Domingo, 29 de julho de 2012 - 17h37
Muito já se falou e escreveu sobre a nossa Estrada de Ferro Madeira-Mamoré (EFMM). Diante do centenário de sua inauguração, no dia 1º de agosto de 2012, mais ainda se diz da ferrovia cuja construção foi a maior epopeia do século 20. Todavia, ainda não se fez justiça no que tange a decisiva presença médica nas frentes de trabalho da ferrovia para que o projeto fosse concretizado.
Além dos médicos americanos, e do Hospital da Candelária, merece destaque a atuação dos sanitarista brasileiros Oswaldo Cruz e Belizário Penna que, em 1910, a convite de Persival Farquhar, proprietário da empresa construtora, fizeram o diagnóstico detalhado das condições insalubres da região e propuseram medidas preventivas. Nas conclusões de seu relatório, o eminente sanitarista de Manguinhos foi contundente ao afirmar que a procrastinação das medidas será um crime de lesa-humanidade.
Acrescente-se que não só a EFMM, mas também a lendária Missão Rondon, contemporânea da construção da ferrovia, não teria sido levada a termo se um grupo de médicos não tivesse acompanhado o então major Cândido Mariano da Silva Rondon, em sua investida desbravadora.
Todas as tentativas para a construção da ferrovia entre 1867 a 1907 foram frustradas porque não foi dada, pelas empresas construtoras desse período, atenção devida às condições insalubres existentes na região, localizada no coração da selva amazônica, o inferno verde.
A floresta tropical infestada de animais selvagens e peçonhentos, os índios arredios e ferozes, o alcoolismo disseminado, os violentos confrontos pessoais, e outras dificuldades impostas pela natureza, por si só representavam um grande obstáculo. Entretanto, o mais severo deles era imposto pelas doenças, entre elas a malária, a que mais matava; a febre amarela, o tifo, a cólera, outras diarreias decorrentes da falta de higiene, viroses ainda desconhecidas ou pouco conhecidas, e infecções bacterianas diversas, entre outros males. Eram estas, muito mais que aquelas, que dizimavam os trabalhadores impiedosamente. Estima-se que mais de 10 mil deles tenham morrido, o que deu origem à lenda de que cada dormente representa uma morte. Daí porque aestrada recebeu as estigmatizantes denominações de Ferrovia do Diabo, Ferrovia dos Mortos, Ferrovia Fantasma e Mad Maria (Maria Louca).
Enfermo caquético com bandagem no pé esquerdo parcialmente amputado, ao relento na floresta impiedosa
Cemitério da Candelária, localizado atrás do hospital–sepultou corpos e esperanças
Os relatórios abalizados de dois dos primeiros dos médicos que aqui chegaram em 1907, os doutores H. P. Belt e, em seguida, Carl Lovelace, em 1908, que dirigiram o Hospital da Candelária, denunciaram as condições inóspitas do lugar. Belt escreveu em relatório que um trabalhador depois de noventa dias na região tornava-se imprestável. (...) É a região mais doentia do mundo.
Os sanitaristas brasileiros Oswaldo Cruz e Belizário Penna, deixaram claro que se não fossem tomadas as devidas providências preventivas, mais uma vez a construção não seria concluída.
A partir do momento em essas medidas foram tomadas e que os pedidos dos médicos do hospital foram atendidos, o índice de morbidade e mortalidade diminuíram consideravelmente. Foram essas mudanças, decorrentes da competente ação médica – em especial as medidas preventivas por eles recomendadas e implantadas – que tornou possível a conclusão da EFMM.
No momento em que celebramos o centenário da nossa ferrovia, a mãe do estado de Rondônia, seria justo manifestar, com maior visibilidade, nossa gratidão a esses heróis de curar que contribuíram de modo incontestável para que a lendária ferrovia se tornasse uma realidade. Sem eles e seus feitos, ela não existiria.