Quarta-feira, 16 de março de 2016 - 21h14
O poder do direito-meio
um medium da exceção
Diante da avassaladora crise intestina do poder, com toda sorte de artifícios (i)legais, (i)morais dos que brigam pelo poder – no que se inclui a derrocada da luta pelo direito – reafirma-se a máxima política de que “os fins justificam os meios”.
De contrabando, vigora um Oportunismo Jurídico: o Judiciário deve regular o Político (alargando os limites da própria judicialização da política), responder de imediato, substituir a qualidade pela quantidade, prontamente mergulhar nas fissuras do poder, abandonar a defesa da Constituição para ter suas ações voltadas à Razão de Estado.
Como não poderia ser diferente, nesse ambiente em que se imiscuem o direito-meio (poder) com o direito-fim (justiça), prevalece a regra antijurídica do “poder a todo custo”.
No Oportunismo (Pragmatismo) Jurídico não se professa o interesse pelos fins: como se o direito-meio (médium de poder) fosse a única verdade possível e uma mensagem que se devesse levar a todos, especialmente, ao custo da própria justiça. No vínculo do direito-meio, como medium de poder, não há uma ética da responsabilidade. Afinal, em meio à exceção, quem é responsabilizado pelo uso excessivo do poder?
Pelo mesmo lado da questão, alegando-se a segurança jurídica, uma pretensão de justiça pode se arrastar por décadas, quase indefinidamente. E todo atraso desmesurado, logicamente, afasta a definição do justo e assim se traduz como injustiça.
Por isso, o direito precisa ser retido como dinâmica social, não como equilíbrio indefinido, mas equilibrando-se diante das necessidades e das demandas sociais. Não reduzido ao meio, mas atuante como fim, o direito nos leva a pensar nos objetivos, no que queremos para nós e para os outros com a imposição do próprio direito-fim.
Como meio, historicamente, o direito se vê como refém do poder dominante. Como fim, como alegação das conquistas que se unificam na consciência humana (condição humana), o direito é um instrumento de afirmação de classe.
Como justiça, o direito é um instrumento da Teleologia: direito-fim. Como composto, o direito se presta à libertação de todos que se sentem oprimidos. Como componente, o direito é um poder político da opressão; como composto, é um poder social da emancipação.
Como equilíbrio do poder estabelecido, o direito é um componente ideológico, pois no fundo somente se equilibram o status quo e a durabilidade das injustiças presentes. Como desequilíbrio social no meio social injusto, por exemplo, o direito pode ser precisamente um meio de justiça, porque desequilibraria a fonte geradora da injustiça.
Entretanto, a (in)justiça não é um objeto de retórica da ciência jurídica ou da sociologia do direito, mas sim um dado da realidade, um fato insofismável e produzido/regulado pela luta das classes sociais fundamentais.
Assim, a legitimidade está na fabricação, no momento inaugural da dominação (escolha dos fins) e na delimitação dos meios: descrição do médio-direito (meio) a ser utilizado como instrumento de dominação de alguns/muitos sobre todos.
Quando há somente alguns na origem do direito, opera-se sob o mando da exceção de poder; quando se nutre o direito do fazer de muitos (do máximo possível) recorre-se à socialização do direito. Em uma síntese, o direito-meio (mais ainda se dotado apenas de força) implementa a violência como fim e instrumentaliza o direito: servil ao poder.
Do contrário, a violência como meio de legitimação (a vontade não manipulada) substitui a violência-fim (direito = força, coerção): quando prevalece o direito da maioria sobre os mais fortes.
De certo modo, esta utopia pode ser compartilhada por democratas, liberais (sérios e críticos), por socialistas e comunistas; sobretudo, se entendermos que não há sociedade, por mais perfeita que seja, sem uma intrincada relação entre direito-meio (instrumento) e direito-fim (justiça).
A dialética direito/poder permanece atinente ao processo civilizatório, ora prolongando-o – como direito-fim da justiça – ora retraindo-se diante da instrumentalização do direito-meio: atuando como longa manus do poder mandatário.
Portanto, para a solução dessa crise que assola o país, o direito-fim (legitimação) deveria ser imposto ao direito-meio (força). Pois, só assim poderá renascer o direito-fim, de fato, como direito praticado pela Humanidade, e como segurança jurídica contra o direito-meio de todas as formas de exceção.
Especialmente porque, outra característica do Estado de Exceção, sobretudo no século XXI, é criar carapaças de “normalidade administrativa do poder”, sobretudo para que o cidadão mediano não reconheça a submissão do direito-fim aos usos/abusivos ditados pelos operadores do direito-meio. Mas, como se vê no cenário político nacional, é o exato contrário do que temos na relação tripartite do poder – e que, um pouco mais, poderá se apresentar como um só soberano.
Vinício Carrilho Martinez
Professor Adjunto IV da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar/CECH
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Vinício Carrilho Martinez (Dr.) Cientista Social e professor da UFSCar Márlon Pessanha Doutor em Ensino de CiênciasDocente da Universidade Federal de