente ter um mundo de coisas interposto entre os que nele habitam em comum, como uma mesa se interpõe entre os que se assentam ao seu redor; Pois, como todo intermediário, o mundo ao mesmo tempo separa e estabelece uma relação entre os homens [...] O que torna tão difícil suportar a sociedade de massas não é o número de pessoas que ela abrange, ou pelo menos não é este o fator fundamental; Antes, é o fato de que o mundo entre elas perdeu a força de mantê-las juntas, de relacioná-las umas às outras e de separá-las [...] Encontrar um vinculo entre os homens, suficientemente forte para substituir o mundo, foi a principal tarefa política da antiga filosofia cristã; E foi Agostinho quem propôs educar sobre a caridade não apenas a
Esta é a clássica aposta do Renascimento na reta razão — razão com a devida prudência de se buscar a verdade, de não ir de encontro ao perigo, às ciladas da própria ânsia ou ganância.
A tudo isto minha avó resumia como “não meter a mão em cumbuca”. Muitos anos depois soube de onde vinha a expressão popular: trata-se de uma arapuca para prender macacos e nada mais é do que uma cabaça aberta em um dos lados, com abertura bem estreita, e com algum alimento dentro; ao introduzir a mão e apanhar o fruto, a mão do macaco fica maior com o volume do fruto que não quebra facilmente e assim não consegue retirá-la pelo orifício; o macaco é incapaz de soltar o fruto, porque sua gana é maior; por fim, com a cabaça presa por uma corda, o macaco é presa fácil ao caçador. Mas, porque tratei disso? Pensei no tema por duas razões aparentemente desvinculadas:
Laranja Mecânica(original: A Clockwork Orange) é um filme britânico de 1971, dirigido por Stanley Kubrick, adaptação do romance homônimo de 1962 do escritoringlêsAnthony Burgess. Como se vê na ilustração, há um Homer Simpson em todos nós, atormentados pela criancice que não tem nada de engraçado. Há muito tempo atrás valia dizer que “não se deixasse morrer a criança que havia em cada um de nós”; hoje esta criança interior é sinônimo de apoplexia diante de quase tudo que é relevante na vida comum do homem médio.
A educação obriga à disciplina, assim como alguns esportes ou modalidades esportivas, a exemplo do Judô. A educação exige que se tenha disciplina, não há como estudar se você tem déficit de atenção, se não consegue sentar-se ou mesmo andando concentrar-se no que está lendo. Ninguém estuda assistindo TV – é besteira pensar o contrário. No máximo uma música relaxante, clássica ou instrumental. Consigo escrever com a TV ligada, mas jamais leria um texto sem que me abstraísse do que ocorre em volta. De tal modo, essa qualidade de se abstrair do entorno, de tudo que desvie nossa atenção, a fixação com foco no que se lê, é essencial à disciplina. O que ainda nos leva à conclusão de que é muito melhor, de qualidade superior, ler um livro (de papel) comparativamente a qualquer texto digitalizado. Nem me refiro a ler com acesso fácil às redes de comunicação, em que a todo momento (como agora) você para a leitura (ou a escrita) para checar e-mails. Para estudar, é preciso ter inteligência, sem dúvida, mas é óbvio que não se pode assobiar e chupar cana.
Bibliografia
ARENDT, H.A condição humana. Rio de Janeiro : Forense Universitária, 1991.
MAQUIAVEL, Nicolau. A mandrágora. (2ª Edição). São Paulo : Brasiliense, 1994.
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Vinício Carrilho Martinez (Dr.) Cientista Social e professor da UFSCar Márlon Pessanha Doutor em Ensino de CiênciasDocente da Universidade Federal de