Domingo, 3 de julho de 2011 - 17h57
O relógio, que pela primeira vez adornava meu punho, parecia maior do que eu. Era relógio de verdade. Os de brinquedo haviam ficado para trás, naqueles idos de minha infância. Ganhei-o de minha mãe, de quem, aliás, ganhei muitas boas essências de vida. O belo adereço foi inaugurado após o costumeiro banho para trocar o calção de brincar pela fatiota de passeio vespertino. Roupa bem passada, de cor clara e tecido leve, como convinha ao corpo naquela tarde ensolarada de agosto, e meias brancas, até o meio das pernas, com sapatos pretos bem lustrados. Que pinta! E lá fui eu para a Praça Getúlio Vargas, em frente ao palácio do governo, a uns cem metros da nossa casa na Rua José do Patrocínio, no centro de Porto Velho. Lá, um obelisco contemplava um reservatório com água suja, cheia de lodo, onde morava um jacaré de quase dois metros de comprimento.
Na pracinha – assim a chamávamos –, encontrei-me com alguns amigos que brincavam de bola numa pequena área de relva. Confesso que não cabia em mim com meu vistoso relógio, que foi logo mostrado a eles. Curiosos, pegaram no meu punho para apreciá-lo. Crianças e despossuídos têm essa hábito: matam a curiosidade do novo, do belo, principalmente, também com as mãos. Perguntaram-me quem me dera, quanto custara, qual a marca. Enquanto isso, caminhávamos pela orla do reservatório. Os moleques que me acompanhavam ainda estavam com traje de brincar, que se resumia a um calção empoeirado. Eles desse jeito, e eu limpo, bem vestido, com meu reluzente relógio.
De repente, em meio à admiração da molecada que me cercava para ver de perto meu novo adereço, um dos garotos me empurrou e, sem chances de evitar, caí na água imunda, a uns três metros do jacaré. O bicho, assustado, moveu-se em minha direção e se preparou para o ataque. Caí na parte mais funda. Não sabia nadar. Por óbvio, fui acometido de desespero total, enquanto a meninada presente se divertia, rindo a valer da minha situação ridícula e perigosa. Felizmente fui salvo pelo Ribamar, o Riba, um rapaz conhecido nosso que passava por perto na ocasião.
O susto foi grande e a lição, maior. Encharcado de lama e de medo, restou-me o choro infantil humilhado pela galhofa de meus algozes. Aprendi que a vaidade explicita incita o ataque de um animal perigoso chamado inveja, de consequências imprevisíveis.
Fonte: Viriato Moura / jornalista DRT-RO 1067 - viriatomoura@globo.com
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