Segunda-feira, 9 de outubro de 2023 - 14h27
"O alvo de toda a atenção do médico é a saúde do ser humano, em benefício da qual deverá agir com o máximo de zelo e o melhor de
sua capacidade profissional."
Código de Ética Médica, art.
2º
Não é o médico que sabe mais medicina que cura mais. Há aqueles bem formados
que não conseguem resultados compatíveis com seu cabedal de conhecimentos.
Medicina é ciência e arte. Ciência que cobra o domínio teórico e prático do
saber vigente. Arte que requer sensibilidade para perscrutar os anseios mais
íntimos do ser humano que sofre.
O médico fundamenta seus atos em ciências naturais como a biologia, a
física e a química, que sustentam a cientificidade da medicina. Todavia, não
deve esquecer que sua arte requer que ele saiba do comportamento das pessoas
para compreender suas necessidades existenciais. O médico, escreve Norman
Cousins:"Não é um mero receitador de remédios, mas um símbolo de tudo que
é transferível de um ente humano a outro, salvo a imortalidade".
Complementa T.R. Harrison, autor de um clássico da medicina contemporânea:
"O doente necessita sentir que sua personalidade singular está sendo
compreendida e apreciada e que a essência dos problemas de sua vida foi
integralmente apreendida pelo médico".
O médico não deve se referir ao paciente como uma doença, um caso, um número de
aposento ou de leito. O que cativa doentes e sãos é serem tratados como gente. Lamentavelmente, os avanços tecnológicos vêm roubando do médico essa
virtude. Alguns deles confiam tanto na decisão das máquinas de diagnosticar a
ponto de relegar a relação interpessoal com seu paciente e os procedimentos
semióticos.
O enfermo é um atento observador de seu médico. Subestimar essa sua capacidade
poderá trazer transtornos para a relação médico-paciente. Tudo que o médico aparenta
ser é importante para o doente que ele assiste. Afinal, por instinto de
conservação, quem precisa saber mais com quem está lidando e a quem está
se entregando a cuidados é o paciente.
O médico que não desperta confiança está fadado ao insucesso profissional.
Hipócrates percebera isso desde os primórdios da medicina ao postular uma
conduta ética ao médico e recomendar que cuidasse da própria aparência, dos
seus gestos e atitudes sociais. É na confiança que o médico desperta em seu
paciente que reside o efeito placebo que ele provoca. "A personalidade do
médico pode funcionar mais poderosamente sobre o paciente que as drogas
empregadas", aludiu Paracelso. Pesquisas comprovam que mais de 34% da ação
terapêutica dos medicamentos devem-se ao efeito placebo e não aos seus
princípios ativos. É procedente, portanto, concluir que expressivo número de
doentes são curados mais pela confiança que depositam nos médicos que os tratam
do que no efeito científico de suas prescrições.
O Código de Ética Médica, coluna mestra que normatiza a boa conduta moral do
médico, pressuposto basilar para que seja confiável, explicita em seu artigo 4º
que a ele "cabe zelar e trabalhar pelo perfeito desempenho ético da
medicina e pelo prestígio e o bom conceito da profissão". Todavia, não é
demais lembrar, escreve Elias Abdalla Filho, que esse código "só pode ser
verdadeiramente exercido se encontrar ressonância na personalidade do médico".
Do contrário, conclui esse autor, "será obedecido de forma apenas
protocolar, estéril e carente de sentido, carente mesmo de sua própria razão de
existir".
O médico que difama levianamente seus colegas infringe a ética e conspira
contra a credibilidade da própria profissão. Mais que qualquer outro
profissional, o médico depende da confiança nele depositada para que funcione
com eficácia. Bernard Lown, conclui: "A crítica ferina corrompe a
capacidade de cura dos médicos". Não é só o médico acusado, justa ou
injustamente, que sofrerá os danos da difamação; o descrédito disseminado
gerará insegurança coletiva, principalmente naqueles que precisam da
assistência desses profissionais. Isso não significa que o médico, à revelia do
artigo 37 do seu código de ética, acumplicie-se com os seus maus colegas
protegendo-os com o silêncio. Por vezes, para deter um contumaz mau médico só
resta a seus colegas denunciá-lo, responsavelmente, ao conselho de ética da
profissão ou até em instâncias judiciais, em nome da boa prática da medicina.
O aprimoramento científico continuado, teórico e prático, a observância aos preceitos éticos e humanitários, o bom senso, o discernimento decisório oportuno e a empática relação médico-paciente compõem a imagem do médico verdadeiramente confiável. Este, sim, o médico que cura mais, o bom médico.
*Viriato Moura é
médico, jornalista, artista plástico, cartunista, chargista, autor de 20 livros
(prosa e verso), 3 opúsculos e participou de 9 coletâneas literárias. Recebeu
diversas condecorações a nível municipal, estadual e nacional, sendo a mais
recente delas a Comenda Moacyr Scliar – Medicina, Literatura e Arte, que lhe
fora outorgada pelo Conselho Federal de Medicina. É membro da Academia
Rondoniense de Letras, Ciências e Artes, da Academia de Letras de Rondônia e da
Sociedade Brasileira de Médicos Escritores.
Pedir segunda opinião médica: um dilema dos pacientes
Até que ponto é válido ouvir uma ou mais opiniões de outros médicos quando se quer avaliar a do médico que nos trata? Essa atitude tem resultados pr