Sexta-feira, 6 de novembro de 2015 - 11h39
Só não admite o racismo, o próprio racista. O racismo está tão impregnado que somos racistas até no elogio. No Brasil, o racismo do século XXI tem traços claros de fascismo, pois atrás da cor vem a restrição, a exclusão e a eliminação seletiva: 165 jovens negros são mortos violentamente por dia.
O racista diz que os EUA são mais racistas do que nós. Ficamos indignados com as imagens de um negro morto pelas cotas, abatido por um policial estadunidense racista; porém, nada se fala e nem aparecem na TV nacional os 165 negros mortos diariamente.
Há um “branqueamento” forçado, violento, que se inicia nas periferias, favelas e comunidades para chegar ao centro da cidade, onde são vitimados pelo crack e pelas ruas ainda mais elitistas e fatais. Na guerra civil brasileira o negro é o soldado do front, quando não é a bucha de canhão.
O racista não revela que a corrupção, por exemplo, é invenção genuinamente branca, assim como o ódio racial nascido dos estupros que geraram o mito da miscigenação e democracia racial. É preciso dizer sempre que a miscigenação nasceu com a negra da senzala sendo violada em sua dignidade pelo branco da casa grande. Então, hoje, quando o negro estuda, com ou sem cotas, ainda faz tremer a casa grande. Para o racista, convicto ou não, o negro é uma espécie de filho bastardo da sociedade.
Desde a manjedoura do pecado mortal, dos estupros das negras do cativeiro pelos brancos redentores praticando o branqueamento, há “naturalização” da barbárie, da violência, da condenação à eternidade do “não-ser”: o negro só “é” um pouco quando abandona sua cor de pele.
Além da extrema concentração de capitais que provoca a miséria nacional galopante, esta “naturalização” do extermínio seletivo – e que remonta às raízes do Brasil escravista – é combustível altamente inflamável da nossa guerra civil. Os brasilianistas conhecem Machado de Assis; contudo, nós não lemos, porque é chato ou difícil. E porque é negro em sua literatura!
Os fascistas chamam essas denúncias de vitimismo ou qualquer coisa para tentar desqualificar as lutas pela libertação do racismo. Causa indignação as justificativas dessas atrocidades citando que a atriz é linda e, por isso, não poderia ser atacada na Internet. Imaginemos, então, o que se faz com os negros que não são famosos e não estão dentro dos padrões de beleza[1]. Também ouvimos essas falas de pessoas “cultas”.
Nos casos de famosos, são ainda mais racistas os que repudiam os primeiros ofensores: "como podem ofender uma moça linda?". Quer dizer, feia pode ser massacrada. Na piada racista, a realidade do racismo é sacramentada pelo azar dos “três Ps”: puta, pobre e preta.
O mito da democracia racial sempre acontece quando algum artista sofre com o racismo e o povo começa a campanha pelas redes sociais: hipocrisia e indignação super seletiva. E a hipocrisia se completa porque ninguém é condenado por racismo, um crime violento e hediondo.
Por causa desses discursos a nossa sociedade "naturaliza" o assassinato de negros e pobres. Para essa sociedade tudo é normal, mas só quando se trata de pobres e negros. O negro que se posiciona em ativismo político/racial é acusado de ser racista; como se praticasse um racismo às avessas.
Exemplo disso tudo é que, para a ignorância acumulada por séculos de desconhecimento da realidade societal, as cotas – políticas públicas de inclusão, como medidas de ação afirmativa – é que criaram o racismo. Alguns chegam a concluir que as cotas legalizaram o racismo.
O racismo nacional, um subtipo de eurocentrismo ou arianismo latino-americano, eufemisticamente, atende pelo pseudônimo de meritocracia. Isto é, pobres e ricos, brancos e negros, têm de se provar e se fazer por si mesmos. Como se vivêssemos no “reino da igualdade”, em que todos fossem livres e justos.
Diante desse fascismo sorrateiro e do racismo declarado, o racista só será visível – aos olhos dormentes de quem crê na democracia racial – e combatido em seu mal racial, quando “o negro na sociedade de brancos” (Florestan Fernandes) não for mais vitimado institucionalmente: pela polícia, por exemplo.
Quando este dia chegar, a alegação racista – “o negro de alma branca” – terá sido combatida com veemência, sem sermos agredidos, e “o branco na sociedade de negros” não será apenas “o branco de alma negra”.
O que, certamente, só ocorrerá quando o Brasil e os brasileiros forem livres nas mentalidades e no eito do trabalho análogo à escravidão; e que contrata, inclusive, com o Poder Público.
Vinício Carrilho Martinez
Professor Adjunto IV da Universidade Federal de São Carlos
Inaê Level
Professora de Sociologia da Rede Pública de Ensino
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Vinício Carrilho Martinez (Dr.) Cientista Social e professor da UFSCar Márlon Pessanha Doutor em Ensino de CiênciasDocente da Universidade Federal de