Sábado, 15 de maio de 2010 - 13h08
Um dos preços que racionalidade impõe ao ser humano é a consciência de que um dia morreremos. Mas relutamos em aceitar essa condição, por isso nosso organismo reage, até o último instante, na tentativa de nos manter vivos.
De modos diversos, denotamos que rejeitamos, que temos medo da morte. Isto se mantém pelo instinto de conservação, que é fundamental para a vida. Quem não age assim, demonstra grave desvio de comportamento. Manter-se vivo, eis a maior questão.
Mas, viver para sempre, ou tão-somente além da conta, para quê?
A eternidade, em qualquer sentido que se queira entendê-la, é um exagero. Porque para sempre é sempre demais.
Viver além do que é preciso viver, não tenhamos dúvida, é um despropósito. Porque nessa condição, tudo ou quase tudo que queríamos vivenciar já vivenciamos. O passado, cujas lembranças por vezes tantos sofrimentos nos trazem, passa a ser passado demais, doloroso demais. E a repetição, ainda que agradável, gera monotonia, tédio.
No mais, a roda viva precisa girar. É preciso que alguns se retirem de cena para dar lugar a outros. Renovar é preciso. A permanência prolongada demais, não raro, conduz à acomodação, que é improdutiva, que pouco ou nada constrói. É fundamental que existam novas pessoas ávidas por descobrir o próprio caminho e outros caminhos. Quem já andou demais, está cansado, vai mais devagar, atravanca o caminhar dos outros, da vida. Por isto o ciclo existencial precisa ser como é, ter início, meio e fim.
Já que não se pode evitar a morte, que, como todos sabem, é certa, resta-nos apenas almejar que quando chegar nossa hora, que essa não seja antes nem depois da hora. Que sejamos preservados do sofrimento prolongado, que nossa dignidade não seja ultrajada nem nossas feições desfiguradas. E ainda, se não for pedir demais, que a dona de nossa finitude venha como um anjo que nos afague e leve em sua companhia durante um belo sonho, um sonho bom numa noite em que amanhecer não há mais razão de ser.