Segunda-feira, 11 de setembro de 2023 - 15h57
Egressa da graduação em
História e do mestrado em História e Estudos Culturais da Universidade Federal
de Rondônia (UNIR), a professora historiadora Lauri Miranda Silva se tornou a
primeira mulher trans doutora em História no Brasil. Lauri defendeu sua tese em
agosto, junto ao Programa de Pós-Graduação em História (PPGH) da
Universidade Federal do Rio Grande do
Sul (UFRGS), sob a orientação do professor Benito Bisso Schmidt.
O trabalho intitulado “Vozes
subversivas e corpos transgressores: memórias e narrativas da (re)existência de
militantes dos movimentos LGBTQIA+ e de mulheres contra as opressões
interseccionais em Rondônia (a partir da década de 1980 a 2022)” recebeu conceito
A e recomendação para publicação. A banca de avaliação foi composta pelas
professoras Marta Gouveia de Oliveira Rovai (Unifal), Fabíola Holanda Barbosa
Fernandez (SLMandic), Megg Rayara Gomes de Oliveira (UFPR) e Natalia Pietra
Mendez (UFRGS).
A pesquisa
A tese de Lauri aborda o
histórico dos movimentos LGBTQIA+ e de mulheres em Rondônia, levando em conta
as opressões de classe, raça, gênero e sexualidade contra seus militantes. Ela
investiga também a aliança desses grupos como forma de resistência ao avanço
dos grupos conservadores e reacionários na região.
“Não só ouvi de forma ética
e sensível os testemunhos das/dos militantes, mas também me coloquei como
sujeita viva das opressões do nosso tempo, pois faço parte dessa memória
sociocoletiva construída, enquanto historiadora, sobrevivente e denunciante das
mazelas de um passado que continua reverberando no presente. Porém seguimos
lutando para que não tenhamos nossos direitos violados e nossas histórias
esquecidas”, relata Lauri, enfatizando a contribuição da tese para produções
acadêmicas em torno das relações de gênero e sexualidades.
Lauri aponta que seu
trabalho relaciona diferentes dimensões: "O meu trabalho foi gestado da
vontade de conhecimento, de luta, de resistência e de empoderamento, a partir
de um corpo com marcadores sociais carregados de opressões interseccionais, um
corpo que é transgressor, desobediente e subversivo contra a ordem hegemônica.
Eu sou uma mulher trans afro-amerindígena, ribeirinha, cabocla, beradeira,
periférica, nortista, amazônida, rondoniense, porto-velhense, professora,
oriunda de escola pública e de universidade pública”.
“O trabalho de Lauri é
extremamente inovador na maneira como utiliza entrevistas de militantes
LGBTQIA+ e mulheres cis, além de outras fontes, para construir uma outra
história da Região Norte, marcada por lutas e resistências”, comenta o
orientador Schmidt, destacando a sensibilidade de Lauri para articular, na
análise, diferentes opressões, desvelando tramas pouco visibilizadas na
historiografia nacional.
Formação acadêmica
Na UNIR, Lauri cursou História entre 2007 a 2010, e o
Mestrado em História e Estudos Culturais de 2013 a 2015. Foi durante a
graduação que ela ingressou nos grupos de estudos e pesquisas (Boiúna, Centro
de Hermenêutica do Presente e Centro Interdisciplinar de Estudo do Imaginário
Social) e em projetos de ações afirmativas (Conexões de Saberes) que ajudaram a
trilhar sua trajetória acadêmica e formação para a vida: “foi a partir das
leituras e discussões ocorridas nos grupos de pesquisa, sobre história oral e
minorias na região amazônica, que percebi a necessidade de pesquisar sobre as
questões LGBTQIA+ e mulheridades em Rondônia”.
Mais tarde, buscando dar continuidade na sua formação
enquanto historiadora e na carreira docente, migrou para a região Sul do país
em fevereiro de 2019 para cursar o doutorado em uma cidade e instituição até
então desconhecidas. “Eu fui uma desbravadora em meu estado para que outras
trans pudessem se espelhar para também ingressarem nas universidades. Estou
muito feliz por ter chegado até aqui, mas não foi fácil, pois nós, travestis e
mulheres trans, somos minorias nas universidades públicas. Espero que a minha
tese seja uma contribuição valiosa, e em breve estará disponível para leitoras
e leitores”, afirma.
A recém-doutora atua há mais de dez anos como professora de
História da educação básica e após a obtenção do título serguirá realizando
pesquisas de pós-doutorado e a carreira acadêmica.
Ações
Afirmativas
Lauri conta que viu no PPGH da UFRGS uma oportunidade para
aprofundar seus estudos e conhecimentos. Um dos pontos que a atraiu para o
Programa foi a política de ações afirmativas, que inclui vagas para estudantes
trans. Segundo ela, as cotas são “um meio indispensável para um possível reparo
histórico de nosso seguimento na educação brasileira”, uma vez que um
levantamento da Andifes de 2019 apontou que apenas 0,02% do total de estudantes
das IFES são travestis e trans (autodeclarados).
“Precisamos avançar, pois há ainda resistência por parte da
comunidade acadêmica e de grupos conservadores e LGBTQIfóbicos (dentro e fora
da universidade) na maioria dos estados do Brasil com relação ao sistema de
cotas para negros, pardos, indígenas, quilombolas, pessoas com deficiência e
trans, grupos que historicamente foram excluídas/os do sistema educacional
brasileiro”, enfatiza.
O orientador Benito
Schmidt também reforça a importância das ações afirmativas, tanto para
reparação histórica, como para a incorporação de novas epistemologias ao saber
acadêmico, entre as quais o transfeminismo do qual se vale Lau
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