Segunda-feira, 7 de agosto de 2017 - 10h28
Os problemas do distrito de Jacy-Paraná estamparam capas de jornais e faziam parte dos noticiários da TV a partir de 2009, quando teve início a construção de uma hidrelétrica na localidade e provocou um grande fluxo de pessoas na região. Os altos índices de venda e consumo de drogas, a prostituição infantil e os crimes precisavam ser freados.
Em 2014 foi dado início as atividades do Colégio Tiradentes da Polícia Militar de Jacy-Paraná, tendo como diretora a tenente Erika Ossuci, que implantou um modelo educacional inédito com disciplina, resgate de valores e incentivo a atividades extracurriculares. Não demorou muito para o colégio se tornar símbolo de orgulho e boa referência para os moradores.
Agricultor há seis anos do reassentamento Morrinhos, Pedro de Jesus Silva tem dois filhos matriculados na escola: Débora, 18 anos, e Natanael, 16 anos, e revelou que chorou quando viu os filhos em marcha pela primeira vez.
‘‘Esse colégio para mim é tudo. Eu criança, muitas vezes, chorei escondido quando via alguém chegar à casa do meu pai e pegava alguma coisa para ler. Eu tinha muita vontade de aprender a ler. Há uns 14 anos eu fui para a sala de aula, cheguei até a 3ª série, mas a caligrafia, não tenho, sei mal assinar meu nome. E essa escola dá estudo para nossas crianças’’.
Pedro garante que percebeu o progresso nos estudos nos filhos em um curto período. ‘‘Natanael ia passando de série sem saber ler nada, mas aqui a tenente Ossuci fez questão de levar todo dia na sala dela e ensinava ele. Ele lia um texto para ela todo dia. Em um espaço de 20 dias Natanael estava em casa lendo tudo’’, disse.
‘‘Eu me sinto orgulhoso deles, sabendo que estão se dedicando, porque eu digo que o futuro deles é o estudo. Não adianta chegar no 2º grau e dizer está bom, parei. Estudo nunca é demais. É um orgulho eles terem essa oportunidade maravilhosa quando eu não tive’’, revela Pedro, que já planeja matricular a filha mais nova também no colégio.
‘‘Era um distrito com carência em todos os sentidos, saúde, educação. A gente foi acompanhando esse crescimento e um grande avanço que a gente teve foi essa escola”. Alda Lopes, assistente social.
Essa mesma confiança de que o colégio tem feito a diferença na vida dos estudantes e da comunidade também é compartilhada por uma das moradoras mais antigas do distrito, a assistente social Alda Lopes, 62 anos, que já mora há 30 anos em Jacy-Paraná.
‘‘Era um distrito com carência em todos os sentidos, saúde, educação. A gente foi acompanhando esse crescimento e um grande avanço que a gente teve foi essa escola. As pessoas perguntam: ‘vocês tem uma escola militar?’. Temos, e temos muito orgulho. A escola traz para esses alunos uma cidadania, eles têm orgulho de fazer parte dessa escola. Se todos os municípios tivessem a graça de ter uma escola como essa, seria um avanço para a educação’’, avalia.
É o que também acredita a agricultora Cleudionice Rodrigues Ferreira, 20 anos, moradora da linha 101-B, a 32 km de Jacy-Paraná. ‘‘Essa escola fez a diferença na vida do meu filho Mateus. Ele ficou mais participativo na escola, chega a casa querendo explicar como as coisas funcionam. Essa escola é um presente’’, afirma.
Rosângela dos Santos Calvo, 43 anos, tem três filhos matriculados no colégio: Leidiane, 18, Laiara, 15 anos, e Luan,13. Ela não esconde a satisfação com o modelo educacional. ‘‘Eu acho muito bom, porque mudou muito a vida não só dos meus filhos, mas de todos aqueles que têm oportunidade de estarem aqui. Em outras escolas o ensinamento é totalmente diferente, o meu filho mesmo quando chegou à escola militar no 6º ano, ele reprovou porque não sabia nem ler’’.
