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Vinício Carrilho

Povo


O que é povo?

Povo é o conjunto dos cidadãos, no sentido de conjunto de eleitores. Mas, politicamente, povo é o conjunto dos cidadãos ativos e institucionalizados (eleitores, contribuintes, cidadãos registrados e com certidão de nascimento) que fazem parte de um país, uma nação, uma coletividade política com a forma de Estado. Há esta diferença, em especial atenção ao conjunto dos eleitores (que é a definição jurídica de povo) porque o povo é um instituto político, jurídico, institucional que, inclusive, dá forma ao Estado, como elemento essencial de sua configuração.

 Já a população pode/deve incluir todas as pessoas, é quase um atributo estatístico, como somatória de todos os indivíduos, sejam cidadãos ativos ou não, como no exemplo da enorme categoria social de trabalhadores e não-trabalhadores; incluem-se todos os admitidos ou reconhecidos pelo Estado, aqueles em que se atesta a existência formal, mas também aqueles com os quais se perdeu a comunicação institucional, formal e que vivem à “sombra do reconhecimento oficial”. Além dos inseridos regularmente no sistema social pelo Poder Político, podemos pensar nos sem-teto, nos dependentes químicos, nos miseráveis e abandonados nas cidades e nos campos, além dos povos da natureza, índios, extrativistas que se embrenharam nas matas, esquecendo-se da vida civil, ou os que nem foram tocados pelo Estado, como os índios não-aculturados. As amostragens do tipo IBGE, por exemplo, recolhem ou indicam um perfil da população brasileira, pois tenta-se mapear todas as “raças”, nações parciais que formam a grande nação brasileira, jovens e adultos, homens e mulheres, com muita ou pouca escolaridade. Temos, portanto, um perfil da população.

Em um plebiscito ou referendo teremos um perfil do povo, pois com o resultado da eleição pode-se verificar qual o perfil político do povo, o que se pensa majoritariamente acerca de determinadas instituições públicas (somos a favor ou contra o desarmamento do povo?); bem como nas eleições sabe-se qual a configuração política e ideológica do povo, se mais à direita ou mais à esquerda, se mais progressista ou conservadora, se mais reformista ou radical em razão de determinados temas. Quando se elege um perfil de candidato como o de Maluf, excluindo-se a possibilidade de compra de votos ou de voto de cabresto, pode-se concluir que parte do eleitorado (parte do povo) acredita em políticos que não são exemplos lapidares do pensamento republicano. Quando se trata da cultura também se faz alusão à cultura popular, como se fosse a cultura do povo; no entanto, o povo aqui está sendo utilizado como sinônimo de população uma vez que abrange a formação da identidade de todos ou da imensa maioria das pessoas que formam a base social de uma nação. Em outro sentido da cultura, mais claramente intencionado, a ideia geral é o de que verifiquemos os reflexos ou repercussões diretas na condução e na estrutura política de uma nação. Ou seja, se toda cultura traz efeitos ou condições e condicionamentos políticos, então, a cultura de povo se refere à ação de transformação da vida social, quer seja pela cultura, como “política diária, costumeira”, quer seja pela política institucional.

A nação, como nos dizia o historiador Renan, é um plebiscito diário, incondicional em que depositamos nossa confiança, nossa fé, nossas esperanças em ver nossos próprios sonhos e perspectivas mais próximos da realização. Neste sentido, na nação, convivem povo e população, o oficial e o informal, o público e o privado, o individual e o coletivo, o institucional e o cultural. Na nação, ao contrário do Estado, os elementos da subjetividade e até da irregularidade cultural e individual manifestam-se com muito mais clareza. Pela nação, o que nos une é a crença, a fé, o desejo de partilhar experiências comuns, coletivas, ou que sejam individualizadas, mas no intuito de que possam ser copiadas (como ocorre na presença do “herói nacional”). Há um desejo, uma necessidade, um reconhecimento simbólico (bandeira) e vocal (língua oficial), um apelo à identidade cultural (orgulho de ser brasileiro). Outra questão, mais complicada, é definir o povo brasileiro – e isso fica para outro dia.

Vinício Carrilho Martinez

Professor Adjunto III da Universidade Federal de Rondônia - UFRO

Departamento de Ciências Jurídicas/DCJ

Pós-Doutor pela UNESP/SP

Doutor pela Universidade de São Paulo

 

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