Quinta-feira, 13 de dezembro de 2007 - 15h42
Cayabi Upit, 27 anos, sonho ser poeta e escritor /JOSANA SALLES
JOSANA SALLES
Agência Amazônia CUIABÁ – A quase mil quilômetros do campus da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), o índio cayabí Upit, de 27 anos, nascido no Parque Indígena do Xingu, lê livros e escreve poesias nos horários de folga, quando não está guiando turistas às margens do Rio Teles Pires, na região de Alta Floresta. O sonho de Upit é passar no vestibular para Letras. Quer ser poeta. "Estudo sozinho, quero estudar mais e não vou desistir disso nunca". Aos cinco anos começou a estudar numa escola indígena na Aldeia Tuiaraere no Parque. Fez o 2º grau em Canarana e na cidade passou a sentir a discriminação, o preconceito dos colegas estudantes e professores. "Já sofri muito com isso mas não ligo para o que dizem, porque somos iguais na inteligência e no respeito. Pensamos e vivemos diferente sim", afirma. Upit conta que o Xingu precisa de médicos índios para saber combater a doença dos brancos. Sempre com caderno e lápis na mão, Upit escreveu "Sinto que sou índio, porque não tenho cara de branco, meu corpo, meu jeito de caminhar e de viver é totalmente diferente. Meu cabelo é liso, não tenho barba, bigode e nem cabelo enrolado no sovaco e na perna. Somos iguais e diferentes. Diferença na língua, jeito e costume. Igual no corpo, na inteligência e no respeito. Somos todos iguais; nativos, negros e brancos". Bolsistas Ao criar vagas em 2007 para estudantes indígenas nos campis de Cuiabá, Rondonópolis e Sinop, a UFMT precisou adotar um programa de acompanhamento acadêmico para derrubar preconceitos na comunidade acadêmica e ajudar os índios a enfrentar dificuldades com a língua portuguesa. Unir civilizações tão diferentes no mundo do conhecimento até agora dito "dos brancos" e tão elitizado como os cursos de Medicina, Agronomia e Direito não tem sido tarefa fácil, nem para os calouros índios ou para os veteranos, muito menos para os professores universitários. UFMT vai ampliar vagas para indígenas /ESPAÇO CUBO
Este ano, o curso de Medicina
recebeu três índios nas salas de aula que em cinco anos serão os primeiros médicos indígenas do Brasil formados pela UFMT, por meio do Programa de Inclusão Indígena (Proindi) em parceria com a Fundação Nacional de Saúde (Funasa) que criou o programa Vigi SUS, para financiar profissionais indígenas nas áreas de saúde. A Funasa financiou mais 30 bolsas de estudo em todo o País, um terço das quais em Mato Grosso, distribuídas nos cursos de Nutrição, Medicina e Enfermagem. Atualmente, três alunos cursam medicina e sete, enfermagem, divididos nos campis de Cuiabá, Rondonópolis e Sinop. Além disso, a UFMT já aprovou universitários indígenas também nos cursos de agronomia (dois), engenharia sanitária ambiental (três) e engenharia florestal (três). Eles iniciam as aulas em 2008 . Pretende-se abrir mais cem vagas para serem formados advogados e administradores índios. Universidade da Selva
O preconceito das elites intelectuais universitárias e as dificuldades dos índios com a língua portuguesa têm sido os principais problemas administrados pela coordenação do Proindi, que possui um programa de acompanhamento acadêmico para orientar os calouros e dialogar com os centros acadêmicos e professores. A professora do Departamento de Antropologia da UFMT, Carmem Lúcia da Silva, conta que o diálogo com as comunidades acadêmicas não tem sido fácil, mas eles vêm superando barreiras. "A Universidade foi criada na década de 70, como universidade da selva, num estado com uma diversidade étnica muito grande. São 40 povos e aproximadamente 32 mil pessoas de culturas diferentes. Foram precisos 36 anos para que se dedicasse espaço a essa diversidade", argumenta. A antropóloga diz que ao abrir vagas para os índios mato-grossenses a UFMT se deparou com a discriminação da sociedade ao pensar que o conhecimento científico é superior ao nativo quando "é a comunidade acadêmica que tem muito mais a ganhar do que os próprios índios". "O que a gente tem visto em sala de aula é que a diferença entre eles e os alunos brancos é apenas cultural e não intelectual", comenta. Mas o primeiro impasse foi convencer os centros acadêmicos a não aplicar o trote nos calouros Xavante. "Tivemos que explicar que os xavantes só cortam o cabelo em rituais importantes do seu povo. Foi