Sábado, 19 de maio de 2012 - 17h38
Recordo de relatos de adultos, ainda à mesa após o jantar, que arrepiavam nossos medos infantis em início de noites do passado. Mulas-sem-cabeça, corujas agourentas, odores da morte, maus presságios, ruídos estranhos, utensílios domésticos que se moviam sozinhos, caiam e quebravam; janelas e portas que se abriam e fechavam por nada, e palmas, inusitadas palmas. Falavam tanto nessas palmas de outro mundo que até as deste nos amedrontavam.
Certa noite de outubro, como de costume nesses confins da Amazônia, chovia torrencialmente. Ventos fortes, raios e trovões compunham o cenário apavorante. Fomos todos para a cama cedo. De repente, para nosso desespero, um relâmpago seguido do apagar das luzes. Escuridão total. Ouvia-se apenas o som do vento que entrava, como um uivo, pelas frestas das janelas.
Nessa ocasião, nossa empregada, Sebastiana, que dormia em seu quarto, ao lado do nosso, dá um grito e sai correndo do aposento dizendo ter visto, através do vidro da janela, u’a mão branca que acenava pelo lado de fora. Nenhum ser vivo sensato estaria ali àquelas horas debaixo de tamanho aguaceiro nos dando adeus. De quem seria, então, a estranha mão branca? Logo imaginamos ser uma alma penada. Por que as almas são, quase sempre, tidas como brancas se poucos têm alma branca? A mão alva, que logo “desapareceu” quando saltamos da cama para vê-la, acenou para nosso pesadelo durante aquela e muitas outras noites. Até agora, nas minhas madrugadas escuras e chuvosas há sempre a perspectiva do aparecimento daquela mão, que penso ver nítida com minha imaginação. Mas sem acenar com o medo de outrora.
Assustar parece ser prazeroso para gente de todas as idades. Do passado distante também me recordo das peripécias que fazíamos, eu e minha turma de moleques peraltas, com mamões verdes, retirados de quintais vizinhos ao nosso. Em algumas dessas noites sem luz de então, com uma dessas frutas e um cinto velho, fazíamos nossas brincadeiras de horrorizar. Colocávamos sobre cerca próxima um mamão recortado com aspecto de caveira – dois buracos como olhos e uma boca serrilhada – tendo em seu interior uma vela acesa. O local escuro contrastava com a luz de dentro da fruta. Ficávamos escondidos em um terreno bem em frente a “caveira” , aguardando a passagem do pessoal que vinha da novena da igreja matriz. A maioria, senhoras e senhores de meia idade. No momento em que passavam pela local, o susto era grande. Escondidos, não contínhamos o riso. Logo que alguém nos descobria, nossas mães eram xingadas sem o menor pudor. Mas nem por isso desistíamos. Quanto ao cinto, era colocado no chão, à distância, ligado a nós por linha preta, enquanto aguardávamos outros transeuntes desavisados. Quando alguém passava por perto, do nosso esconderijo puxávamos a linha abruptamente, assustando-os. Algumas beatas histéricas davam saltos ao tempo em que gritavam por acharem que era uma cobra – naquele tempo, mesmo no centro da cidade, elas apareciam. Descobertos, mais ofensas para o currículo de nossas queridas mãezinhas.
Sustos de assustar de verdade, sustos de amedrontar de mentirinha. Medos, sobressaltos. Assim é a vida de brincadeira ; assim é a vida como ela é. No mundo da dura realidade, assombrações reais e imaginárias nos espreitam nas encruzilhadas existenciais. Fantasmas que nos assustam feito gente ou feito fato. Alguns deles, durante toda a caminhada...
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