Ela recorda que um dos filhos até pensou em desistir da escola, mas ela não permitiu porque acreditava que lá ele fosse ser transformado. ‘‘Ele queria sair daqui porque dizia que era muito rigoroso, e hoje ele gosta da escola, assim como minhas duas outras filhas. Um dos meus filhos está fazendo o 3º ano e reclama todo dia que terá que deixar a escola. A melhor coisa que aconteceu em Jacy foi essa escola’’, acredita Rosângela.
A vigilante Sueli Biturino Dias, 41 anos, é mãe de Wilson Guilherme, de 19, e Uriel, de 11, e fala dos avanços que o colégio militar proporcionou aos filhos. ‘‘O sonho do Wilson era estudar em uma escola militar, só que a gente morava em Porto Velho e não consegui vaga para ele lá. Quando veio o projeto da escola aqui para Jacy, passei a acompanhar todas as reuniões porque ele ficava cobrando. Meu marido foi o primeiro a chegar no dia da inscrição e ele veio estudar o 2° e 3° ano. Foram só dois anos, mas foi onde ele deu uma alavancada para chegar onde ele chegou hoje’’. Wilson agora está fazendo faculdade.
‘‘Já o Uriel, no começo ele ficou arredio, mas hoje ele já vem com toda garra, toda coragem. Está a cada dia mais interessado nos estudos, nos projetos. Mudou muito. Em casa o comportamento dele é outro, chega e já vai fazer as tarefas, antes tinha que ficar brigando para ele fazer. O que me segura aqui em Jacy é primeiro o meu emprego e segundo a escola’’.
A microempresária Terezinha Ribeiro da Cruz, 47 anos, é mãe dos estudantes Caio Vinícius Cruz de Andrade, 12 anos, e Luiza Cruz de Andrade, 14 anos, e conta com tristeza que terá que levar os filhos para estudar em outra escola. Ela chegou inclusive a fazer uma reunião com outros pais de alunos e pedir que mantenham os filhos nas escolas, pois ela só não fará isso por motivo de saúde.
‘‘Estou triste porque infelizmente meus filhos terão que sair da escola devido um tratamento de saúde que será feito em Porto Velho. É uma ótima escola, esse um ano e meio foram os melhores dos meus filhos. Eles ficavam satisfeitos com tudo aqui. Chegava a casa mostrando a ordem-unida [Formação de marcha], gostam da forma como os policiais os tratam. Agora eles sabem que o policial é um amigo que eles podem buscar na hora que eles precisarem’’.
A presença dos policiais que são monitores no colégio também é outra conquista para o distrito. ‘‘A gente sente mais segura de ter uma escola aqui, com policiais rodando no distrito e nas linhas’’, avalia Terezinha.
O comerciante Romário Machado da Silva conta que antes do colégio entrar em funcionando, sua lanchonete em frente ao local foi roubada, mas a situação não voltou a ocorrer. Ele também tem uma filha matriculada na escola. ‘‘Do acontecimento das barragens para cá, o colégio foi uma das melhores coisas que veio para cá. Tem uma filha que estuda o 6º ano e tem outra que no próximo ano também vai estudar lá’’.
A tenente conta que no começo a população se mostrou um pouco receosa por ser uma escola militar e tinha até um ideia deturpada. De acordo com o sargento Ivanildo Ferraz Lima, monitor do colégio há quase quatro anos, os pais e alunos até sentiam um pouco de medo. ‘‘Teve pais que até perguntaram se os filhos podiam ficar presos se aprontassem no colégio’’, revela.
‘‘Hoje em dia eu falo que há um casamento perfeito entre a escola e a comunidade. A gente se entende muito bem. Eles têm um amor pela escola, não só os que estudam aqui, mas a comunidade como um todo’’, garante a tenente.
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Fonte
Texto: Vanessa Moura
Fotos: Bruno Corsino
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