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Gente de Opinião

Vinício Carrilho

O Cesarismo de Estado


 

            O Cesarismo de Estado é uma forma-Estado em que os três poderes atuam em conglomerado, como se fossem um ditador moderno – emprestando o instituto do dictator romano. Em 2016, entre nós, viu-se realidade porque a base político-jurídica foi protagonizada sob a forma de uma Ditadura Inconstitucional. No desfecho do ano, assim como no ápice do impeachment,o Palácio é alvo de investigações pesadas e colheita de provas nem sempre legalizadas[1].

É como se disséssemos que o agente tomador/usurpador do poder é hoje um conjunto de instituições públicas e privadas; pois, mesmo na condição de César do Estado, responde ao sistema produtivo e especulador. A diferença é que este César moderno, do século XXI, não é um indivíduo, mas sim um poder: o Poder Político.

O Poder Político, como conjunto de três poderes – mas sem divisão de poderes e nem clareza nas determinações constitucionais –, tomado e atuando por meios de exceção, atua como se a soberania fosse posse/propriedade do dictator. O ditador moderno é o Estado e sua força-tarefa que se atesta como Cesarismo de Estado.

O Estado – o Poder Político –, por sua vez, apenas assim se manifesta porque existe uma base de legalização constante dos atos de exceção. Para cima e para baixo, dentro e fora das instituições, as comandas de poder aliviam a responsabilidade do próprio Judiciário[2].

O Cesarismo de Estado, portanto, atua sobre uma base político-jurídica que lhe dá sustentação e se infiltra nos níveis subalternos da vida pública e privada: daí uma Ditadura Inconstitucional com fortes e evidentes traços fascistas. Por isso também se diz que o fascismo é cotidiano e se manifesta tanto nas instituições públicas quanto na vida comum do homem médio.

No plano interno, motivando-se pela exclusão do Princípio da Separação dos Poderes – e com viva voz à regra do “vim, vi, venci” – inaugura-se ou se incrementa o Cesarismo de Estado. Quando não apenas um César, mas vários césares tomam o poder pra si.

Retrospectivamente, até o desfecho do Golpe de 2016, César estava instalado no Congresso Nacional. Ainda que pensemos que há uma vocação partidária no César congressual – inclusive com forte atuação de oligarquias saudosas da escravidão ou das Leis de Cerceamento (FIESP/CIESP) –, César já respondia ao sistema financeiro e atendia muito bem pelo codinome de Bancada BBB.

No entanto, instalado no poder, as dependências de César foram ampliadas e hoje se ocupam dos três poderes. Neste sentido, César é o Estado e ainda que vez ou outra surja um porta-voz requerendo mais espaço na mídia[3].

Aliás, quanto mais surgem emissários ou eminências pardas, mais reforça-se a tese de que César é um conjunto de instituições replicantes da normalidade da “organização” político-jurídica instaurada na Ditadura Inconstitucional.

Em consequência, por exemplo, o direito básico de livre manifestação contra a ditadura é considerado ato de lesa pátria: não há liberdade de expressão se a nota do ENEM, por exemplo, é atribuída como zero se o candidato declarar “Fora Temer”. Por óbvio, trata-se de ditadura[4].

Então, se há um Cesarismo de Estado, com os três poderes tecendo a mesma cartilha na tomada e na manutenção do poder, é porque, no momento anterior, firmou-se uma base ou condição institucional propícia. A base político-jurídica construída para sustentar este César monumental é exatamente a Ditadura Inconstitucional.

Em nosso caso, além disso, ainda há que se debater o reflexo do Estado Patrimonial e do patriarcalismo que permitem, no bojo da gritante desigualdade social da sociedade capitalista, vivenciarmos abusos escorchantes de um regime de castas sociais e beneplácitos a determinados servidores públicos. A pior ditadura possível é a do Judiciário que se queda inerte à oferta de privilégios imorais legalizados[5].

Vinício Carrilho Martinez

Professor Adjunto IV da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar/CECH

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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