muito difícil mas conseguimos e eles foram respeitados. Agora estamos enfrentando o mesmo com os centros acadêmicos das engenharias", contou. Com o passar do tempo, o convívio entre professores, alunos brancos e índios e funcionários da UFMT tem surpreendido a todos. "Eles são vistos não mais do ponto de vista do exótico mas como estudantes, de culturas com a compreensão do que é o mundo, do que é a ter saúde, do que é a doença , do corpo e do que é ser humano. São conceitos diferentes mas não são incompatíveis", diz. As mesmas exigências A coordenadora de Políticas Acadêmicas da UFMT, a nutricionista Myriam Serra explica que os índios entram na UFMT através de um processo seletivo diferenciado organizado pela Coordenação de Exames Vestibulares (Ceve) e passam por provas de conhecimentos gerais e redação iguais aos outros vestibulandos. Os melhores classificados ainda passam por uma prova oral para testar habilidades com a língua portuguesa e a compreensão do candidato com as questões indígenas. "Os cursos não sofreram nenhuma modificação por conta da presença dos povos indígenas em sala de aula. São os mesmos cursos regulares da universidade", diz. No curso de enfermagem as relações foram bem mais fáceis. Andreino Tpiguare Jurapi, estudante xavante é um dos grandes destaques do curso em Cuiabá e apesar das grandes dificuldades com a língua portuguesa, tem se aprofundado nos estudos e recebe ajuda tanto de colegas indígenas como dos outros universitários. Hoje a coordenação de acompanhamento acadêmico tem se voltado para os cursos de Agronomia, Engenharias Sanitária e Florestal que a partir de 2008 recebem os primeiros universitários indígenas. Atualmente os povos Xavante, chiquitano, bakairi e Pareci tem estudantes na UFMT. Pajelança indígena: conhecimento puro e eficaz /ANTONIO DINIZ
Entre a medicina e a pajelança
CUIABÁ – Nem mesmo entre os povos indígenas tem sido fácil encarar a nova realidade de ter índios formados pela academia dos brancos. O bakairi Esvael Cuiva, da Aldeia Pakuera, no município de Paranatinga, é um dos três universitários que cursam Medicina na UFMT. Ele conta que é preciso ter cuidado ao respeitar o pajé e os xamãs, que para os povos indígenas são os médicos. São aqueles que detêm o conhecimento de salvar o corpo das doenças. "A gente precisa conversar muito com eles. Tem doenças que,não sei ainda como, os pajés usam as ervas, rezam e curam. Mas tem casos que não tem jeito e aí o pajé chama a gente para auxiliar. São situações difíceis, mas todos na aldeia querem o melhor para nosso povo", diz. A necessidade de formar índios profissionais de saúde foi apresentada em diversas pesquisas de universidades brasileiras e pela Funasa. Primeiro, porque os médicos e enfermeiros brancos têm grande dificuldade em se manter nas aldeias, daí a rotatividade e interrupção do trabalho de saúde indígena. O segundo problema é a grande incidência de doenças ditas do mundo "civilizado", como diabetes, hipertensão e alcoolismo. "Acabou a caça, a pesca, e agora nosso povo come enlatados, carne de açougue, refrigerantes e tem acesso a bebidas alcoólicas", conta Esvael. O professor de Medicina da UFMT, Elias Nogueira Peres diz que a formação de médicos indígenas vai facilitar a cura destas doenças, a conscientização dos povos a respeito dos malefícios de maus hábitos alimentares e a implementação de projetos de pesquisa na área de saúde em áreas indígenas. "A academia tem oportunidade de unir conhecimentos e com a presença de pesquisadores indígenas fica bem mais fácil desenvolver pesquisas", comentou. Mato Grosso tem 25 mil índios ■ Mato Grosso tem hoje uma população de 25 mil índios, do total de 360 mil existentes no Brasil. ■ São 38 povos, com suas línguas e culturas diferentes, habitantes de cerca de 10% do território mato-grossense: Apiaká, Kayabi, Munduruku, Arara, Xavante, Cinta Larga, Bakairi, Paresi, Kayapó, Enauenê nauê, Mynky, Bororo, Nambikwara, Aweti, Juruna, Kalapalo, Kamayurá, Kuikuro, Matipu, Nahukwá, Mehinaku, Suyá, Tapayuna, Trumái, Txicão, Waurá, Yawalapiti, Rikbaktsa, Irantxe, Panará, Karajá, Surui, Tapirapé, Terena, Umutina, Zoró, Guató e Chiquitanos. ■ A Funasa financia bolsas no valor de R$ 900 para custear moradia e alimentação aos estudantes indígenas. |
Fonte: Agênciaamazônia é parceira do Gentedeopinião
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