Domingo, 28 de junho de 2015 - 17h05
Parece até aqueles dramalhões mexicanos canhestros que se prolongam em lugares comuns e mesmices óbvias: a cobrança dos insumos para adequar o sangue para transfusões seguras se arrasta como uma lesma na mídia local há mais de um mês, e ainda não apresentou seu desfecho.
Depois de enfadonhos capítulos, face a queda de audiência, eis que entra em cena um novo grupo de personagens, dessa feita formado pela Comissão de Saúde da Assembleia Legislativa.
Qual o motivo de um história tão elementar exigir tanto tempo para ser contada de um jeito convincente? Por que ainda não chegou a um final feliz? Da parte do proprietários dos hospitais não faltou empenho para contá-la como ela verdadeiramente é. Alguns não a compreenderam porque acharam vantajoso não compreendê-la. Outros, os doadores de sangue, tomados pela indignação (até revolta!) de ver seus atos de solidariedade serem lançados na vala comum do mercantilismo, reagiram a ponto de declarar com todas as letras nas redes sociais que não mais doariam sangue gratuitamente na Fhemeron, que o estaria vendendo — por falta informações mais claras, foi assim que entenderam equivocamente a questão.
Trazer esse assunto já desgastado novamente à tona — porém ainda a merecer uma decisão definitiva — justifica-se porque haverá uma Audiência Pública nesta segunda-feira 29, às 15h, na ALE sobre ele. Do modo sinóptico e pedagógico destacaremos os quesitos que interessam, na tentativa (talvez vã) de evitar muitas palavras supérfluas nesse importante debate.
1. Em nenhum momento o Sindicato dos Estabelecimentos de Serviços de Saúde do Estado de Rondônia (Sindessero) declarou que a Fundação de Hematologia e Hemoterapia do Estado de Rondônia (Fhemeron) está vendendo sangue. Posto que, de fato, estão sendo cobrados apenas os chamados insumos, que adequam o sangue para transfusão segura — aí incluídos custos com serviços e materiais.
2. Em nenhum momento, visto estar embasada em dispositivo legal, o Sindessero questionou a cobrança em si dos referidos insumos. Porém, isso não suprime o direito de a entidade classista achar a Lei Federal 10.205, de 21 de agosto de 2001, em especial o Parágrafo Único do art. 2º, deveria ser inconstitucional por estar em desacordo com o artigo 196 da Constituição, que assegura Saúde como dever do Estado e direito dos cidadãos. Todos nós, portanto, temos o direito ao Sistema Único de Saúde (SUS), condição considerada pela Fhemeron para isentar da cobrança dos referidos insumos. Ao cobrá-los daqueles que não usam esse serviço público obrigatório por ser ele, na maioria das vezes, deficitário, a fundação penaliza ainda mais os que decidem pagar pela assistência à saúde que deveria ser dada pelo SUS, como garante a Carta Magna brasileira.
3. O Sindessero, isto sim, reagiu com veemência e dentro da legalidade ao jeito atabalhoado de como a Fhemeron fez a citada cobrança sem antes acordar com os hospitais detalhes fundamentais nessa transação.
4. O que o Sindessero reivindica, em primeiro lugar, é que a Fhemeron obedeça o Código de Defesa do Consumidor informando o que precisa informar quando se cobra um serviço ou um bem de consumo. A referida fundação limitou-se a mandar boletos onde consta apenas uma frase: “Referente a ressarcimento de fornecimento de hemocomponentes”. Apenas isso!
5. Sendo a Fhemeron uma fundação sem fins lucrativos (pertence ao governo de Rondônia), não deve utilizar-se de uma tabela com fins lucrativos. A Classificação Brasileira Hierarquizada de Procedimentos Médicos, tabela mais conhecida como CBHPM, que prevê a carga tributária e uma margem de lucro aos hospitais e clínicas particulares, foi a escolhida arbitrariamente pela fundação para fazer sua cobrança. Se tem lucro embutido, está proscrita, é ilegal para ser usada por uma entidade nos moldes da referida.
