Domingo, 16 de outubro de 2016 - 10h11
Enviado recentemente ao Congresso Nacional em formato de Medida Provisória (MP), o Novo Ensino Médio é alvo de polêmica. Por um lado, entidades ligadas à educação dizem que o debate da proposta fica prejudicado pela imposição de uma MP e, por outro, o governo afirma que a questão já era debatida desde 2013 no Congresso, sob forma de projeto de lei e que não avançou. A MP vem para dar celeridade à reforma da etapa mais crítica do ensino básico, onde há altas taxas de abandono e baixo desempenho.
No dia do professor, a Agência Brasil conversou com professores contrários e favoráveis ao modelo proposto na MP.
A favor
Cleverson Lino Batista, professor de filosofia, ética e sociologia do ensino médio no Colégio São Pedro do Vaticano e do ensino fundamental na Rede Coleguium, ambas escolas particulares em Belo Horizonte, diz que a MP é positiva ao trazer o ensino técnico ao ensino médio. "É muito importante, principalmente para os mais pobres. É uma oportunidade de inserção no mercado de trabalho". Para ele, outro ponto positivo é a possibilidade do estudante escolher a trajetória de ensino.
"A MP é uma tentativa importante [de melhorar o ensino médio]. Atualmente, ela não dá perspectiva para muita gente que não vai fazer o vestibular. Não tem essa possibilidade de encarar, dentro do ensino médio, a especificidade de cada emprego, de cada mercado de trabalho e profissão. Com o ensino técnico, o estudante pode ter essa oportunidade de lidar com a profissão", defende.
Sobre a possibilidade de sociologia, filosofia, artes e educação física deixarem o currículo obrigatório do ensino médio, o professor diz que não acredita que isso ocorra. Pela MP, os componentes curriculares obrigatórios, além de português e matemática, serão todos definidos na Base Nacional Comum Curricular, atualmente em discussão. "Eu creio que esses conteúdos dificilmente deixarão de compor o ensino médio. Pelo que acompanhei da Base, as disciplinas estarão contempladas", diz.
Contra
Para a professora do Colégio Estadual do Paraná, em Curitiba, Elisane Fank, a proposta poderá levar a uma precarização do ensino, com a ênfase maior em uma formação tecnicista em oposição a uma formação crítica dos estudantes.
No Paraná, professores decidiram entrar em greve e estudantes ocupam mais de 300 escolas - de acordo com Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública no Paraná - em protesto contra a MP e contra a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que restringe os gastos da União (PEC 241), entre outras medidas nacionais e estaduais. Os professores também pedem melhores condições de trabalho.
"Recebemos a MP como uma forma bastante autoritária. Estávamos participando dos debates do projeto de lei da reforma. Não havia consenso sobre a reforma do ensino médio, mas havia debate. Os professores, por meio dos sindicatos e escolas, estavam se posicionando. Esse debate foi totalmente interrompido", diz.
Segundo ela, os professores propunham a reorganização da grade curricular, de forma que as disciplinas não fossem ensinadas em tempos específicos, mas que houvesse maior fluidez dos conteúdos. A professora afirma que a educação integral, da forma como está proposta, compreende apenas a extensão do tempo e aumento da carga de português e matemática visando a melhoria nos índices educacionais. "A formação humana tem que pautar o tempo do aluno e não o índice do Enem [Exame Nacional do Ensino Médio]", defende.
A favor
O professor de filosofia Djalma Silveira, da Escola Estadual José Barbosa Rodrigues, em Campo Grande, defende que o ensino médio necessita de reforma. "Precisa de reforma urgente. Do jeito que está eu tenho 50 minutos de aula com cada turma, quando eu consigo deixar a sala preparada, já perdi 25 minutos. O currículo do ensino médio está sobrecarregado. O professor não tem tempo para fazer o que precisa", diz.
Segundo ele, modelos semelhantes existem em outros países. Ele diz que concorda com a proposta de reforma, mas que é necessário discutir mais.
"Sobre o ensino técnico, é preciso levantar o que o país quer. Temos um Estado que mais atrapalha do que ajuda quando se quer abrir uma empresa, investir, criar renda. O estudante sai do ensino médio com sonho de emprego e no final não tem. Sou a favor do ensino técnico, mas é preciso discutir que país se quer para que a escola acompanhe", defende.
Contra
O professor de filosofia e sociologia, Osmar Antônio Schroh, do Colégio Estadual José de Anchieta, em União da Vitória (PR), é contrário à proposta. Segundo ele, falta estrutura às escolas para que o ensino ganhe mais qualidade. Ele diz que é a favor do ensino médio integral, mas que é preciso infraestrutura. "Sempre fomos a favor de ensino integral, mas a escola precisa estar preparada para isso. Quando se fala em educação - como a da Finlândia - precisamos de investimento, de preparação. Não temos escolas preparadas para isso", argumenta.
Segundo ele, falta estrutura para estudantes e professores. É necessária formação para os profissionais, tecnologias que ajudem a trazer a prática para dentro da escola e o interesse nos estudos. Além disso, o professor diz que faltam condições de trabalho, por exemplo, tempo para que os docentes preparem as aulas e corrijam as provas, o que, de acordo com ele, embora garantido por lei (Lei do Piso), na prática isso acaba sendo feito em casa e nos fins de semana.
"Não podemos pensar o ensino médio como profissionalização para mão de obra barata e nem como algo que prepara só para o vestibular. Tem que ter conotação de preparar o cidadão para que tenha autonomia e possa decidir o que quer", diz.
Novo Ensino Médio
Apresentada pelo presidente Michel Temer no dia 22 de setembro, a MP do Ensino Médio flexibiliza os currículos e amplia progressivamente a jornada escolar. A reformulação da etapa já estava em discussão no Congresso Nacional no Projeto de Lei 6480/2013, e agora volta em formato de MP, com o prazo de 120 dias para ser votada.
A MP prevê a flexibilização do ensino médio. Português e matemática serão os dois únicos componentes curriculares obrigatórios nos três anos do ensino médio. Os demais componentes curriculares que deverão ser ensinados no período obrigatoriamente serão definidos na Base Nacional Comum Curricular, que começou a ser discutida este mês e deverá ser definida até meados do ano que vem, segundo o Ministério da Educação.
De acordo com a MP, cerca de 1,2 mil horas, metade do tempo total do ensino médio, serão destinadas ao conteúdo obrigatório definido pela Base. No restante da formação, os alunos poderão escolher seguir cinco trajetórias: linguagens, matemática, ciências da natureza, ciências humanas - modelo usado também na divisão das provas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) - e formação técnica e profissional. A medida também amplia gradualmente a carga horária do ensino médio para 7h por dia ou 1,4 mil horas por ano.
Em consulta pública no site do Senado Federal, até sexta-feira (14), 3.183 haviam se manifestado a favor e 66.884 contra a MP.
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