6. A utilização dessa tabela impõe importante prejuízo aos hospitais/clínicas, que não podem cobrar valores superiores aos definidos por ela dos planos de saúde.
7. Caso os hospitais tivessem aceitado a tabela impingida leoninamente pela Fhemeron, os valores a serem cobrados pelos insumos diretamente a seus consumidores finais (ou a seus planos de saúde) seria sobremaneira elevados, em alguns casos chegando, por bolsa, a mais de R$ 2.000,00, sendo outras na faixa de R$ 500,00. Destaque-se que, na maioria das vezes, o paciente recebe mais de duas dessas bolsas numa transfusão. Ou seja, o valor já alto cobrado pela Fhemeron acrescido das taxa de comercialização, deixaria os custos ainda mais amargos. E mais: até para reservar o sangue (onde estão os insumos aí nesse item?) é preciso pagar, mesmo que, por óbvio, não se faça uso dele. Um absurdo: para tomar medidas preventivas em favor da vida (reserva de sangue), o governo exige da parte do paciente pagamento antecipado.
8. Ao mandar cobrar dos hospitais, a Fhemeron não teve qualquer preocupação em fazer uma campanha na mídia informando a partir de quando esses valores seriam cobrados. Daí o impasse estabelecido quando um hospital de Cacoal fez a primeira cobrança, tendo seu nome enxovalhado pela mídia, no primeiro momento, por estar “vendendo sangue”.
9. A Fhemeron enviou a cobrança para os hospitais extemporaneamente, posto que os pacientes já haviam tido alta e as contas já cobradas dos particulares e dos planos de saúde sem esse item. Caso os hospitais concordassem em pagar essa conta, seriam penalizados com um prejuízo de 100% do seu valor, já que seria inviável cobrá-las fora do prazo. Daí o motivo de o nosso Sindicato ter solicitado que a cobrança feita fosse cancelada até que houvesse os ajustes para que não tivéssemos tamanho prejuízo.
10. É importante salientar, também, que os valores das contas enviadas pela Fhemeron não coincidiram com os levantados pelos hospitais. Ao ser solicitada, através de Notificação Extrajudicial, que cumprisse o que estabelece o Código de Defesa do Consumidor, a fundação negou-se a fazê-lo. E ainda ameaçou os hospitais, literalmente, nos seguintes termos: “(... atender as demandas das Unidades de Saúde Particular apenas uma vez, as demais solicitações ficam condicionadas à assinatura de contrato ou convênio”. Logo, ameaçou sim, explicitamente, não fornecer sangue — algo absolutamente vital, como se sabe — aos hospitais que não se submetessem às imposições que fizera. Assim sendo, não é demais dizer que atitudes como essa devem ser proscritas à uma instituição que exerce a importante função de fornecem sangue para quem dele precisa para viver.
Feitas essas considerações, torna-se fácil concluir que os proprietários dos hospitais reivindicam algo legítimo fundamentado num código que objetiva proteger todos os consumidores, e ainda que o preço cobrado atenda aos pressupostos de uma relação entre um instituição sem fins lucrativos com outras com essa finalidade.
Por fim, parece claro que há, da parte do Sindessero, um questionamento com claro viés de interesse social. Se a Fhemeron encarece os tais insumos, a eles os hospitais particulares ainda acrescentarão a taxa de comercialização que lhes é permitida repassar aos consumidores. Diga-se, ainda, que a despeito de trazer lucro para essas empresas, seus proprietários denotam se sentir constrangidos em cobrar algo que foi doado como um ato de solidariedade humana para salvar vidas.
Fundamentados em inquestionáveis verdades (todas podem ser comprovadas documentalmente, e o serão na Audiência Pública), que respaldam o que reivindicamos, resta-nos confiar que, de modo pragmático, os senhores deputados concluam pelo que é melhor para o povo que representam. Repito: para o povo que representam. Não para a Fhemeron (governo); não para os hospitais privados, mas para o povo em geral, onde os menos favorecidos são as maiores vítimas. Para tal, garanto-lhes, podem contar com o apoio do nosso Sindicato. E assim, juntos, chegaremos a um final feliz.
Fim?...
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